Tribunal ignora argumentos da defesa e aumenta pena de Lula

Desembargadores desconsideraram STF e defenderam juíza de primeira instância que fez "recorta e cola", cuja sentença foi "alentada", segundo relator. Ex-presidente queria anulação ou absolvição. Em outro caso, magistrados anularam sentença da mesma juíza

Zanin e Gebran - Fotomontagem: RBA

A 8ª Turma do Tribunal Regional Federal (TRF4), em Porto Alegre, não só manteve nesta quarta-feira (27) a condenação de primeira instância ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva referente ao processo do sítio em Atibaia, no interior paulista, por lavagem de dinheiro e corrupção passiva, como aumentou a sentença: de 12 anos e 11 meses para 17 anos, um mês e 10 dias. A decisão foi unânime. O posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a ordem das alegações finais foi desconsiderado, assim como a cópia de trechos da sentença feita pela juíza de primeira instância. Em outro julgamento, a 8ª Turma chegou a anular uma sentença.

No julgamento de hoje, o colegiado manteve ainda a condenação do empresário Marcelo Odebrecht (corrupção passiva) e absolveu o pecuarista José Carlos Bumlai e o advogado Roberto Teixeira, acusados de lavagem de dinheiro. Pelo mesmo crime, o proprietário do sítio, Fernando Bittar, teve a condenação mantida, assim como o presidente do Conselho de Administração da construtora, Emílio Odebrecht.

Desta vez, diferentemente do que aconteceu em julgamento recente, os desembargadores relevaram o “recorta e cola” praticado pela então juíza substituta da 13ª Vara Federal de Curitiba, Gabriela Hardt. Em longo voto – mais de três horas –, o relator do processo, desembargador João Pedro Gebran Neto, não só negou a anulação, como elogiou a sentença da juíza, chamando-a de “alentada” – ela copiou trechos inteiros de outra sentença. E ainda considerou que Gabriela fez um trabalho “minucioso” no exame das provas.

Além disso, o relator não viu suspeição do então juiz Sergio Moro. Na conclusão de sua leitura, ele não só manteve a condenação, como propôs ampliar a sentença. Para Gebran, “pouco importa a questão da propriedade do sítio de Atibaia”, já que, segundo ele, Lula usava o imóvel e solicitava melhorias.

Anulação em outro julgamento

Neste mesmo mês, a mesma 8ª Turma do TRF4 havia anulado uma sentença de Gabriela Hardt, em um processo fora do âmbito da Operação Lava Jato. O entendimento foi o de que reproduzir argumentos de terceiro como se fossem próprios, sem indicação da fonte, não é admissível. Em reclamação ao tribunal, o advogado Cristiano Zanin Martins argumentou que a juíza apenas formalizou uma condenação previamente estabelecida.

Uma anulação poderia fazer o processo voltar à primeira instância, já que em decisão recente o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que réus não delatores devem apresentar as alegações finais por último. Para Gebran, que segundo revelações da Lava Jato teve “encontros fortuitos” com o procurador Deltan Dallagnol, a decisão do STF não deve ser aplicada retroativamente.

Em 6 de fevereiro, Lula foi condenado pela 13ª Vara da Justiça Federal do Paraná a 12 anos e 11 meses de prisão por corrupção passiva, corrupção ativa e lavagem de dinheiro. A sentença foi aplicada pela juíza Gabriela Hardt, que copiou trechos de outra sentença, do então juiz Sergio Moro, referente ao caso do tríplex de Guarujá, no litoral paulista.

A defesa do ex-presidente pediu anulação da sentença ou absolvição de Lula, alegando inexistência de provas contra o ex-presidente e falta de parcialidade de Moro no processo. Já o Ministério Público Federal (MPF) pediu aumento da pena. Gebran Neto afirmou que “inexiste vício processual na tramitação” que justificasse a anulação da sentença.

Defesa da Lava Jato

Além do relator, o colegiado tem os desembargadores Thompson Flores (presidente) e Leandro Paulsen (revisor). O julgamento, na sede do TRF4, em Porto Alegre, ocorreu sob forte aparato policial na área externa. Além de Lula, a apelação inclui o presidente do Conselho de Administração da Odebrecht, Emílio Alves Odebrecht, o ex-presidente da OAS José Aldemário Filho, o pecuarista José Carlos Bumlai e o advogado Roberto Teixeira, entre outros.

Perto das 16h, quando terminou o voto do relator, foi a vez de Paulsen iniciar sua fala, defendendo a Lava Jato, considerando injustas as “críticas generalizadas” feitas à operação. Referindo-se a Lula, disse que ele é um ser humano “e se faz necessário que nós possamos ter o controle do exercício do poder por quaisquer pessoas que sejam”. Ele também entendeu que a condenação do ex-presidente não deve ser anulada com base em entendimento do Supremo sobre a ordem das alegações finais, argumentando que isso não interferiu na sentença de primeira instância. Seu voto foi uma sucessão de citações: da peça Carmina Burana a canção de Ana Carolina.

Ao concluir seu voto, o revisor acompanhou “integralmente” o relator.

Por fim, o presidente da turma, Thompson Flores, engrossou a apologia à Lava Jato. Por meio de operação, afirmou no início de seu voto, já depois das 17h, “tomamos conhecimento de fatos ilícitos que horrorizaram o Brasil”. Ele também acompanhou o relator, dando a sessão por encerrada às 17h45.