Taxa de eleitores que não escolhem candidato no 2º turno é recorde
Alienação eleitoral chegou a 53,9% no domingo (29)
Publicado 01/12/2020 11:36 | Editado 01/12/2020 13:04
Em duas cidades brasileiras, mais de metade dos eleitores aptos a votar não compareceram às urnas, anularam o voto ou votaram em branco no último domingo (29). Essas três atitudes compõem o conceito de “alienação eleitoral”, que bateu recorde no segundo turno do pleito municipal de 2020, conforme levantamento feito pelo Valor Econômico com base em dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A taxa de eleitores que não escolhem candidato nenhum neste segundo turno alcançou 53,9% em Campinas (SP) e 51% em Petrópolis (RJ). Entre as capitais, o Rio de Janeiro se destaca, com alienação de 47,6%. O. A Justiça Eleitoral desconsidera a alienação na hora de divulgar os resultados e conta apenas os votos válidos recebidos pelos candidatos.
Para o deputado federal Pedro Paulo (DEM-RJ), colaborador do prefeito eleito do Rio, Eduardo Paes (DEM), o fenômeno das altas abstenções foi nacional, mas existem razões locais. “No Rio, (houve) calor, sol, medo da segunda onda do coronavírus. Ainda não temos o mapa por bairros – mas, se recortar por zonas eleitorais, há áreas com uma população mais idosa, que compareceu menos”, diz. “É a realidade da pandemia muito menos, acredito eu, do que uma insatisfação em relação ao processo político. É mais a conjuntura, as pessoas estão com medo. E há também a facilidade de justificar a ausência.”
O cenário de pandemia de Covid-19– que, desde fevereiro, matou 173 mil pessoas no País – ajuda a explicar por que parte da população optou por ficar em casa em vez de ir votar. O Rio, por exemplo, é a capital com a maior proporção de idosos. O voto não é obrigatório para quem tem mais de 70 anos de idade. Pessoas com mais de 60 anos são consideradas grupo de risco para a Covid-19.
Esse fator não conta, no entanto, toda a história a respeito dos índices de brasileiros optando por não participar da escolha de um dos dois candidatos que estavam no segundo turno em cada uma das 57 cidades onde houve disputa no domingo. Municípios onde as pesquisas de intenção de voto indicavam um líder isolado tiveram níveis maiores de alienação.
Nesse caso, segundo o cientista político Guilherme Russo, pesquisador do Centro de Política e Economia do Setor Público da Fundação Getulio Vargas (FGV Cepesp), o eleitor não sente que seu voto vá fazer diferença no resultado e tende a não votar. É o caso do Rio, em que Eduardo Paes (DEM), às vésperas da votação, tinha 40 pontos de vantagem em votos válidos em relação a Marcelo Crivella (Republicanos). Aconteceu também em Piracicaba (SP), que teve alienação de 46%; em Goiânia (GO), onde o indicador bateu em 45,6%; e em Ribeirão Preto (SP), com 44,7% de alienação.
O eleitor faz um movimento oposto onde as pesquisas indicavam uma disputa acirrada, como nas cidades baianas de Vitória da Conquista e de Feira de Santana. Lá aconteceram viradas e a alienação eleitoral diminuiu 4,5 pontos percentuais em relação ao primeiro turno. Em Vitória da Conquista, Zé Raimundo (PT) havia conquistado 47,6% dos votos no primeiro turno, contra 45,8% de Herzem Gusmão (MDB). No segundo turno, Herzem venceu, com 54%.
Já em Feira de Santana, Zé Neto (PT) passou para o segundo turno na frente, com 41,5% dos votos contra 38,1% de Colbert Martins (MDB). Acabou derrotado, com o candidato do MDB obtendo 54,4% dos votos válidos. “A alienação eleitoral não sobe naqueles municípios em que há boas chances de vitória dos dois lados que disputam o segundo turno”, afirma Guilherme Russo. “Foi o caso também de Recife, Cuiabá e de Ponta Grossa.”
A conjuntura política local também conta nos municípios líderes em votos nulos, em branco e em abstenção. Em Campinas, passaram para o segundo turno Dario Saadi (Republicanos) e Rafa Zimbaldi (PL). O candidato do PT, Pedro Tourinho – que tinha uma vice do PSOL –, não avançou por uma diferença de 6 mil votos. Tanto PT quanto PSOL decidiram não apoiar nenhum dos dois postulantes e se puseram, desde aquele momento, se colocaram como oposição a quem fosse eleito.
Dario Saadi acabou eleito em Campinas, com 57% dos votos válidos. O político recebeu 222.030 votos. É menos do que o número de eleitores que não apareceram para votar na cidade: as abstenções somaram 297.297. Guilherme Russo, da FGV, chama a atenção para a quantidade de votos em branco e nulos. Foram 157.111 – cerca de 46 mil a mais que no primeiro turno. “Houve um problema de representação”, explica Russo. Os eleitores foram às urnas e deixaram registrado que não apoiavam nenhum dos dois candidatos que estavam no segundo turno.”
Com informações do Valor Econômico
São as duas coisas conjugadas: a pandemia e o desencanto com a democracia de fachada. O termo “alienação eleitoral” me parece capcioso, na medida que incorpora entre os “alienados” votos conscientemente negados e legítimos de indivíduos com perfil crítico e progressista que, com bastante motivos justos, se recusam a participar do teatro da democracia de fachada da democracia burguesa. Esse tipo de eleitor, que não acredita mais na democracia de baixíssima intensidade existente no Brasil, está disponível, entretanto, para a luta de massas, de resistência aos ataques aos seus direitos sociais e às liberdades democráticas que percebe ocorrer em nosso país. Não faz o menor sentido sinalizar mudanças pela via eleitoral que sabemos que jamais ocorrerão sem duras lutas de massas, em defesa ativa dessas mudanças, protagonizadas por trabalhadores e individuos do povo. A luta institucional somente ganha significado quando integrada e subordinada à essa luta de resistência, travada fora das instituições da democracia burguesa de fachada, em defesa dos interesses imediatos e do socialismo. Somente sssim o próprio ato de comparecer às urnas pode ser ressignificado e valorizado por quem deliberadamente decidiu anular seu voto.