Brasília, 60 anos: a identidade linguística de uma cidade jovem

Os monumentos, os caminhos, o centro político, um cenário privilegiado. Assim é conhecida a capital do país que chega aos 60 anos no próximo dia 21 de abril, sem poder fazer a esperada festa com a idade nova.

Também neste período de isolamento social, por causa da pandemia do coronavírus, a população demonstra que Brasília já pode ser identificada como um lugar que se tornou maduro.

O Distrito Federal tem hoje uma população de mais de 3 milhões de pessoas. A maioria já é formada por nascidos na capital. Com gírias, sotaques, gastronomia e identidade de caldeirão cultural, que se revelam por entre as quadras do Plano Piloto e as ruas das regiões administrativas que circundam o coração do Brasil. 

O sotaque na capital

Uma população unida há 60 anos já viveu o suficiente para se expressar em um único sotaque? Para o professor e sociolinguista Newton Lima Neto, sim; mas ainda não é possível dizer se há apenas um falar brasiliense ou muitos “falares”.

Ele explica que já dá para identificar características comuns no sotaque de diferentes indivíduos de Brasília, o que não acontecia nas gerações anteriores, já que muitos ainda mantinham a forma de falar trazida por seus antecessores de outros estados. “Quando a gente pensa na primeira geração de Brasília, você encontrava diversas formas, diversos falares. Na segunda, essas formas começam a focalizar. E agora, se você for comparar isso tudo, gravar amostras de brasilienses você vai ver, por exemplo, que o ‘e’ tende a ser fechado, então eu vou falar delícia e não ‘délicia’’’, explica.

Para a PHD em linguística, Stella Maris Bortoni, essas são apenas tendências ao que pode vir a ser o sotaque brasiliense. Mas por elas já é possível perceber características que devem permanecer no falar da população do Distrito Federal, como a ausência de marcas que identificam o sotaque de outros estados e regiões brasileiras.

“Essa ausência deverá ser a nossa identidade, na medida em que as novas gerações de brasilienses falem de modo que a sua fala não seja associada imediatamente a nenhuma outra região, é um falar muito próximo do da mídia, dos modos de articular e de pronunciar que os locutores da grande mídia usam” diz.

Segundo Stella, esse comportamento já foi observado em outras regiões no mundo, onde houve uma convergência de pessoas que trouxeram diferentes falares. “Quem estuda essa tradição linguística vai ver que aconteceu com a Alemanha. Por que na Alemanha? Porque lá, o país dividiu-se depois da Segunda Guerra, em Alemanha Oriental e Alemanha Ocidental e nas áreas de convergência de alemães de diversas regiões, o falar ficou não marcado”, explica.

Para Newton, essa convergência se deu de forma diferente no Distrito Federal, já que as diferenças sociais e culturais fizeram com que grupos de pessoas se organizassem em 31 regiões administrativas, também chamadas de cidades satélites. “Em Ceilândia, por exemplo, onde a gente tem o maior contingente de migrantes nordestinos, você vai encontrar a forma “délicia”, mesmo na fala das novas gerações. Agora, o que não acontece é você gravar indivíduos separados e ter uma mistura incaracterística”, diz.

Como as formas de pronunciar e a entonação do brasiliense já permitem que outras pessoas, que não vivem em Brasília, consigam identificar o sotaque de quem é da capital federal, segundo Newton, agora resta apenas saber se permanecerá apenas uma ou mais formas de falar. “Daqui há umas duas gerações, a gente vai começar a entender se já existe um único sotaque tipicamente do Distrito Federal, ou se a desigualdade social entre essas regiões é tanta, que cada uma está começando a ter o seu próprio falar”, conclui.

Como a própria língua portuguesa, as gírias também têm vida própria e mudam com o passar do tempo. Em 60 anos, as gerações de Brasília já usaram muitas delas, mas quais são genuínas da capital federal? Segundo o professor e pesquisador de sociolinguística Newton Lima Neto, mais importante que saber se nasceram aqui, ou vieram de outro lugar, é entender se há consistência no uso delas.

