Brasil: uma diplomacia em ruína, por Aldo Rebelo

A orientação “ideológica” do atual governo teve como efeito a paralisação do esforço de integração em infraestrutura, energia e comunicações com os nossos vizinhos.

Bolsonaro e ministro das Relações Exteriores - Reprodução da Internet

A reputação da diplomacia brasileira está em frangalhos aos olhos do mundo após colher uma sucessão de vexames e fracassos e tornar o Brasil menor em episódios que costumavam confirmar a eficiência, o profissionalismo e a competência do serviço do Itamaraty.

O atual presidente da República acusou em sua campanha os governos anteriores de adotar um viés ideológico em política externa. E o que fez ao tomar posse? Aloja no Ministério das Relações Exteriores o grupo ideológico mais sectário dentre seus apoiadores. O resultado não poderia ser pior: o edifício que sustentava a credibilidade de nossa diplomacia veio abaixo e pela primeira vez na história o Itamaraty deixou de ser parte da solução para se tornar parte do problema nas dificuldades enfrentadas pela política externa do Brasil.

O episódio mais recente que exigiu o afastamento do Itamaraty foi a negociação com o governo chinês para a aquisição de vacinas e insumos necessários ao enfrentamento da pandemia da Covid-19 entre nós. As agressões do ministro Ernesto Araújo à China inviabilizaram seu papel nas negociações.

O presidente Getúlio Vargas e seu chanceler, Oswaldo Aranha, lideraram a política externa do Brasil nos anos conflagrados pela Segunda Guerra Mundial.

Para proteger a fidelidade ideológica do presidente brasileiro e de seu chanceler ao ex-presidente Donald Trump, criou-se o mal-estar com os Estados Unidos e o atual presidente Joe Biden e hoje a relação entre os dois países é cercada por uma atmosfera de desconfiança e animosidade.

A situação mais inesperada veio com a posição brasileira de se aliar aos Estados Unidos contra a Índia, a África do Sul e um grande número de países proponentes da quebra de patentes para vacinas. O fato mereceu o repúdio de instituições e personalidades indianas quando o Brasil se propôs a comprar vacinas daquele país contra a Covid-19.

A América do Sul, entorno estratégico de nossa diplomacia e política de defesa, foi transformada em arena de embate ideológico e abandonada a política externa pragmática, baseada em relações de Estado voltadas para o interesse nacional seguida pelo Brasil desde o final da Guerra do Paraguai. A orientação “ideológica” do atual governo teve como efeito a paralisação do esforço de integração em infraestrutura, energia e comunicações com os nossos vizinhos.

A atuação desorientada colocou o Brasil, detentor da mais rigorosa legislação ambiental do planeta, no banco dos réus na condição de vilão do meio ambiente. E o País que mais protegeu florestas tropicais no mundo é acusado injustamente nas redes sociais pelos mais nefandos crimes contra a natureza.

O presidente Ernesto Geisel e seu ministro das Relações Exteriores, Azeredo da Silveira, conduziram a diplomacia vitoriosa do Brasil no reconhecimento da independência dos países africanos de língua portuguesa.

A diplomacia nacional conheceu momentos de glória no reconhecimento da Independência, na solução dos explosivos conflitos do Prata, na negociação dos litígios de fronteira, na consolidação da República, nos acordos para nossa participação na Segunda Guerra Mundial, no reconhecimento da independência dos países africanos de língua portuguesa. A diplomacia de José Bonifácio, do Visconde do Uruguai, do Visconde do Rio Branco, do Marechal Floriano Peixoto, do Barão do Rio Branco, de Ruy Barbosa, Getúlio Vargas, Oswaldo Aranha, Góes Monteiro, Araújo Castro, San Tiago Dantas, Azeredo da Silveira, Ernesto Geisel e Saraiva Guerreiro tem hoje a reputação profundamente manchada pelos governantes do dia.

Os interesses legítimos do Brasil estão desprotegidos com a atual política externa. É certo que ela passará, mas deixará um rastro de descrédito e desconfiança cujo preço pagamos hoje e pagaremos no futuro.

Fonte: Bonifácio

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