Onda de greves e manifestações contra as reformas de Macron na França
É a segunda grande mobilização presenciada na França em menos de três semanas. Nessa terça-feira (3), os sindicatos franceses convocaram paralisações de serviços de transporte, coleta de lixo e outros contra as reformas trabalhistas de Macron. Com impacto especialmente no vital setor ferroviário, a série de greves ameaça paralisar boa parte da França para defender os direitos trabalhistas e lutar contra a precarização do trabalho
Publicado 03/04/2018 16:50
Só entre os funcionários da empresa pública de trens SNCF estão programados 36 dias de greve até o final de junho. Também há paralisações previstas nos setores aéreo, energético e de coleta de lixo. Até 28 de junho, a CGT e outros sindicatos pretendem instaurar a seguinte rotação semanal para seus membros: dois dias de greve e três dias de trabalho.
A SCNF – que opera, entre outros, os famosos trens de alta velocidade TGV – está à frente dos protestos. A companhia estatal francesa responsável pelo transporte ferroviário no país tem cerca de 140 mil funcionários e, nesta terça-feira (3), tinha apenas 12% da frota em circulação. De acordo com a empresa, 77% dos condutores não foram ao trabalho e 33,9% dos funcionários aderiram ao movimento.
A greve aparece como desafio aos planos do presidente Emmanuel Macron de "modernizar"- aderindo a um planejamento essencialmente neoliberal, que inclui privatizações e flexibilização do trabalho- a segunda maior economia europeia.
Entre as mudanças na SCNF planejadas por Macron estaria o fim dos contratos vitalícios de trabalho e do aumento salarial automático anual. O presidente pretende tornar lucrativa a SNCF, que ganha 3 bilhões em dívidas ao ano, que os sindicatos apontam ser uma consequência de má administração e gastos excessivos com trens de alta velocidade. Segundo Macron, o plano é que o setor de trens seja aberto à competição estrangeira em 2020, "gradualmente", transformando o SNCF em uma empresa de capitais mistos (publico e privado), o que os sindicatos alertam ser uma abertura do caminho para a privatização.
“Estamos pedindo a mesma coisa que há várias semanas: que o governo reconsidere seu plano. Eles têm que começar novamente do início”, afirmou Philippe Martinez, chefe da centenária Confederação Geral do Trabalho.
Os funcionários do setor da coleta de lixo, por sua vez, pedem pelo direito de aposentadoria dez anos antes- uma vez que atuam em áreas nas quais a saúde do trabalhador está mais propensa a riscos (varrendo ruas ou trabalhando em pátios de reciclagem, por exemplo). Os trabalhadores da indústria de eletricidade e gás protestam contra a liberalização do setor.
Se o jovem presidente, de 40 anos, conseguir passar por cima da greve, terá caminho aberto para seguir com suas outras reformas, como a do setor educacional e previdenciário, parte de seu projeto de governo. Mas greve na ferroviária estatal SNCF pode vir a ser uma forte resistência contra os projetos de Macron e seu primeiro-ministro Edouard Philippe. A paralisação da vida pública na França por mais de suas semanas pode deixar os franceses inquietos e, consequentemente, aumentaria a pressão sobre o governo.
Poucas semanas de intervalo
No dia 22 de março, mais de 400 mil pessoas foram às ruas contra as reformas trabalhistas de Macron, que se traduzem na perda de direitos para quem trabalha e na degradação do serviço público.
Em causa estavam (não que tenham saido de pauta) medidas anti-trabalhistas como o corte de 120 mil postos de trabalho na função pública, a desregulação das leis trabalhistas e a redução do orçamento do setor ferroviário em 60 milhões de euros, apresentadas por Emmanuel Macron com o objetivo de reduzir a dívida e chegar aos 3% de défice impostos pela União Europeia de forma aleatória.
Na menifestação do mês passado, os trabalhadores já denunciavam o desinvestimento em percursos menos lucrativos, contestando igualmente a abertura à exploração privada da linha férrea pública e a retirada de direitos trabalhistas.
Em uma nota remetida no dia 22 de março, a CGTP-IN alertava para o fato dessas medidas, "definidas em sucessivos pacotes ferroviários da União Europeia e que o governo francês procura agora impor" terem "levado a privatização da CP Carga em Portugal, a degradação da prestação do serviço público de transporte ferroviário e ao aumento dos preços, bem como à retirada de direitos dos trabalhadores e dos usuários".