Pautar o debate, desafio para o campo democrático em 2020

É hora de fazer reverberar aquilo que não interessa ao núcleo do governo

(Foto: Reprodução de live de Bolsonaro/Redes Sociais)

Retomar o trabalho de base. Dialogar para além da bolha. Construir uma ampla frente de esquerda. Alianças para as eleições municipais. Vai longe a lista de desafios para o campo progressista em 2020. Vou me debruçar sobre um, neste momento, lançando para a reflexão. Porque esse, o qual tratarei na sequência, transita pelos demais desafios citados.

Voltar a pautar o debate público, talvez esteja aí o maior desafio para o campo democrático, progressista, à esquerda, para 2020. Desde o pré-golpe em 2015, passando pelo golpe em 2016, e sobretudo depois da vitória do inominável à presidência da República, estamos a discutir, prioritariamente, e com mais intensidade, aquilo que o grupo conservador – minoritário, mas poderoso econômica, política e belicamente – escolhe para que discutamos.

O primeiro ano do governo de Bolsonaro, Guedes e Cia. foi espetacularmente exitoso. Sim, para aquilo a que essa gente se propõe, foi um ano fantástico. Conseguiram empurrar o que parecia impossível: uma reforma da Previdência cruel, impopular. Conseguiram enfiar goela abaixo o que parecia surreal, a retirada de direitos trabalhistas básicos. Seguem engendrando a entrega do que nos restou de patrimônio e riquezas. E agora, no finalzinho, de goleada aprovaram a privatização da água e do esgoto.

Exceto durante um e outro momento, por conta de um e outro episódio, todos esses retrocessos foram impostos sem que esses temas estivessem no centro do debate. Passaram à margem, à periferia dos foros de discussão. No foco, prevaleceram os factoides, os absurdos, as aberrações pronunciadas calculadamente pelo lado de lá.

O campo progressista se esmerou, teve as forças consumidas para rebater as atrocidades lançadas pelo núcleo do poder, e faltou fôlego, braços, pernas, para dar contar de colocar em pauta aquilo que, ao atual governo, não interessava um debate mais aprofundado, uma mobilização mais intensa e plural.

Tiveram mais eco, inclusive entre nós do campo progressista, palavras e assuntos meticulosamente escolhidos pela núcleo do governo para puxarem discussões. Do “golden shower” lá do Carnaval, no início do ano, à ofensa do “pirralha” agora em dezembro, passando pelo balburdia, entre outros incontáveis xingamentos e asneiras, foi sobre tudo isso, dito pelo lado de lá, que nos ativemos a reverberar por aqui.

Não se trata, de modo algum, de diminuir a gravidade do que o núcleo do poder trouxe à tona. Trata-se de questionar, refletir, se não estamos caindo direitinho nas armadilhas do grupo de lá. Discutimos sobre o que nos interessa a todos, mas só no momento em que eles querem, em que eles pautam. O que nos interessa a todos, mas não é pautado pelo lado de lá, deixamos passar – porque estamos focados no que nos pautaram.

Como escapar? A resposta não tenho. Tenho a dizer que não é impossível. E tenho a lembrar que tivemos momentos, nessa luta, em que conseguimos por um tema na mesa. Foi assim durante um período da Vaza Jato. Foi assim com o episódio do depoimento do porteiro do Vivendas da Barra. Foi assim com o caso Queiroz. A libertação de Lula, outro exemplo de quando a pauta foi conduzida por nós.

Está na hora de colocarmos sob holofotes, contra a parede, os projetos com os quais concreta e objetivamente estão sendo destruídas as políticas públicas, aumentando a miséria, acentuando as desigualdades, enchendo os bolsos dos rentistas, garantindo os ganhos de um minoria às custas do sangue da maioria. Assumir a dianteira do debate é imprescindível não para o fortalecimento do grupo progressista – é indispensável à sobrevivência da nação.

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