Lula celebra alcance do Luz para Todos e fala em “pacote de cidadania”

Ao participar da cerimônia de comemoração ao atendimento de cinco milhões de pessoas pelo Programa Luz para Todos, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou que essa iniciativa continuará a ser prioridade no segundo mandato,  independentemen

“Atender a esses companheiros é ter clareza de que estamos fazendo política social. É ter clareza de que estamos fazendo política de inclusão. Pensando do ponto de vista do humanismo, do social, não pode ter benefício maior do que levar a modernidade para a casa das pessoas. O país tem que saber que tem coisa que, do ponto de vista do economês, não é aquilo que o economista diz que é viável”.


 


Lula reiterou a perspectiva de o governo de continuar investindo no programa e informou que a meta é atender, até 2008, 12 milhões de pessoas de todas as regiões do país, incluindo comunidades quilombolas, indígenas e rurais. “Determinados programas sociais, se forem pensados apenas do ponto de vista da viabilidade econômica, não acontecem, porque o lucro que dão num primeiro momento não é retorno em dinheiro. É retorno em benefício. O Estado tem que trabalhar pensando em cidadania. Somente o Estado é capaz de fazer política desse tipo”, afirmou.


 


Em discurso no Palácio do Planalto, Lula disse também pretende elaborar, em parceria com os ministros, uma espécie de “pacote de cidadania” voltado para os setores mais desfavorecidos. “Faz um ano que estou falando aos ministros da área social da importância de termos uma espécie de pacote de cidadania. Queremos, por exemplo, em cada assentamento, além de cumprir com aquilo que é necessário, levar saúde, educação, luz, para que as pessoas possam se sentir brasileiras de verdade”, explicou.


 


Ao ser indagado, em entrevista à imprensa, sobre a situação de violência no estado do Rio de Janeiro, o presidente disse que o governo federal fará “o que for preciso” para acabar com o “vandalismo” de algumas pessoas.  E acrescentou: “A ordem que o ministro Márcio Thomaz Bastos [da Justiça] e eu temos dado é que a gente faça todo o esforço para que possamos ajudar a resolver o problema do Rio de Janeiro e de outros estados”.


 


Para Lula, crimes comoos vistos recentemente no Rio não podem ser tratados como crimes comuns. “Se for o caso, significa a gente discutir mudanças na legislação, porque você não pode permitir que alguém possa entrar num ônibus, tocar fogo num ônibus e deixar as pessoas morrerem e achar que isso deve ser tratado como uma certa normalidade”, finalizou.


 




Confira abaixo a íntegra do discurso do presidente Lula na cerimônia em comemoração ao atendimento de 5 milhões de pessoas pelo Programa Luz para Todos.


 


Palácio do Planalto, 02 de janeiro de 2007


 


