Vitória consagradora impulsiona as mudanças no segundo mandato

''O resultado não foi positivo apenas nos seus números finais. O segundo turno, temido a princípio, acabou cumprindo um papel altamente educativo e ideológico – termo que a direita já havia enterrado. Foi outra campanha, mais politizada e radicali

por RENATO RABELO*


 



Os resultados das eleições neste domingo (29) superaram todas as expectativas e deram enorme impulso às forças mudancistas na sociedade brasileira. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi consagrado nas urnas, obtendo mais de 58 milhões de votos, uma votação ainda maior do que no primeiro turno e mesmo do que no segundo turno de 2002, quando obteve 52,8 milhões de votos. Já o candidato da oposição liberal-conservadora, Geraldo Alckmin, que saiu do primeiro turno com a falsa impressão de que poderia vencer a disputa presidencial e foi alavancado pela mídia hegemônica e bancado pelas elites conservadoras, viu a sua votação derreter. Teve menos votos do que no primeiro turno e ainda sai da batalha com seu partido dividido e envolto em intensa guerra interna.


 


Para reforçar ainda mais as forças da mudança, o segundo turno também garantiu importantes vitórias nas eleições para os governos estaduais, como Pará, Rio de Janeiro, Pernambuco, Paraná e Rio Grande do Norte. Em todos estes estados, os governadores eleitos apoiaram publicamente a reeleição do presidente Lula.


 


O segundo mandato do governo Lula começa com uma base de apoio nos estados bem maior do que o primeiro. Dos 27 governadores, 20 já sinalizaram apoio ao presidente reeleito. Mesmo os governadores eleitos do campo da oposição precisarão repactuar as forças para viabilizar suas gestões. No âmbito parlamentar, o governo Lula também saiu do pleito com um arco de alianças mais amplo, a partir da presença ativa no novo governo de coalizão do PMDB, que elegeu a maior bancada no Congresso Nacional.


 


Politização e derrota das idéias neoliberais


 


Mas o resultado não foi positivo apenas nos seus números finais. O segundo turno, temido a princípio, acabou cumprindo um papel altamente educativo e ideológico – termo que a direita já havia enterrado. Foi outra campanha, mais politizada e radicalizada, com a polarização entre dois projetos antagônicos para o futuro da nação. E as forças comprometidas com as mudanças venceram o debate de idéias na sociedade. A direita neoliberal ficou na defensiva, tendo que se justificar. Ela foi derrotada no terreno ideológico, como reconheceu publicamente o ex-presidente do Banco Central, Armínio Fraga.


 


De um lado, o presidente Lula demonstrou convicção sobre a necessidade de mais acentuado desenvolvimento com distribuição de renda, de fortalecer o Estado nacional, de superar a fase das privatizações, de viabilizar mais investimentos nas áreas sociais e na infra-estrutura do país, de prosseguir na opção por uma política externa soberana. Do outro, o neoliberal Alckmin ficou acuado, sem conseguir justificar as privatizações, pregando o retrocesso na política externa, com o alinhamento automático com os EUA, esbravejando pela criminalização dos movimentos sociais, defendendo a redução do papel do Estado, com cortes na ''gastança pública''. No debate programático, a direita não conseguiu defender seu ideário neoliberal.


 


A urgência de rediscutir o papel da mídia


 


Quem também sofreu uma retumbante derrota no segundo turno foi a mídia hegemônica, controlada por apenas nove famílias e cada vez mais monopolizada e comprometida com o pensamento único emanado dos círculos centrais financeiros. O seu papel nesta eleição foi abjeto, um verdadeiro atentado à democracia e à própria ética jornalística. Na prática, foi ela que adiou o resultado para o segundo turno ao amplificar denúncias de corrupção sem provas e a partir de atitudes ilícitas de um delegado, conforme revelou a histórica reportagem do jornalista Raimundo Pereira. Para Marcos Coimbra, do Vox Populi, ''nunca se viu na história tanta interferência da mídia numa eleição''.


 


Mas a sociedade, em especial suas camadas mais carentes, não se deixou manipular pelos ''deformadores de opinião''. Com a prioridade ao debate programático no segundo turno, que ofuscou o falso moralismo da direita e de sua imprensa venal, a sociedade também julgou e condenou a mídia. Este episódio tem um grande significado. Serve para soterrar as ilusões na imparcialidade da imprensa. Recoloca, num patamar mais elevado, a urgência de democratizar os meios de comunicação, garantindo instrumentos alternativos, como uma forte rede pública de comunicação e a multiplicação de rádios e TVs comunitárias.


 


A força do povo e os compromissos


 


A consagradora vitória eleitoral coloca enorrmes desafios para o segundo mandato do presidente Lula. Ela se deu graças, principalmente, ''a força do povo'', que derrotou as manipulações da mídia hegemônica, a ferrenha unidade das elites neoliberais e os ataques desestabilizadores da direita golpista. Diferentemente de 2002, num cenário de instabilidade, no qual o candidato assinou a ''carta ao povo brasileiro'', firmando compromissos para acalmar o ''deus-mercado'', desta vez o presidente firmou inúmeros compromissos com as camadas populares, em plena praça pública, nas dezenas de comícios e manifestações.


 


Os trabalhadores reconheceram os avanços do primeiro mandato e também mostraram sabedoria ao julgar os obstáculos e erros cometidos. Mas, acima de tudo, o povo revelou seu desejo pelo aprofundamento das mudanças no Brasil – ''deixa o homem trabalhar'', cantarolou pelas ruas. O presidente também reconheceu as suas limitações e afirmou, com sinceridade, que pretende avançar muito mais no sentido democrático e popular no segundo mandato. Seu compromisso foi com uma nova fase de desenvolvimento no país, o que exigirá destravar a economia dos garrotes neoliberais; o seu compromisso foi com um crescimento acelerado com justiça social, com geração de emprego e renda; o seu compromisso foi com a integração latino-americana.


 


Ampla coligação pelas mudanças


 


Com ''a força do povo'', o segundo turno permite maior ousadia e convicção de projeto no novo governo. O resultado também permite reunir amplas forças políticas e sociais com base num programa mudancista, desenvolvimentista, no rumo democrático-popular. Esta ampla coalizão deve servir para dar sustentação e impulso aos compromissos assumidos com o povo com as mudanças estruturais no país. Ela não pode visar uma governabilidade insossa, que resvale na mesmice e conserve os entraves ao desenvolvimento nacional. As urnas demonstraram, de forma taxativa, que a maioria da sociedade brasileira deseja que se avance nas mudanças por um Brasil democrático e soberano!


 


*Renato Rabelo é presidente nacional do PCdoB