João Enganador mudou de endereço, mas continua o mesmo

O recém-empossado governador do estado de São Paulo, João Doria, o Enganador, começou o governo já mostrando a que veio: fazer o contrário do que prometeu e solapar os direitos do povo.

Por Mariana Venturini*

João Dòria

Mas por que “Enganador”? Vejamos: Doria se especializou em fazer promessas de campanha que ele simplesmente não cumpriu. É o caso das Delegacias de Defesa da Mulher funcionando 24h. Ao longo da campanha para o cargo de chefe do estado mais rico da nação, Doria ressaltou que a ampliação das delegacias da mulher em São Paulo era uma das prioridades e prometeu colocar 40 delegacias da mulher funcionando 24 horas por dia (o que já é uma meta tímida se comparada à demanda do estado).

Agora empossado, ele afirma que o projeto de lei gera “obrigações para a Secretaria de Segurança Pública” (!). O projeto, em que pese tenha sido aprovado por unanimidade pelos deputados estaduais da Alesp, foi vetado por Doria. Mesmo sendo promessa de campanha, Dória vetou sem nenhuma cerimônia! Depois, arrependido com a repercussão, liberou o funcionamento de três delegacias. Três! No maior e mais rico estado da Federação, que tem 645 municípios e 40 milhões de habitantes.

O descaso e a irresponsabilidade são imensos: é como se disso não dependesse a integridade física, psicológica e mesmo a vida de milhares de mulheres do estado, hoje em situação de violência e sem ter a quem recorrer. Enquanto isso, o número de mulheres assassinadas em situação de feminicídio* cresceu 12% só no ano passado. Foram 529 vítimas de assassinato do sexo feminino no ano passado, contra 474 em 2016. Maioria tinha entre 15 e 29 anos. (1)

O funcionamento das delegacias defesa da mulher 24h por dia é uma demanda antiga das mulheres paulistas. Atualmente, apenas a 1ª DDM, a da Sé, funciona direto, sem parar. Em todas as demais localidades, as DDM só abrem de segunda a sexta, das 9h às 17h. Às noites/madrugadas e finais de semana, que é precisamente quando o maior número de agressões acontece, por ser quando os cônjuges estão juntos, quando há maior consumo de álcool, etc, as mulheres estão completamente desguarnecidas. São obrigadas ou a chamar a polícia comum, geralmente despreparada para lidar com violência doméstica, ou a mulher vítima da violência, entre a ocorrência da agressão e esperar até a delegacia abrir, acaba desistindo da denúncia.

Em que pese a Secretaria de Segurança Pública afirmar que todos os policiais civis recebem treinamento sobre violência doméstica e noções a respeito da Lei Maria da Penha, a realidade mostra que não raros os agentes são completamente despreparados para lidar com situações desta natureza, responsabilizando a própria vítima pela situação de violência, deixando vítima e agressor juntos, e cometendo toda a sorte de erros de protocolo para um tema tão delicado que, inclusive, não raramente, envolve filhos menores de idade.

Ou seja, o Estado não pode se omitir e, pelo demonstrado por João Enganador até agora, a vida das mulheres não cabe em seu governo mínimo. Também é preocupante a omissão do Conselho Estadual da Condição Feminina, cuja função precípua é cobrar o governo do estado pela execução de políticas para as mulheres.

Então, a nós, o João não engana. Ele pode continuar mentiroso, mas as mulheres paulistas continuarão a exigir o que nos é de direito e vamos denunciar cada vez que nossas demandas forem tratadas com descaso.

Depois de uma curta, porém desastrosa, gestão à frente da Prefeitura de São Paulo — com direito à espancamento de professores —, Dória fez o que passou meses negando que faria: abandonou seu cargo para concorrer a outro. Em apenas alguns dias como governador, já traiu uma de suas principais promessas de campanha, mostrando o que nos espera no Palácio dos Bandeirantes: João Enganador só mudou de endereço.

*Mas o que é feminicídio?

O assassinato de mulheres em contextos marcados pela desigualdade entre os sexos recebeu uma designação própria: feminicídio. No Brasil, é também um crime hediondo. Essa forma de assassinato não constitui um evento isolado e nem repentino ou inesperado; ao contrário, faz parte de um processo contínuo de violências, cujas raízes machistas caracterizam o uso de violência extrema. Inclui uma vasta gama de abusos, desde verbais, físicos e sexuais, como o estupro, e diversas formas de mutilação e de barbárie, culminando com a própria extinção da vida da mulher, historicamente vista como objeto e propriedade do homem.

(1) Dados da Secretaria de Segurança Pública de SP, tabulados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2018