Com mercado de câmbio desregulado, país é vulnerável a instabilidades

 O dólar comercial fechou mais uma vez em alta, nesta segunda (18), cotado a R$ 3,739 para venda. A tensão comercial entre China e Estados Unidos influenciou o resultado, ao afastar os investidores globais de ativos de maior risco. O problema da vez é, portanto, global, mas o câmbio brasileiro foi mais impactado que outras moedas. Nesta tarde, o real tinha o terceiro pior desempenho diário numa lista de 33 divisas.

Por Joana Rozowykwiat

Economista e professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Guilherme Mello

 Trata-se de mais uma semana que começa com desvalorização do real. A volatilidade do câmbio no país não é novidade, é a regra por aqui, diz o economista Guilherme Mello. Segundo ele, ao observar vários períodos da história, é possível perceber que a moeda brasileira é sempre uma das que mais variam.

Mas o que está por trás disso? “Em parte, o fato de que a gente tem taxas de juros muito altas. Isso atrai muito capital especulativo, que entra aos montes e sai aos montes, de uma vez só. Então você tem um cenário de instabilidade formado por essa entrada e saída do capital especulativo. E tem outra característica, que é o fato de eles poderem entrar e sair livremente. Há muito pouco controle nos capitais que entram e saem”, defende Mello.

Ele aponta que a possibilidade de altos ganhos associada a muita liberdade atrai muitos especuladores. E, quando há qualquer turbulência no mundo, o país sente logo os impactos. “O que acontece é que, se há algum tipo de evento, como aumento dos juros nos Estados Unidos ou crise na Argentina, essa instabilidade rebate muito mais fortemente no Brasil, por causa dessas características no mercado de câmbio no Brasil”, resume.

O Banco Central tem atuado para tentar conter essa volatilidade, ofertando contratos de swaps cambiais, uma operação que equivale à venda de dólares no mercado futuro. Só na semana passada, a autoridade monetária já havia colocado US$ 24,5 bilhões em swaps no mercado. Esta semana, a expectativa é que ofereça um montante equivalente a US$10 bilhões em contratos deste tipo.

Para Mello, contudo, “é como tentar conter um mar revolto”. Além de não conseguirem alterar a tendência de desvalorização do real, as operações com swaps cambiais ainda têm elevado custo fiscal. “É muito difícil [resolver], porque você está usando swaps para conter instabilidade, quando são massas enormes de capital. Você precisa usar muitos swaps”, diz.

Na avaliação do economista, apesar de o Banco Central pregar que não há uma taxa “certa” de câmbio e que este patamar deveria ser determinado pelo mercado, a atuação da autoridade monetária tem dado a entender que o real mais desvalorizado, com o dólar em torno de R$3,80, R$3,90 não é a “taxa certa” da economia.

“Nas últimas semanas, parece que o BC tem, sim, uma taxa na cabeça e que ele vai intervir para alcançá-la. E ele está usando o instrumento que tem para intervir, que são swaps, e pode utilizar as reservas, caso necessário. Mas o que está por trás dessa volatilidade ele não consegue corrigir, que é a regulação do mercado de câmbio, que hoje é muito desregulado”, indica.

O economista sublinha que o governo de Dilma Rousseff fez uma tentativa de regular um pouco o mercado de câmbio, principalmente o mercado de derivativos cambiais, algo que foi bem-sucedido, avalia.

“Durante alguns meses, aquela volatilidade toda acabou, sumiu. E você tinha muito pouco custo para isso. Porque swap tem um custo fiscal. Nada mais é do que uma aposta. E uma aposta que o Banco Central pode perder. Ele aposta que a moeda vai valorizar e ela desvaloriza, então ele perdeu e aí tem que pagar. Quando ele paga, tem um custo fiscal”, detalha.

Segundo ele, a regulação do mercado de câmbio não necessariamente tem custo fiscal, pelo contrário, pode até ajudar a arrecadar. “Quando você usa um IOF [Imposto Sobre Operações Financeiras] sobre algum tipo de operação especulativa, pode até ter algum resultado fiscal positivo e ainda regula o mercado”, afirma.

Guilherme Mello cita então o que há como pano de fundo para as escolhas do BC. “Esse Banco Central é muito comprometido com a ideia de que é o mercado livre que determina a taxa câmbio. Então ele não coloca as regulações, mas usa os swaps. Isso tem um custo fiscal e ainda indica que o BC tem, sim, uma taxa de câmbio na cabeça dele”.

Ele mencionou que a autoridade monetária também está preocupada em evitar a subida dos juros e da inflação, em especial, em ano de eleições. O controle dos preços, afinal, é única “conquista” econômica do governo Michel Temer que ainda está de pé.

“Ele [o BC] não quer retomar um novo ciclo de alta da taxa de juros, é evidente isso. Até por que é ano eleitoral. Mas ele percebe que, se não contiver a desvalorização cambial, vai dar impacto na inflação, porque os produtos importados ficam mais caros. Então tenta conter isso através dos swaps, para não ter que aumentar os juros”, coloca.

Mello ressaltou que não considera incorreto usar swaps cambiais. “A questão é que é um tipo de instrumento que pode e deve ser usado para conter a volatilidade, mas você não consegue conter a tendência”, expressou. Segundo ele, a tendência atual de todas as moedas do mundo é se desvalorizar em relação ao dólar, porque os juros estão subindo nos Estados Unidos.

“E aí não adianta usar swaps contra tendência. Se você quer minimizar essa tendência de desvalorização da moeda brasileira, o ideal seria ter usado e usar os controles de capital, que minimizariam as oscilações súbitas. Mas, por ideologia, esse pessoal atual acha que não pode usar controle de capital, porque é limitar o mercado. Então só sobram swaps. E, para conter assim essas oscilações, tem que ser um volume muito grande e tem custo fiscal enorme e não necessariamente resolve esse problema. Swaps deveriam ser usadas para diminuir volatilidade, não para alcançar um patamar”, encerra.