Brasileiros temem desemprego e falta de vacina, aponta pesquisa

Para além de 2021, a “demora na solução da Covid” é a principal fonte de inquietações

A segunda onda da pandemia de Covid-19 no Brasil, agravada pela política genocida do governo Jair Bolsonaro, deixou a população mais pessimista com o futuro. Conforme pesquisa do Instituto Travessia, divulgada nesta terça-feira (4) pelo jornal Valor Econômico, oito em cada dez brasileiros (78%) disseram que as consequências da crise sanitária serão “devastadoras” para o País.

A enquete questionou qual o problema que mais preocupa a população em 2021, com base em uma lista com seis temas pré-definidos. O “desemprego” liderou as respostas com vantagem, concentrando 37% das aflições. A seguir, veio a “falta de vacinas”, com 20%. Empatados, na sequência, aparecem a “inflação” e a “segurança”, com 16% cada. Por fim, há a “piora no atendimento dos pacientes da Covid-19”, com 7%, e “crise política”, com 4%.

Entre esses itens, o que sofreu maior desgaste foi o medo da “falta de vacinas”, que subiu de 14% para 20%. Aqui, os mais jovens, que estão no fim da fila da imunização, destacaram-se entre os mais preocupados. O problema foi citado por 22% dos entrevistados entre 25 e 24 anos. Por outro lado, o mesmo tema foi mencionado por 15% daqueles que têm 60 anos ou mais. A “piora no atendimento da doença” aflige com mais intensidade os mais pobres, com renda de até dois mínimos por mês.

Para além de 2021, a “demora na solução da Covid” é a principal fonte de inquietações, aglutinando 25% das escolhas. O assunto empatou com a questão do “desemprego”, com 24%. “Isso mostra que a falta de trabalho é um receio muito presente. Ele emerge tanto agora – em 2021 – como no futuro”, afirma Renato Dorgan Filho, analista e sócio do Instituto Travessia.

As expectativas são ainda de aumento da inflação e da perda de postos de trabalho, além de queda de renda. A maior parte dos entrevistados não acredita que conseguirá poupar (83%), tampouco vê possibilidade (68%) de fazer uma compra de valor mais alto, como a aquisição de eletrodomésticos ou produtos eletrônicos.

Apenas uma pequena parcela (9%) acredita que, neste ano, a situação econômica do País vai melhorar. Para 47%, a recuperação só ocorrerá em 2022 e, na opinião de 35%, isso deve “demorar muito”. Desiludidos, 6% dizem que “nunca mais vai melhorar”. Em relação à condição pessoal ou familiar, os números são mais pessimista: para 40%, o alívio só virá em 2022 e, para 42%, vai “demorar muito”. “As pessoas sabem que, antes de a situação pessoal apresentar algum alento, é preciso que a economia engrene”, afirma Dorgan Filho.

O resultado da enquete está atrelado à pior fase já observada da Covid-19 no País, mas corresponde ao cenário de resiliência pesada dos atuais indicadores econômicos. A taxa média de desemprego no Brasil, por exemplo, ficou em 14,4% no trimestre encerrado em fevereiro. Isso significa que mais de 14,4 milhões de brasileiros estão procurando trabalho – e não encontram. Trata-se do maior contingente desde 2012, início da série histórica da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua).

“Como muitas dessas pessoas são responsáveis pelo sustento das famílias o impacto negativo do problema é muito maior. Ele alcança entre 50 milhões e 60 milhões de pessoas”, diz Márcio Holland de Brito, professor da Escola de Economia da São Paulo, da Fundação Getulio Vargas (FGV -EESP). “E não há perspectiva que indique uma taxa de desemprego abaixo de dois dígitos até o fim do ano que vem.”

Não é qualquer nível de crescimento da economia que tem forças para levantar os indicadores de emprego. Neste ano, o PIB brasileiro deve avançar 3,7%, segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), uma taxa considerada otimista pelo mercado – que projeta 3%. Ainda assim, o percentual é resultado do que os técnicos chamam de um “carregamento estatístico”, fruto da comparação de cada trimestre de 2021 com o mesmo período de 2020. Se o contraste fosse feito entre os trimestres deste ano, o resultado seria próximo de zero.

Mesmo os estimados 3,7% estão condicionados a uma série de fatores, como o pagamento do auxílio emergencial de R$ 44 bilhões entre maio e junho, a estabilidade da pandemia e um ritmo maior de vacinação no segundo semestre.

Há saídas para essa arapuca, opina Manoel Pires, pesquisador da área de economia aplicada do FGV Ibre. “Em alguma medida, podemos dizer que a pandemia tem um prazo para sofrer um revés. Com uma vacinação em massa, uma parte importante do nó atual será desfeita”, diz Pires. “Para isso, a baixa velocidade de imunização tem de mudar. Hoje, cerca de 14% dos brasileiros tomaram pelo menos a primeira dose do imunizante. É pouco.”

Pires acrescenta que os governos, notadamente o federal, precisam oferecer algum grau de proteção não só às pessoas, mas ao setor produtivo também. “O problema é que essa agenda de ajuda a empresas só deve estar pronta em meados de maio”, diz. “Essas coisas vão atrasando e, quanto mais tempo demoram para ser resolvidas, mais difícil é consertá-las.”

Os questionários foram aplicados pelo Instituto Travessia nos dias 15 e 16 de abril, com abrangência nacional, por meio de entrevistas telefônicas com cerca de mil pessoas.

Com informações do Valor Econômico