 Primeiro, quero dizer para vocês que quando a Dilma era ministra de Minas e Energia, o Silas era presidente da Eletrobrás, e esse Programa me foi apresentado, a Dilma me apresentou com um otimismo que, na época, eu achei exagerado, porque a gente tinha se comprometido, pelas estatísticas que tínhamos nas mãos, de atender, na verdade eu acho que eram 12 milhões de brasileiros que nós, supúnhamos, não tinham energia elétrica.
 O que nós estamos constatando agora é que depois que começamos o Programa, o número que nós tínhamos talvez seja superado pela realidade. Ou seja, a teoria é outra, na prática, a gente vai constatar que tem mais gente sem luz do que aquilo que estava previsto nos estudos que nós tínhamos até então.
 Eu não poderia deixar de agradecer, no dia de hoje, aos companheiros que são responsáveis pelo Programa nos estados, ao nosso querido ministro Silas e aos companheiros das empresas do Grupo Eletrobrás, porque este é um programa que habitualmente não poderia ser feito, porque quando se encomenda um estudo numa consultoria, eles vão dizer que esse Programa não teria viabilidade econômica, não tendo viabilidade econômica, portanto, não é um programa que deveríamos dar prioridade, porque é um programa caro. Isso é que nem telefonia no interior do País, ou seja, é muito fácil vender telefone nos grandes centros urbanos, mas quando tem que colocar telefone no interior do País já fica mais caro, fica mais difícil.
 E a energia elétrica é a mesma coisa. Uma coisa é colocar energia no centro de uma cidade, onde num poste só você vai iluminar uma quantidade enorme de casas. Mas, nesse caso, nós temos que sair pelo Brasil procurando as casas, porque às vezes elas estão escondidas no meio do mato, onde não vai pesquisador do Ibope, não vai pesquisador de outro instituto qualquer, porque é muito distante, então, habitualmente, só quem mora lá é quem vai lá. Lá não vai cobrador de imposto, lá não vai cobrador de luz, lá não vai Correio, às vezes, possivelmente, chegue o Correio, muitas vezes não chega porque não tem nem endereço, não tem rua.
 Então, atender a esses companheiros é ter a clareza de que nós estamos fazendo política social, é ter clareza de que nós estamos fazendo política de inclusão. E nós não teríamos feito isso, se não fosse a dedicação de vocês. E nós sabemos que podemos fazer mais. O Programa teve momentos encruados, não foram poucas as vezes que eu liguei para o Silas e cobrei do Silas o que estava acontecendo em tal estado, porque não estava acontecendo, porque o governador não estava colocando a sua parte, e se o governador não colocar, nós vamos tomar a decisão, vamos nós fazer esse Programa, porque o que importa não é ficar brigando com A ou com B, mas fazer com que chegue a energia na casa das pessoas.
 E eu falo desse Programa com muito orgulho, porque eu fui numa cidade da Bahia, Santo Estevão, inaugurar o Programa. Eu tinha ido a Vitória da Conquista ao meio-dia e descobri que não tem sentido você inaugurar ao meio-dia, porque o sol estava muito quente e a gente nem viu a luz acesa, de tanta claridade do sol. E eu queria ir à noite porque, como eu vivi até os sete anos de idade à base do candeeiro, eu queria saber qual era a emoção que as pessoas sentiam quando se acende um bico de luz dentro de casa. Não precisa ter lustre não, não precisa ser uma coisa chique, apenas um bico de luz.
 E nós chegamos numa casa para acender a luz, tinha duas senhoras e seis crianças com uma lamparina, que era uma lata de refrigerante com um pavio. Primeiro, a casa estava toda suja da fumaça do candeeiro e, depois, o cheiro do querosene o tempo inteiro queimando ali. Depois, as pessoas não conseguiam enxergar muito, não. Não dá para uma pessoa ler, não dá para uma pessoa escrever, não dá para uma pessoa colocar o botão de uma camisa, efetivamente não dá, as pessoas fazem porque contam com a luz de Deus iluminando um pouco a sua vontade.
 Eu me lembro que peguei na mão da mulher, levei na tomada e apertei a tomada, aquilo era como se fosse um milagre, porque é você tirar uma pessoa do século XVIII e trazê-la para o século XXI numa fração de milésimos de segundos.
