1ª eleição angolana em 16 anos atrasa em Luanda
Atrasos e filas obrigaram o prolongamento até sábado da votação em 14% dos locais de votação de Luanda, capital de Angola. No interior do país, as primeiras eleições em 16 anos transcorreram normalmente nesta sexta-feira (5). Isaías Samakuva, o líder do p
Publicado 05/09/2008 22:31
Caetano de Sousa anunciou à noite que, de um total de 2254 locais de votação em Luanda, 320 vão voltar a abrir no sábado. Ele admitiu falhas na organização mas anunciaou que ''menos de 10%'' das mesas registraram problemas.
Nem toda a oposição seguiu a Unita
''Vou pedir a anulação da votação em Luanda e a sua repetição, porque foi uma brincadeira o que ocorreu hoje'', disse Samakuva. Mas a exigência da Unita (União Nacional para a Independência Total de Angola) não foi acompanhada por outros partidos oposicionistas. O presidente da também oposicionista FNLA (Frente Nacional de Libertação de Angola), Ngola Kabango, afirmou que ocorreram ''atropelos gravíssimos'' mas limitou-se a pedir à CNE ''uma solução que dignifique Angola''.
Samakuva, Kabango e Silva Cardoso, presidente do Padepa (Partido de Apoio Democrático e Progresso de Angola), reuniram-se com o presidente da CNE em Luanda para examinar as irregularidades e atrasos no processo eleitoral. Outro líder da Unita, Alcides Sakala, chegou a afirmar que o atraso era ''um escândalo'' e ''uma tendência deliberada de se encorajar a abstenção''. Ele admitiu porém que no interior havia normalidade. ''A situação que mais nos preocupa é a de Luanda, que tem o maior número de eleitores'', comentou.
Pesquisa deu maioria de 2/3 ao MPLA
O MPLA (Movimento Popular pela Libertação de Angola) é tido como o favorito nas eleições parlamentares desta sexta-feira. O partido do presidente José Eduardo dos Santos está no poder desde a vitória de guerrilha contra o colonialismo português, em 1975.
A lei eleitoral, das mais benevolentes para com os direitos das minorias (prevê, por exemplo, financiamento público das campanhas e horário gratuito de propaganda no rádio e TV com tempos iguais para todos os partidos), proibiu a divulgação de pesquisas no decorrer da campanha. No entanto, uma sondagem divulgada pelo site Portugal Digital previu que o MPLA obteria uma maioria de mais de dois terços dos votos no parlamento unicameral.
A pesquisa foi realizada em meados de agosto por um consórcio angolano-brasileiro. Foram ouvidas 4 mil pessoas, nas 18 províncias, 79 municípios e 111 comunas do país. Segundo a sondagem, o MPLA pode fazer mais de 150 deputados, de um total de 220, superando a marca de 147 deputados, que representa maioria qualificada.
A Unita, segundo a mesma fonte, deverá ficar em menos de 50 deputados. A FNLA e o PRS devem eleger igualmente deputados. Os restantes dez partidos concorrentes lutam com muitas dificuldades para obter representação parlamentar.
O fantasma da guerra civil
Em 1992, nas únicas eleições realizadas anteriormente em Angola, o MPLA fez 129 deputados contra 70 da Unita. A seguir situaram-se o PRS, com seis, a FNLA, com cinco, e o PLD, com três. Outros sete partidos fizeram um deputado cada um.
O então ditrigente da Unita, Jonas Savimbi, não aceitou o resultado e retornou à luta armada que iniciara logo depois da independência de 1975. A guerra civil só se concluiu em 2002, depois que Savimbi foi morto numa emboscada. Somando-se os 27 anos de guerra civil e os 14 da guerrilha anticolonial, Angola passou 41 anos em situação de guerra.
Os principais partidos que concorreram às eleições tê raízes neste período conturbado. O MPLA, fundado em 1961 por Agostinho Neto e de inspiração marxista, foi a força principal na guerrilha anticolonial. Depois da libertação, pediu auxílio de tropas voluntárias cubanas para fazer frente à guerra civil e à invasão sul-africana.
Já a Unita, fundada por Savimbi em 1966, apelou durante a guerra civil para uma aliança com o exército do regime racista sul-africano, que não reconheceu a independência de Abgola e invadiu o país vizinho em agosto de 1975, até ser detida pelas tropas angolano-cubanas na Batalha do Cunene.
Os 41 anos de guerra tiveram um custo em vidas humanas calculado em mais de 1 milhão – o país tem hoje 17 milhões de habitantes. Com a paz de 2002, porém, Angola entrou em franca recuperação, sendo considerada o que mais cresce no mundo.
O país que mais cresce no mundo
A previsão para 2008 é de um salto de 27,2% no PIB (Produto Interno Bruto), segundo o Fundo Monetário Internacional – o maior entre os 180 países acompanhados pelo FMI. Perto disso, os 23,4% de crescimento em 2007 passaram a parecer modestos. O motor principal da economia é o petróleo, turbinado pela alta dos preços mundiais, seguido pela extração de diamantes.
Essa prosperidade teve efeitos na luta eleitoral, reforçando a hegemonia do MPLA – apesar das críticas de trabalhadores e intelectuais avançados contra os avanços da corrupção no aparelho de Estado. Durante a campanha, importantes líderes da Unita passaram a apoiar o partido de José Eduardo dos Santos.
No mês final da campanha, que se encerrou na quarta-feira (3), perto de um milhar de militantes da Unita aderiram ao MPLA ou apelaram ao voto no partido no poder. Entre eles, contam-se dirigentes do partido de Savimbi, deputados, vice-ministros e administradores municipais e comunais.
No dia do encerramento da campanha, a economista Fátima Roque anunciou seu voto no MPLA. Ela chegara a integrar o Comité Político Permanente (direção suprema) da Unita e em 1992 chegou a ser apresentada como possível ministra da Economia de Angola caso a oposição vencesse.
Outra aquisição importante do MPLA ocorreu pouco antes: o deputado Jorge Valentim, um dos co-fundadores da Unita, muito influente na área do Lobito e Benguela.
Nestas condições, a situação política angolana está longe daquela do Zimbábue – outro regime ex-guerrilheiro, mas mergulhado em uma crise política aguda. Os atrasos e filas em Luanda permitiram à oposição ocupar o seu espaço na mídia ocidental, mas ninguém acreditam em uma recaída na guerra civil como ocorreu há 16 anos.
Da redação, com agências