Thiago de Mello, 95 anos: “Um dos grandes poetas no nosso tempo”

Segundo Alceu Amoroso Lima , Thiago foi um dos mais “típicos representantes da chamada ‘geração de 45’”

O poeta amazonense Thiago de Mello completou 95 anos nesta terça-feira (30). Para celebrar a data, o Prosa, Poesia e Arte, seção cultural do Portal Vermelho, publica, a cada dia, poemas de sua autoria, entrevistas com o autor ou ensaios sobre sua obra. Para o crítico literário Alceu Amoroso Lima (1893-1983), Thiago foi “um dos grandes poetas do nosso tempo. E dos mais típicos representantes da chamada ‘geração de 45’, a que nasceu para as letras depois da morte de Mário de Andrade”. Confira uma crítica de Alceu escrita “no calor da hora”, em 1966.

UM DOS GRANDES POETAS NO NOSSO TEMPO

Por Alceu Amoroso Lima

Thiago de Mello é, sem a menor dúvida, um dos grandes poetas do nosso tempo. E dos mais típicos representantes da chamada “geração de 45”, a que nasceu para as letras depois da morte de Mário de Andrade.

Estreou em 1951 e desde então sua poesia representa aquilo que Mário de Andrade deixou como testamento: a necessidade de uma participação do poeta na marcha do mundo, nos acontecimentos do mundo e mesmo na reforma do mundo. Aquilo que Carlos Drummond de Andrade também disse na Rosa do Povo.

Thiago de Mello cada vez mais representa o poeta participante, como um Moacyr Felix, como um Eduardo de Oliveira, o novo poeta negro. O drama do mundo cada vez mais capta sua poesia, mas esta não perde, com isso, nada de sua tessitura alada. É uma poesia verbalmente leve, delicada, sutil, mas sempre ligada a um profundo sentimento interior, que ultimamente se torna cada vez mais transparente ao drama do mundo moderno, como se nota claramente nos poemas do Faz Escuro Mas Eu Canto.

Esses exilados do interior representam a nossa nova Canção do Exílio, e é de sua comparação com o poema de Gonçalves Dias – que foi como que a primeira voz da poesia intensamente brasileira – que melhor podemos entender o caminho que vai do romantismo ao neomodernismo, que é também, como o próprio modernismo o foi, um neorromantismo. Ao passo que Gonçalves Dias pensava em si e sua pátria longínqua, Thiago de Mello pensa na dor humana, na injustiça, na opressão, a ausência de liberdade e, portanto, no que há de universal e de revolucionário no momento atual de todo o mundo, do Brasil e de si próprio. Pois seus poemas não se tornaram em nada sectários nem bombásticos com essa conversão crescente ao social.

Basta lembrar a imensa ternura dos versos dedicados ao nascimento do seu filho Manuel ou à morte do seu amigo, o nosso José Lins do Rego.

Os versos de Thiago de Mello constituem, sem a menor dúvida, a expressão mais transparente e bela, significativa e profunda, não só de um poeta autêntico, mas de um momento crucial da alma brasileira em sua fase decisiva da evolução de sua cultura.

Essa conversão ao social não o afastou de si mesmo. Apenas o Narciso Cego abriu os olhos ao Vento Geral do mundo. Seu narcisismo era intransparente à sua própria imagem.

Cego assim não me decifro
E o imaginar-me sonhado
não me completa: a ganância
de ser-me inteiro prossegue.
E paira – pânico mudo –
entre o sonho e o sonhador.

Agora sua “ganância de ser-me inteiro”, talvez por influência de Pablo Neruda, de quem se aproximou durante sua permanência trienal no Chile, venceu o narcisismo e o vento geral o levou ao próximo, à vida em contínua transformação, do mundo em mudança.

E o poeta se completou, sem perder em nada a sua angústia. Pois, ai dos poetas que fecham totalmente o ciclo de sua vida. A poesia tem de ser sempre uma abertura para o infinito. E a esperança que ressuma de seus poemas mais recentes do Faz Escuro Mas Eu Canto, bem mostra que a sua poesia não foi “apenas um erro no pensamento de Deus”.

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