Possivelmente as pessoas que moram nas cidades, quem já nasceu no centro de Brasília, no centro de São Paulo, com luz elétrica, de vez em quando, quando falta luz ficam irritadas, xingam todo mundo, porque têm que subir um apartamento de 10 andares, têm que subir pela escada, o elevador não funciona, ou estão no restaurante comendo e não conseguem comer, ficam nervosas, imaginem a dona Lucrecia e seu marido, que são casados há 57 anos e viveram esses 57 anos sem energia elétrica.
Ou seja, imaginem o milagre da sobrevivência, num país que já teve oportunidades extraordinárias no século passado, de se transformar numa grande nação, e cada vez mais as pessoas vão sendo escorraçadas para as periferias das cidades, dos campos, e cada vez mais essas pessoas vão sendo esquecidas pelo poder público.
A decisão que nós tomamos é de que todo brasileiro tem direito a ter energia elétrica na sua casa. E por quê? Porque a energia elétrica simboliza a possibilidade dessa pessoa dar o passo seguinte. Tratar de uma pessoa doente com energia elétrica fica mais fácil, somente quem já teve que levantar no escuro para procurar um comprimido para dor de cabeça ou para dor de dente, sabe o quanto a energia elétrica ajuda. Além disso, os benefícios materiais que vão chegando, ou seja, tudo aquilo que as pessoas acham que é comum terem e que no campo não tem. O tempo em que as pessoas matavam um porquinho, derretiam toda a banha, davam uma pré-cozida na parte comível, do boi ou do porco, e colocavam dentro da banha, porque se não colocar estraga a carne, ainda tem muitos brasileiros vivendo assim.
Então, levar energia elétrica para essas pessoas é dizer o seguinte: olha companheiro, você está vivendo no meio do mato, mas você está produzindo coisas para nós da cidade comermos. E se nós, na cidade, podemos ter uma geladeira para guardar a nossa comida, por que você, no campo, também não tem que ter? Por que não pode ter uma televisãozinha, por mais simples que seja? Como é a vida de uma criança hoje, sem televisão?
Eu me lembro Dilma, que eu morava na Vila Carioca e não tinha televisão, aí eu ia na casa de uma vizinha assistir televisão e, por ser visita, a gente não sentava no sofá, a gente sentava no chão, o sofá era do dono da casa, o que era correto, a casa era deles, mas a gente não podia viver sem uma televisão, a gente queria ver os desenhos, queria ver o jogo. Eu me lembro que tinha um bar e, quando a gente jogava, naquele tempo a luta livre era muito famosa, estou falando do começo da década de 60, e quando ia ter luta livre, que era quinta-feira, a gente só podia assistir a luta livre se tivesse dinheiro para gastar no bar. Como a gente era moleque e não tinha dinheiro, não via a luta livre. Jogo de futebol, para a gente ver, tinha que pagar, comprar um refrigerante, senão a gente não via. E naquele tempo eram milhões de brasileiros que não tinham televisão.
Eu fico imaginando, hoje, o que é para um jovem do campo ter acesso a um centro de computação, ter acesso à Internet. É uma revolução que muitas vezes a gente não consegue pensar a partir de Brasília. Eu acho que somente quem viveu isso e quem vive isso é que sabe a importância desse benefício chegar à casa das pessoas. Tem muita gente que fala: bom, mas o governo está gastando 6 bilhões e meio de reais nesse programa e não tem viabilidade econômica, porque se estivesse fazendo uma estrada poderia ser melhor.
 Pensado do ponto de vista eminentemente econômico é verdadeiro, mas pensado do ponto de vista do humanismo, do social, pode ter maior benefício do que a gente levar modernidade para a casa das pessoas que trabalharam a vida inteira e que não têm culpa de morar lá, não têm culpa de não ter energia elétrica, não têm culpa de não ter tido acesso a muitas coisas?
 Imaginem vocês um estado como o Rio Grande do Sul, que é um estado que conseguiu evoluir acima da média nacional, você imaginar que ainda não tem energia elétrica? Se você chega para um jovem, aqui de Brasília ou de São Paulo, e pergunta: você acredita que tem algum lugar que não tem energia elétrica? Ele vai dizer “não”. Quando, na verdade, na periferia da cidade dele ainda tem lugar que não tem energia elétrica.
