Assembléia da ONU: pacto para refugiados, clima e multilateralismo

Desde segunda-feira (24), quando teve início a Assembléia Geral da ONU, refugiados, mudanças climáticas e o multilateralismo foram temas que ganharam destaque

assembléia geral da onu

A Agência da ONU para Refugiados (ACNUR) organizou uma reunião com líderes políticos de quatro continentes na segunda-feira (24), durante a Assembleia, em Nova Iorque, em apoio ao acordo internacional sobre o tema, um modelo robusto e sistemático para melhorar a vida de refugiados e comunidades de acolhimento.

A reunião envolveu Banco Mundial e líderes de Bangladesh, Costa Rica, Turquia, entre outros. A expectativa é de que o Pacto Global seja endossado pelos membros da Assembleia Geral da ONU em dezembro de 2018, após dois anos de intensas consultas lideradas pelo ACNUR com Estados-membros, organizações internacionais, especialistas, sociedade civil e refugiados.

O ano de 2017 registrou números recordes de deslocamento forçado — 68,5 milhões de pessoas em todo o mundo foram forçadas a deixar suas casas, das quais 24,5 milhões se tornaram refugiadas em outros países.

Quase nove de dez dos refugiados do mundo estão em países em desenvolvimento, onde eles geralmente moram em áreas remotas com desafios significativos. O impacto nos serviços locais, na infraestrutura e nos recursos “é colossal”, segundo Filippo Grandi, alto-comissário da ONU para refugiados.

O pacto global prevê medidas específicas que beneficiam ambos os refugiados e as comunidades de acolhimento, como o fortalecimento da infraestrutura educacional e de saúde do país de acolhimento, além de economias em potencial. Além disso, prevê medidas como o reassentamento e outros caminhos para países terceiros para ajudar a aliviar as pressões sobre os países que abrigam os maiores números.

“A falta de ação não é uma opção”, disse a presidente da Assembleia Geral da ONU, Maria Fernanda Espinosa.

Mudanças climáticas

Na terça-feira (25), primeiro dia do debate geral na Assembléia, um dos temas principais foram os catastróficos impactos das mudanças climáticas. O secretário-geral da ONU, António Guterres, alertou em seu discurso inaugural que a velocidade do aquecimento global tem provocado emergências no mundo todo, enquanto líderes dos países enfatizaram suas vulnerabilidades no que se refere a esse tema.

O presidente mexicano, Enrique Pena Nieto, enfatizou a importância de implementar o Acordo de Paris para o clima, que busca evitar os efeitos mais catastróficos das mudanças climáticas ao manter o aquecimento global abaixo dos 2 graus Celsius e acima dos níveis industriais no fim do século passado.

Muitos líderes contaram os problemas e conquistas de seus países. Mas eles também enfatizaram o papel dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que buscam eliminar uma série de problemas sociais de maneira ambientalmente sustentável até 2030, e da ONU em obter as parcerias globais necessárias para combater as mudanças climáticas e resolver uma série de outros problemas, incluindo a atual crise migratória global.

Multilateralismo

Uma nota dissonante veio do presidente norte-americano, Donald Trump, que rejeitou a ideologia do globalismo, se opôs ao Pacto Global para as Migrações, que deve ser adotado no Marrocos em dezembro, e reclamou que os parceiros comerciais dos Estados Unidos têm tirado vantagem do país, explicando sua política de imposição de tarifas de importação bilionárias.

Em oposição a esses argumentos manifestou-se o presidente suíço, Alain Berset, que lamentou a “tendência do momento” de buscar respostas problemas como globalização, desigualdade, conflito, extremismo, migração e mudanças climáticas “com isolamento nacionalista e em com uma crescente desconfiança em relação à cooperação entre os Estados”.

“Estamos testemunhamos uma real crise no multilateralismo — de forma paradoxal, no momento em que estamos tentando criar os principais pilares da governança global do futuro”, disse. “As Nações Unidas são indispensáveis e idealmente criadas para abordar desafios contemporâneos, especialmente a luta contra as desigualdades”.

Ele também criticou “políticas que recaem sobre o protecionismo comercial e os interesses egoístas” que minam o comércio e a prosperidade, e reiterou o apoio de seu país ao Tribunal Penal Internacional e “o esforço internacional de cooperação único em favor das vítimas dos crimes mais graves”.

O presidente brasileiro, Michel Temer, também criticou o protecionismo. “O protecionismo pode soar sedutor, mas é por meio da abertura e da integração que harmonia, crescimento e progresso podem ser atingidos”, disse. Ele também enfatizou a importância de adotar o Pacto Global para as Migrações.

O presidente finlandês, Sauli Niinistö, também elogiou o multilateralismo. “Infelizmente, há agora razão para se preocupar para todos nós que acreditamos nos benefícios do multilateralismo”, disse. “O sistema internacional que construímos juntos está visivelmente sob pressão. Sua capacidade e credibilidade está sendo questionada. Não podemos mais ter a ordem baseada em regras como garantida. É nossa responsabilidade comum defender ativamente e desenvolvê-la”.

Ele chamou a ONU de “o centro” do sistema multilateral. “Portanto, a defesa do multilateralismo precisa começar aqui”, disse. “A ONU e seus membros precisam demonstrar vontade de agir juntos, não independentemente dos outros”.

O presidente sul-africano, Cyril Ramaphosa, também defendeu enfaticamente o multilateralismo. “Precisamos resistir a quaisquer e todos os esforços para minar a abordagem multilateral para o comércio internacional, que é essencial para a promoção da estabilidade e da previsibilidade na economia global”, declarou.

Muitos palestrantes declararam seu apoio ao Pacto Global para as Migrações. “Estamos ansiosos com sua adoção no Marrocos ainda este ano”, disse o presidente da Nigéria, Muhammadu Buhari, lembrando que a migração irregular não é apenas a consequência dos conflitos, mas efeito das mudanças climáticas e da falta de oportunidades nos países de origem, chamando as mudanças climáticas como “um dos maiores desafios de nosso tempo”.

Enquanto enfatizou a importância do multilateralismo, o presidente de Ruanda, Paul Kagame, enfatizou a necessidade de “multilateralismo real, que muitas vezes está em falta”.

“O atual sistema de governança global baseado em duas vias é insustentável”, disse. “Alguns podem definir as normas sob as quais outros serão julgados. Mas os padrões que não se aplicam a todos igualmente não são universais. Enfrentar esse desequilíbrio na fundação de nosso sistema é o que nos dá forma para a retomada da cooperação multilateral, e renovar a legitimidade das instituições internacionais, que são tão cruciais para o futuro do planeta”.