Publicado 29/06/2018 10:34
Em 2015, ela foi uma das lideranças da resistência contra as remoções de famílias de sua comunidade, próxima do Parque Olímpico, luta que lhe rendeu duas homenagens – as medalhas Pedro Ernesto e Dandara – da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro.
Infelizmente, mesmo com o reconhecimento público pela sua dedicação à comunidade, Mãe Luizinha não conseguiu impedir que a Prefeitura desapropriasse a casa que ela comandava, a Yle Axe Ara Orun Yaba Jiyi.
Mas, agora, ela será relatora sobre a violência cometida contra as religiões afro-brasileiras no estado, em documento a ser entregue à Organização das Nações Unidas (ONU), em julho.
Foi contando sua história, e como ela se entrelaça com o combate ao racismo religioso, que Mãe Luizinha conheceu o ator e militante estadunidense Danny Glover, atual embaixador da ONU para os direitos humanos e questões raciais.
Durante a visita que o ator fez ao Brasil, em maio deste ano, ela entregou uma carta que denunciava a violência sistemática contra as religiões de matriz africana, no Rio de Janeiro. Do encontro, veio a sugestão de criar um relatório sistematizando a denúncia à violência contra as religiões de matiz africana a ser entregue ao órgão internacional.
“E fiz uma solicitação para que a ONU olhasse isso com mais carinho, porque estamos na década do negro e é impossível que a gente continue a sofrer dessa forma, sendo que os governantes do Brasil não se manifestam sobre esses pontos todos”, protesta.
Para falar sobre a preparação da denúncia internacional de Mãe Luizinha, o Brasil de Fato conversou com a sacerdotisa. Confira:
Brasil de Fato – Mãe Luizinha, pode contar sobre como está a situação das religiões de matriz africana no Rio de Janeiro?
Mãe Luizinha de Nanã – Nós temos um problema que é muito grande: temos um prefeito que é evangélico. Vivemos situações terríveis com pessoas que se dizem evangélicas e são do tráfico ao mesmo tempo É um problema profundo e perigoso, mas estamos lutando com todas as nossas forças para retirar esses atos de violência contra nossa religião. Nós, o povo do candomblé e da umbanda estamos fazendo caminhadas ecumênicas chamando atenção da sociedade sobre o que está acontecendo. Nós não precisamos entrar em guerra por causa da religião. No dia 9 de setembro vamos ter a caminhada do pessoal da zona oeste todinha. Esses movimentos sociais são importante para conscientizar o povo que não sabe e faz errado e para que o povo que é da religião se una.
Quando a senhora fala sobre evangélicos aliados ao tráfico, não dá para deixar de lembrar da mãe de santo que foi obrigada por traficantes a destruir seu próprio templo “em nome de Jesus”, em outubro do ano passado.
Temos o caso da Mãe Carmen que ela foi para a Suíça depois de ser expulsa da Casa dela e hoje se encontra traumatizada e não consegue voltar para o país. Então, são muitas ações que nós estamos vivenciando e sofrendo em relação ao racismo religioso. Ele passa a ser racismo porque a exclusão sobre a nossa religião é justamente porque é uma religião de negros. Isso se configura no racismo.
A senhora comentou que vê esse episódio também como uma ação terrorista. Pode explicar?
O terrorismo se configura justamente por isso, ele expõe o que fez com outra pessoa e através dessa exposição ele coloca as outras vidas da comunidade que começam a se sentir ameaçadas e começa um estado de pânico e terror. Tanto é que, hoje em dia, a mesma situação acontece, nós continuamos com pessoas sendo retiradas de suas casas, agredidas, continua acontecendo, mas agora são proibidas de falar.
O seu documento será composto de um dossiê com casos de racismo religioso no Rio de Janeiro, o que a senhora espera conseguir com ele?
Através desse documento, que vai ter um mapa completo sobre o que está acontecendo, ele possa sugerir ao governo Brasileiro junto à ONU que administra conflitos para que se tome alguma providencia aos problemas que estamos passando porque o Brasil é signatário de muitos acordos internacionais que proíbem as ações que estamos sofrendo. Assim, o Brasil seria obrigado a tomar atitudes. Então, é uma chamada para o Brasil se explicar. Por que estamos sofrendo? Por que tem gente saindo do Brasil? Por que não conseguem viver aqui com sua religião? Por que tem gente saindo daqui por conta do racismo? Porque ocorre tudo isso? O Brasil tem que se explicar para a ONU, estamos na década do negro e existem etapas estipuladas pelos tratados para que se diminua esse tipo de comportamento no mundo e as etapas não estão atingindo metas nenhuma. Então, a ONU precisa perguntar porque estamos sofrendo no Brasil desta forma.