Reforma trabalhista deve agravar extrema pobreza que cresceu 35% em SP

No ano de 2017, a pobreza extrema atingiu 180 mil pessoas que moram na região metropolitana de São Paulo, segundo levantamento da LCA Consultores publicado pelo Valor Econômico. De acordo com especialistas consultados pelo Portal Vermelho, dois fatores são decisivos para esse resultado: o não acompanhamento monetário do Bolsa Família e o aumento do desemprego. Com a reforma trabalhista, a extrema pobreza deve aumentar ainda mais não apenas em São Paulo, mas no Brasil.

Por Verônica Lugarini

pobreza

Políticas sociais afetadas pela Emenda Constitucional 95 – que congela os gastos por 20 anos – reforma trabalhista que incentiva o trabalho informal, o não acompanhamento no valor do benefício do programa Bolsa Família e o pente-fino em programas sociais impulsionam o aumento da pobreza extrema que afeta o maior polo gerador de riqueza do país, a Grande São Paulo.

Segundo dados da LCA Consultores, a extrema pobreza cresceu 35% entre 2016 e 2017 na região metropolitana de São Paulo. Ou seja, 180 mil pessoas começaram a viver uma renda menor do que R$ 133,00 mensais em 2017. Agora, São Paulo tem 700.193 pessoas nessa situação.

Para Paulo Jannuzzi, professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE e ex-Secretário de Avaliação do Ministério de Desenvolvimento Social (MDS), o crescimento do desemprego é uma das explicações para esse aumento incisivo, não apenas em São Paulo, mas também em nível nacional.

“A pobreza extrema no Brasil passou de 5,1 milhões de pessoas para 11,8 milhões em três anos, ou seja, houve aumento de 130% entre 2014 e 2017, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento Social. Isso significa que retrocedemos 12 anos, como se ainda estivéssemos no segundo mandato do [ex-presidente] Lula”, explicou Jannuzzi.

Além disso, ele destacou que o país passou de um piso de pleno emprego, em 6%, para praticamente o dobro em 2017, com 13%. “Esse aumento [do desemprego] colocou um monte de gente em uma condição de renda muito baixa e isso, sem falar nos efeitos da reforma trabalhista que ainda serão sentidos”, disse o professor.

Por outro lado, não houve o acompanhamento no valor do benefício do programa Bolsa Família, havendo até uma redução na sua distribuição. Um dos fatores para essa queda na transferência de renda é a seletividade do governo por meio do pente-fino que vem se intensificando durante o governo Michel Temer.

Conforme Jannuzzi, o pente-fino “é na verdade um eufemismo para um processo de exclusão de pessoas do Bolsa Família. Isso fica claro quando o governo institui um programa que premia os municípios que mais tiram pessoas do programa. Nós não sabemos se de fato as pessoas estão sendo tiradas do Bolsa Família ou se estão conseguindo emprego seguro”.

Jannuzzi destacou inclusive, que o sucesso do Bolsa Família é reconhecido internacionalmente, como pelo Banco Central, por ser bem focalizado. Prova disso foi o alcance de ter apenas 2,5% dos brasileiros extremamente pobres em 2004.

Já Ieda Maria Nobre de Castro, professora do Curso de Serviço Social do Centro Universitário IESB e ex-Secretária Nacional de Assistência Social do MDS, afirmou que a retirada desses dispositivos de transferência é automaticamente sentida no consumo.

“Assim que a família e o indivíduo recebem o dinheiro do auxílio, eles o destinam para os bens de consumo, como compra de produtos básicos [gás e alimentos, por exemplo]. Mas, sem essa renda, não há como suprir as necessidades básicas da família.”

Para ela, o desmonte das áreas como saúde e educação também são fatores decisivos para a piora na situação de vida. “A ausência desses serviços públicos faz com que as pessoas migrem para o mercado e comecem a pagar por eles. Com isso, a composição das despesas da família é alterada porque a renda é destinada para esses novos gastos. Assim, se aumenta a despesa e diminui a reserva [financeira] que iria garantir outras necessidades”, disse a professora.

Sobre o conjunto de políticas sociais, Ieda frisou que “elas oferecem um mecanismo de reequilíbrio, mas não eliminam as desigualdades. Elas trazem as pessoas para um patamar mais civilizatório, onde não haja uma barbárie tão acentuada como a que estamos assistindo hoje com a Emenda Constitucional 95 que não é uma política social, mas uma política de mercado”.

Por isso, Ieda falou sobre a necessidade do fortalecimento das áreas de assistência social, saúde e educação para proteção dos brasileiros e impedimento da procura por serviços privados que reduzem ainda mais a renda dessa parcela da população.

Ela ainda ressaltou que a EC 95 e a Lei das Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2018 impedem novos investimentos nas áreas sociais. Mas, durante esse congelamento, as necessidades da população aumentam sem que se possa ampliar a oferta de serviços além da estrutura já existente, o que contribui para ampliar a pobreza que também pode ser medida pelo acesso aos serviços públicos.

Outro ponto que agrava a extrema pobreza é a reforma trabalhista.

“O Brasil não tem mais políticas de trabalho porque elas estão sendo dissolvidas com a reforma trabalhista. Com isso, não há mais o incentivo para o trabalho formal e a pessoa pode até ter uma fonte de renda, mas será um trabalho desprotegido e instável que não dá segurança para ela.”

Desigualdade racial

Os dados do estudo também apontaram que o número de pessoas pretas e pardas vivendo em situação de pobreza cresceu 61% no ano passado, enquanto o da parcela branca da população foi de 13,6%.

“A desigualdade social no Brasil é étnica, racial e de gênero. Ela não é simplesmente uma desigualdade econômica porque é o modo como o capitalismo se estrutura no país. Então esses dois segmentos até acessam o mercado de trabalho, mas quando isso acontece é de forma precária e, quando o mercado se fecha, ele se fecha principalmente para esse público. Por isso, qualquer aumento de desigualdade social afeta mais diretamente negros e mulheres.”