Conselho Mundial da Paz participa da reunião dos “Não Alinhados”

A 18ª Cúpula dos Chefes de Estado e Governo dos Países do Movimento de Não-Alinhados, realizou-se em Baku, Azerbaijão, nos dias 25 e 26, marcando a transferência da Presidência do movimento da Venezuela ao Azerbaijão. O Conselho Mundial da Paz (CMP) participou com uma delegação liderada pela presidenta Socorro Gomes e composta ainda pelo coordenador da Região Oriente Médio e presidente da organização-membro palestina, Akel Taqaz, e pelo presidente da organização-membro indiana, Palab Sengupta.

Socorro Gomes

O MNA foi fundado na década de 1960, no contexto do fracasso do regime de dominação e exploração que o colonialismo representava, em que os povos de diversos países conquistaram sua liberdade e suas nações juntaram-se ao sistema internacional. Porém, passos iniciais já haviam sido dados nos anos 1950, com a Conferência Afro-Asiática em Bandung, Indonésia, onde se estabeleceram aqueles que ficaram conhecidos os Princípios de Bandung, que fundamentariam os esforços de unidade das nações que se libertavam do colonialismo e resistiam ao imperialismo e ao neocolonialismo. São eles:

– Respeito pelos direitos humanos fundamentais e os objetivos e princípios da Carta das Nações Unidas;

– Respeito pela soberania e a integridade territorial de todas as nações;

– Reconhecimento da igualdade entre todas as raças e da igualdade entre todas as nações, grandes ou pequenas;

– Não-intervenção ou não-interferência nos assuntos internos de outro país;

– Respeito pelo direito de toda nação a defender a si mesma, individual ou coletivamente, em conformidade com a Carta das Nações Unidas;

– Não uso dos pactos de defesa coletiva para beneficiar interesses específicos de qualquer das grandes potências;

– Não cometer atos ou ameaça de agressão e usar da força contra a integridade territorial ou independência política de qualquer país. Não-uso pressões por qualquer país contra outros países;

– Resolução de todas as disputas internacionais por meios pacíficos, como a negociação, a conciliação, a mediação ou o acordo judicial, assim como outros meios pacíficos da escolha própria das partes, em conformidade com a Carta das Nações Unidas;

– Promoção do interesse mútuo e da cooperação;

– Respeito pela justiça e as obrigações internacionais.

O movimento atraiu assim dezenas de países, organizações intergovernamentais, movimentos de libertação nacional e entidades anti-imperialistas e de luta pela paz, como o Conselho Mundial da Paz, uma das organizações com status de observador.

A Cúpula em Baku foi precedida por reuniões ministeriais e preparatórias, onde o delegado do CMP Pallab Sengupta teve a chance de fazer uma saudação, e uma Cúpula da Juventude do MNA. No evento de alto nível, a presidenta  Socorro Gomes, do CMP – organização observadora – também pôde participar, com o discurso que pode ser lido a seguir, na íntegra.

Excelentíssimo Sr. Presidente da República do Azerbaijão;
Excelentíssimo Sr. António Guterrez, Secretário-Geral da Organização das Nações Unidas;
Excelentíssimos senhoras e senhores chefes de Estado e de Governo
Excelentíssimos ministros, chanceleres e demais autoridades;
Companheiras e companheiros representantes de organizações políticas e sociais;
Senhoras e senhores,

É uma elevada honra para o Conselho Mundial da Paz participar desta 18ª Conferência de Cúpula do Movimento dos Países Não Alinhados.

Agradecemos o convite como uma expressão do desejo dos integrantes deste importante Movimento de compartilhar opiniões e sentimentos e realizar ações comuns com organizações representativas das lutas dos povos pela paz mundial e empenhadas na solidariedade com todos os que enfrentam ameaças e agressões.

Saudamos os esforços dos 120 Estados Nacionais membros do Movimento dos Países Não Alinhados, a mais numerosa organização de Estados Independentes do mundo, que desde suas origens se soma ao empenho pela realização das aspirações dos povos vítimas da opressão e espoliação geradas pelo colonialismo e o neocolonialismo.

Esses esforços vêm sendo feitos desde a histórica Conferência de Bandung, em 1955, cujos princípios seguem vigentes nos dias atuais, e a de Belgrado, que em 1961 criou o Movimento dos Países Não Alinhados.

Visando à construção de um mundo mais justo e equilibrado, o Movimento dos Países Não Alinhados se distinguiu no concerto internacional por sua luta pela promoção da cooperação econômica, o entendimento político entre as nações e a paz, opondo-se ao colonialismo e ao neocolonialismo.