“A gente dificilmente chegará a uma resposta se ‘véi’ é uma gíria tipicamente brasiliense. Você pode ir no interior de São Paulo e encontrar também essa gíria, mas como que ela é falada lá? Em Brasília, você altera a entonação e você pode mudar completamente o sentido da frase”, explica.

As gírias são palavras que ganham novos sentidos entre um grupo de pessoas. Segundo Newton, elas fazem parte do dialeto, que inclui sotaque, ritmo e palavras. Algumas surgem em função de comportamentos, lugares e até características arquitetônicas de uma cidade. “Na parte central de Brasília, no Plano Piloto, vários termos têm entrado na fala da população jovem, como ‘tesourinha’, ‘fazer um balão’, ou então brincar ‘debaixo do bloco’. Não necessariamente isso é a verdade em outras partes da cidade, ou em outros estados”, explica.

Muitas gírias são lançadas entre grupos de pessoas que vivem em uma cidade, mas nem todas vão realmente compor o repertório de expressões daquele lugar. Newton lembra do exemplo da gíria “camelo” empregada para identificar bicicleta, que ganhou fama em uma das músicas da banda Legião Urbana. “Talvez aquele pequeno grupo de jovens usasse ‘camelo’,  e um deles ficou famoso. Então, a gente não pode atribuir necessariamente ‘camelo’ como uma expressão tipicamente brasiliense, porque se você escuta a fala dos jovens hoje, quem é que está usando isso?”, diz.

Assim como o sotaque, as gírias contam partes da história e representam uma ferramenta importante na construção cultural de Brasília. “Se uma comunidade está escolhendo determinadas expressões para compor o seu repertório linguístico, isso aponta, sim, para uma constituição de identidade”, conclui Newton.

As gírias

Como a própria língua portuguesa, as gírias também têm vida própria e mudam com o passar do tempo. Em 60 anos, as gerações de Brasília já usaram muitas delas, mas quais são genuínas da capital federal? Segundo o professor e pesquisador de sociolinguística Newton Lima Neto, mais importante que saber se nasceram aqui, ou vieram de outro lugar, é entender se há consistência no uso delas.

“A gente dificilmente chegará a uma resposta se ‘véi’ é uma gíria tipicamente brasiliense. Você pode ir no interior de São Paulo e encontrar também essa gíria, mas como que ela é falada lá? Em Brasília, você altera a entonação e você pode mudar completamente o sentido da frase”, explica.

As gírias são palavras que ganham novos sentidos entre um grupo de pessoas. Segundo Newton, elas fazem parte do dialeto, que inclui sotaque, ritmo e palavras. Algumas surgem em função de comportamentos, lugares e até características arquitetônicas de uma cidade. “Na parte central de Brasília, no Plano Piloto, vários termos têm entrado na fala da população jovem, como ‘tesourinha’, ‘fazer um balão’, ou então brincar ‘debaixo do bloco’. Não necessariamente isso é a verdade em outras partes da cidade, ou em outros estados”, explica.

Muitas gírias são lançadas entre grupos de pessoas que vivem em uma cidade, mas nem todas vão realmente compor o repertório de expressões daquele lugar. Newton lembra do exemplo da gíria “camelo” empregada para identificar bicicleta, que ganhou fama em uma das músicas da banda Legião Urbana. “Talvez aquele pequeno grupo de jovens usasse ‘camelo’,  e um deles ficou famoso. Então, a gente não pode atribuir necessariamente ‘camelo’ como uma expressão tipicamente brasiliense, porque se você escuta a fala dos jovens hoje, quem é que está usando isso?”, diz.

Assim como o sotaque, as gírias contam partes da história e representam uma ferramenta importante na construção cultural de Brasília. “Se uma comunidade está escolhendo determinadas expressões para compor o seu repertório linguístico, isso aponta, sim, para uma constituição de identidade”, conclui Newton.