Bolsonaro transforma Brasil em “ameaça global”, diz Jamil Chade

Há uma associação cada vez mais automática entre brasileiros e a pandemia de Covid-19, graças ao comportamento negligente do presidente da República

O jornalista Jamil Chade, colunista do portal UOL, relatou nesta sexta-feira (5) diversas situações que confirmam a transformação do Brasil numa “ameaça global” sob o governo Jair Bolsonaro. Segundo Jamil, há uma associação cada vez mais automática entre brasileiros e a pandemia de Covid-19, graças ao comportamento negligente do presidente da República.

“Em alguns locais, os comentários vêm permeados por ironias e até uma solidariedade sincera com o que ocorre no Brasil. Em outros, o tratamento vem de forma mais séria. Mas todos com o mesmo sentido: a desconfiança sobre o país é profunda”, afirma o jornalista.

Segundo ele, “os berros das manchetes dos jornais britânicos estampavam uma ‘caçada’ das autoridades sanitárias em busca de uma pessoa que estaria com o ‘vírus brasileiro’. De tanto usar a nacionalidade chinesa para deliberadamente designar a doença, Jair Bolsonaro e sua milícia digital passaram a ter de engolir de seu próprio veneno ao ver o nome do Brasil, agora, qualificar um vírus ainda mais perigoso”.

Essa crescente ojeriza aos brasileiros foi demonstrada por Jamil Chade com exemplos de seu dia a dia:

Nesta semana, recebi um telefonema de um casal de diplomatas que estava num país da América do Sul. A voz do outro lado da linha era de pessoas desesperadas. Precisavam voltar para seu posto na Europa e, horas antes do voo, a companhia aérea deu aos passageiros uma péssima notícia: o avião teria de fazer escala no Brasil.

O medo de uma contaminação os levou a duvidar se deveriam embarcar, enquanto consultas legais eram realizadas com as entidades onde trabalhavam para saber se passar pelo Brasil representaria um risco.

Há poucos dias, levei meu filho caçula ao dentista e, ao ver que era eu quem o acompanhava, o profissional imediatamente deu um passo para trás e perguntou: você não esteve recentemente no Brasil, não é?

Nesta sexta-feira, ao entrar na sede da ONU em Genebra, fui parado pelo correspondente do New York Times assombrado com o que leu sobre a reação do presidente Jair Bolsonaro diante da crise.

O jornalista acrescenta que o receio da chegada de brasileiros em aeroportos é algo frequente. “Aeroportos de todo o mundo passaram a tratar qualquer um vindo do País como suspeito, enquanto a suspensão de conexões aéreas e fechamentos de fronteiras se ampliam e se estendem.”

Assim, conclui Jamil, o Brasil deixou de ser apenas um “pária no mundo” para se tornar “uma das ameaças” globais. As estatísticas da pandemia reforçam essa impressão: “Em 24 horas, mais de 20% dos novos contaminados no planeta pela Covid-19 estavam no Brasil. Na última semana, representamos 12% de todos os mortos. E pior: não há controle e nem uma estratégia para sair de um velório que parece não ter fim”.

Mais do que a pandemia, porém, o fator que põe a comunidade internacional em alerta com o Brasil é Bolsonaro, tachado de “louco” na cúpula da OMS (Organização Mundial da Saúde). Sob seu governo, há um “‘apagão’ de dados no Brasil sobre a circulação da variante encontrada em Manaus”, além de “um grupo de bombeiros cegos enviados a combater um incêndio”.

O colunista conclui que o País vive uma grave crise de imagem, que põe em xeque a “reputação de uma nação, de uma economia e de uma imagem construída ao longo de décadas”, mas destruída aos poucos pelo bolsonarismo. “Apresentado como um país doente e sem rumo, com um presidente negacionista e incapaz de dar uma resposta, o Brasil vive o seu pior momento no palco internacional desde o fim do Regime Militar”, escreve Jamil.

“Se os incêndios na Amazônia em 2019 elevaram Bolsonaro uma espécie de ‘vilão do mundo’, sua gestão da pandemia nos tornou tóxicos aos olhos do planeta”, agrega. “Não sabemos quantos ainda morreremos até o final dessa crise sanitária, nem se nos transformaremos no ‘misterioso país das lágrimas’ ao final da pandemia. Mas, entre os efeitos colaterais do ‘vírus brasileiro’, já temos algumas certezas: uma parcela da história do País vem sendo enterrada em cada caixão, assim como seu lugar no mundo.”

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