Aqueles dois momentos – Bandung, 1955, e Belgrado, 1961 – em que se firmaram os compromissos originais dos Não Alinhados com a luta por uma nova ordem econômica e política mundial, foram marcantes no longo e penoso combate pela libertação nacional dos povos em face da dominação de grandes potências desde o pós-Segunda Guerra Mundial.

Os princípios então consagrados e os esforços por sua realização durante toda a trajetória do Movimento dos Não Alinhados ao longo destas décadas transcorridas mostram quanto é importante que esses países marchem unidos para superar o atraso, o subdesenvolvimento e enfrentar as ameaças provenientes de potências que baseiam sua força econômica e política na espoliação dos demais.

Entre esses princípios destacam-se o respeito aos direitos fundamentais dos povos; a defesa da soberania e integridade territorial de todas as nações; o reconhecimento da igualdade de todas as nações, grandes e pequenas; a não-intervenção e não-ingerência nos assuntos internos de outro país; o respeito ao direito de cada nação defender-se; a recusa a servir aos interesses particulares das superpotências; a abstenção e rejeição a todo ato ou ameaça de agressão ou o emprego da força contra a integridade territorial ou a independência política de outro país; a solução de todos os conflitos internacionais por meios pacíficos; o estímulo à cooperação; o respeito pela justiça e às normas de convivência internacional.

A rigor, são também estes os princípios da Carta das Nações Unidas e do Direito Internacional. São também os princípios pelos quais se guiam em suas políticas externas pacifistas, multilaterais e de defesa do Direito Internacional os países que na América Latina, Ásia e África defendem modelos econômicos e sociais de caráter progressista, batem-se pela justiça social, combatem a opressão e exploração e por isso mesmo são alvo de ameaças e agressões por parte daqueles que se julgam donos do mundo.

O Conselho Mundial da Paz compartilha com outras organizações sociais a defesa do princípio de que todo Estado Nacional tem o inalienável direito a escolher seu sistema político, econômico, social e cultural. Esta é uma condição básica para assegurar a convivência entre as nações e a paz mundial.

A defesa dos princípios com os quais foi fundado é a principal razão por que o Movimento dos Países Não Alinhados desempenha um papel tão relevante no concerto mundial pela preservação da paz.

Observamos com grande alegria que neste âmbito não são poucos os países do Movimento Não Alinhado que se opõem à exclusão social, à não ingerência nos assuntos internos dos Estados nacionais, e lutam pelo desarmamento e contra toda forma de domínio imperialista.

Expressamos nossos votos de que esta conferência dê continuidade às resoluções de outras cúpulas do Movimento Não Alinhado. Temos presentes os apelos à autodeterminação nacional e à paz formulados na 14ª Conferência, em Havana, em 2006, a mensagem da cúpula de Teerã, em 2012, de paz, segurança, desenvolvimento, justiça, igualdade e por estabelecer um mundo sem espaço para o domínio da força, intimidação, ameaças e violações da lei e os 11 pontos adotados na última Conferência, realizada em 2016 na Ilha Margarida, Venezuela.

O Conselho Mundial da Paz testemunhou a convergência criada entre os participantes da última Conferência em torno da decisão de acelerar os processos de mudança no seio da Organização das Nações Unidas (ONU), ampliando os sistemas de direção para os povos da América e do próprio Movimento dos Não Alinhados; o apoio às novas alianças, como o grupo dos Brics, que congrega Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul; os esforços para cumprir os planos da Agenda 2030 da ONU, que tem entre seus eixos centrais a paz e a erradicação da pobreza como fatores inerentes ao desenvolvimento social.

O documento daquela Conferência enfatiza ainda a tarefa fundamental de retomar a agenda de democratização da comunicação global por parte dos países do Movimento, assim como a comunhão de esforços pela paz e a resolução de conflitos por meios políticos e diplomáticos, o combate ao terrorismo, a luta contra a estratégia de guerra não convencional e as chamadas operações para a mudança de regime, que evidenciam ações intervencionistas com propósitos colonialistas.

No quadro de um processo de globalização sob o domínio das grandes potências econômicas e financeiras, em que é patente uma violenta ofensiva contra os trabalhadores e os povos, é mais necessária do que nunca a solidariedade, a cooperação e a busca conjunta do desenvolvimento nacional com justiça social e a plena realização dos direitos humanos.