 Eu me lembro, em Ilha Solteira, que tinha a Hidrelétrica de Urubupungá, e tinha uma ilha perto. Passava aquele monte de torre por cima da ilha, e aquela ilhinha, em que morava um grupo de pessoas, não tinha energia elétrica, porque não era economicamente viável.
 Este País não pode ser pensado apenas assim. Ele tem que ser pensado assim, mas tem que saber que tem coisa que, do ponto de vista do “economês”, não é aquilo que o economista diz que é viável, mas do ponto de vista social, do ponto de vista da solidariedade, do ponto de vista dos compromissos do governo, nós temos que gastar 6 bilhões e meio. Já gastamos 6 bilhões até agora, neste Programa, e podem ficar certos que nós vamos gastar mais 6 bilhões e meio, mais 7 bilhões, e vamos comemorar, em 2008, o atendimento a todos os brasileiros porque agora, também, os eletricistas já aprenderam a trabalhar melhor, os feitores de postes já aprenderam a fazer melhor, os companheiros, nossos parceiros nos estados, das empresas do Grupo Eletrobrás, também já sabem que não podem vacilar, não têm que medir distância, não têm que ficar brigando com o governador. Ninguém está lá para brigar com o governador, a gente está lá para fazer o programa. Se ele quiser pôr o dinheiro, nós agradecemos, se não quiser pôr, nós vamos lá, vamos fazer o Programa, porque nós assumimos um compromisso com o povo brasileiro.
 No mais, Silas, eu quero dizer para você que esse é um Programa que mexe com a vida das pessoas, e nós temos o direito e a obrigação de fazer mais do que estamos fazendo. Faz um ano que eu estou pedindo aos ministros da área social: nós temos que ter uma espécie de pacote de cidadania, ou seja, quilombola, terra indígena, assentamento, periferia mais pobre, nós temos que chegar lá com saúde, com educação, com luz, com computador, porque é assim que a gente vai deixar o Brasil mais igualmente justo, ou pelo menos criar condições de dar oportunidade a todos.
 Por isso, eu queria, primeiro, dar os parabéns a vocês. E que vocês continuem acreditando, continuem trabalhando e continuem cobrando do governo. Segundo, dizer para vocês que não poderia ser um dia melhor do que 2 de janeiro, para que a gente pudesse ter este encontro, aqui, com vocês. Este encontro, além de me obrigar a desejar feliz Ano Novo para todos vocês, em 2007, eu queria dizer que os números são… Eu, pelo menos, acho que a maioria das pessoas não tem dimensão dos números. Quando a gente fala em 416 mil quilômetros de cabos, quando a gente fala em 2 milhões de postes, quando a gente fala em 334 mil transformadores, eu não sei se algumas cidades grandes têm essa quantidade de transformadores. Possivelmente, se a gente for contar, os transformadores de Porto Alegre não chegam à metade disso, de São Paulo e de outros lugares. Porque essa é a tarefa e essa é a obrigação do Estado porque, como não é economicamente viável, nenhuma empresa terá o coração tão grande para levar tanto cabo, tanto poste, tanto transformador, se economicamente não tem retorno. Mas é obrigação do Estado e somente o Estado é capaz de fazer política desse tipo. Se for para iluminar a Esplanada dos Ministérios, pode ver que tem 80 empresas fazendo concorrência, mas peça para levar lá no Sertão, onde mora a dona Lucrecia, que não aparecerá uma empresa para a licitação de um processo porque economicamente não é rentável. O Estado não está pensando em renda, o Estado está pensando em cidadania. E isso nós vamos cumprir, custe o que custar.
Meus parabéns a todos vocês, meus parabéns aos nossos colaboradores do sistema Eletrobrás, e vamos continuar conversando com os governadores, vamos tentar fazer. Houve posse ontem para governadores, eu acho que há muito mais boa vontade no ar, e acho que nós temos muito mais facilidade para fazer esse Programa atingir a sua meta. Podem ficar certos que eu vou cobrar muito de vocês, eu cobro do Silas, cobro da Dilma, ela cobra do Silas, o Silas cobra de vocês, e assim a gente vai vendo o nosso povo mais feliz.
Parabéns gente.