A Ordem Econômica Internacional, dominada pelas transnacionais e o capital financeiro, favorece apenas os países já ricos. Os países mais débeis não acessam o desenvolvimento, os que já tinham alcançado alguma base de autonomia econômica se desindustrializam, caem na armadilha do rentismo e retrocedem. Cresce o abismo que separa países ricos e pobres. Para a grande maioria da população mundial deteriora-se o padrão de vida, apesar do impetuoso desenvolvimento tecnológico, que permanece monopólio dos ricos.

O desemprego e a pobreza atingem três bilhões de pessoas e contam-se por centenas de milhões os que não têm acesso ao grau primário de educação.

O Movimento dos Nao Alinhados tem, assim, no horizonte, para além da luta pela paz mundial e pelo equilíbrio do mundo, o desafio do desenvolvimento e do combate às chagas sociais, o que só pode ser alcançado por meio da cooperação e do compartilhamento das conquistas nos campos econômico, educacional, cultural e tecnológico.

Nossa Organização tem entre os seus fundamentos o combate ao colonialismo, ao imperialismo, à intervenção, ao militarismo e às guerras. Somos favoráveis a uma intensa cooperação internacional visando à paz e ao desenvolvimento, o que nos conduz a apoiar os esforços de cooperação entre os países não alinhados.

Malgrado o amadurecimento e o reforço das convicções de numerosos países e forças políticas em torno da vigência dos princípios do Movimento dos Não Alinhados, a realidade do mundo revela que são cada vez maiores os perigos para a paz mundial, os direitos dos povos e a soberania nacional.

A vida política internacional é pontilhada de incontáveis acontecimentos que falam não de paz, convivência pacífica, solução política dos conflitos. Mas de “mudança de regime”, guerras de agressão, golpes de Estado, violações do direito internacional, sanções econômicas, comerciais e financeiras, ameaças nucleares, disseminação de bases militares, o recurso permanente ao uso da agressão e da força. Em cada região do mundo desenvolvem-se conflitos de variada natureza, todos vinculados à dominação colonial e neolonial e à opressão social.

Uma das regiões mais conflagradas do mundo é o Oriente Médio, onde potências estrangeiras intensificam seus planos de dominação relacionados com o controle de fontes energéticas, de rotas comerciais e bases militares estratégicas, mesmo quando hipocritamente e segundo os interesses eleitorais de governantes de turno, proclamem distanciamento.

É nesse quadro que há mais de oito anos, a Síria é martirizada por uma guerra provocada pelo intervencionismo dos Estados Unidos e de países da União Europeia e da própria região, que financiaram e instrumentalizaram o terorrismo. Depois de alcançar importantes vitórias nos terrenos militar e diplomático, a Síria volta a ser agredida.

O Conselho Mundial da Paz condena a agressão perpetrada pela Turquia contra a Síria. Tal como outras ações militares agressivas realizadas ao longo destes oito anos, esta também visa a destruir a integridade do país árabe, com a ocupação de parte do seu território, sob o pretexto de criar uma área de segurança, numa clara violação do Direito Internacional.

Nesta ocasião, reafirmamos a solidariedade do Conselho Mundial da Paz com o povo sírio e os demais povos do Oriente Médio, vítimas de guerras, ocupações e sanções.

Auguramos que o povo palestino conquiste sua libertação, por meio do seu Estado nacional, pondo fim à ocupação israelense.

Expressamos nossa solidariedade com os povos africanos que se encontram no alvo das ações de rapina e neocolonialismo das potências capitalistas. E nos somamos à luta do povo saarauí pelo fim do colonialismo.

A América Latina também se encontra no alvo das políticas intervencionistas da superpotência norte-americana. Cuba, Venezuela e Nicarágua são vítimas de tentativas de ingerência e desestabilização, bloqueios e sanções. Nessa região são intensas as manobras e medidas das operações de mudança de regime, instalação de bases militares e golpes de Estado que resultam na imposição de regimes reacionários e de extrema-direita.

Os povos, contudo, resistem, como demonstram as rebeliões populares no Equador, Chile, Haiti, Porto Rico e o crescimento eleitoral de coalizões progressistas como na Bolívia, Argentina e Uruguai.

E, de maneira exemplar, apesar de todos os retrocessos institucionais, a América Latina e o Caribe constituem uma Zona de Paz, por decisão da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos.

Senhoras e senhores,

Neste mundo conturbado e repleto de conflitos, o Movimento dos Países Não Alinhados desempenha um papel fundamental na luta pela paz, o desenvolvimento e a emancipação nacional. O Conselho Mundial da Paz associa-se a este Movimento na busca desses objetivos.

Muito obrigada,
Socorro Gomes,
Presidenta do Conselho Mundial da Paz
Baku, Azerbaijão, 26 de outubro de 2019