Coronel Ustra é condenado por torturar ex-militantes do PCdoB

Uma decisão histórica foi tomada pela justiça paulista nesta quinta-feira (9): o coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra foi declarado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo responsável pela tortura de três pessoas da mesma família durante o re

Na sentença do Tribunal de Justiça de São Paulo, foi julgado procedente o pedido de declaração de responsabilidade de Ustra pela tortura do casal de ex-presos políticos Maria Amélia de Almeida Teles e César Augusto Teles.  O casal foi preso em 1972, por gerir uma gráfica do PCdoB. Também foi reconhecida a tortura a Criméia Schmidt de Almeida, irmã de Maria.



“Eu me sinto vitoriosa, Eu gostaria que a Justiça tivesse reconhecido também a tortura a mim e ao meu irmão, que éramos crianças na época. Mas o juiz disse que não há elementos para isso. A decisão faz com que a gente pense mais. De uma maneira mais séria dos crimes do passado. Ela traz à família satisfação e alívio”, diz Janaína Teles, que na época tinha cinco anos de idade. O irmão, Cesar Teles, é um ano mais novo.



A ação tem caráter exclusivamente declaratório, ou seja, pede somente o reconhecimento pela Justiça de que Ustra é responsável pelas torturas, na década de 70. O juiz Gustavo Santini baseou sua sentença na Declaração Universal dos Direitos Humanos, mas excluiu os filhos do casal Teles, Janaína e Edson, do processo, que eram crianças à época e também foram detidos.


 


Vitória moral e política



A decisão é em primeira instância e cabe recurso, mas desde já passa a ser um precedente jurídico importante para as famílias, entidades e cidadãos brasileiros que buscam reparação pelos crimes cometidos pela ditadura. É também uma vitória política e moral para os ativistas dos movimentos que lutam pelos direitos dos que foram perseguidos e torturados durante o regime militar.



Ainda em 2006, quando um dos processos começou a ser julgado, Amélia Teles já afirmava que a família não buscava indenização do Estado ou prisão. “É uma ação de efeito político, que vai trazer reconhecimento de que um coronel do Exército, na época major, era torturador”, explicou Amélia na ocasião.



Apesar de não sugerir indenização, a sentença deterina que Ustra deve arcar “com custas, despesas processuais e honorários dos advogados dos autores, fixados estes em dez mil reais.”



Para o juiz, “existe relação jurídica de responsabilidade civil” entre as vítimas e o réu “nascida da prática de ato ilícito, gerador de danos morais”.



Outras ações contra Ustra


 
Em 23 de setembro, o TJ-SP extinguiu o processo que tramitava em segunda instância contra Ustra. Por dois votos a um, a 1ª Câmara de Direito Privado da Corte aceitou o recurso dos advogados de Ustra contra ação que buscava responsabilizar o oficial por torturas e pela morte do jornalista Luiz Eduardo Merlino, em 19 de julho de 1971.


 


A ação havia sido movida pela família de Luiz Eduardo Merlino, que integrava o Partido Operário Comunista (POC) e tinha 23 anos quando foi preso. A professora aposentada Angela Mendes de Almeida, que era companheira do jornalista, e a irmã dele, Regina Merlino Dias de Almeida, são as autoras do processo na 42ª Vara Cível. Elas não pediam indenização em dinheiro.


 


A ação também tinha caráter exclusivamente declaratório. Com a extinção, os familiares do jornalista podem recorrer ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).


 


Ustra ainda é réu em outra ação declaratória no Fórum Cível da capital paulista, com o objetivo de levar a Justiça a reconhecer a responsabilidade do coronel. Além disso, ele sofre um terceiro processo na Justiça Federal, que apura seu suposto envolvimento em seqüestros e espancamento de militantes de organizações clandestinas.


 


Histórico de terror


 


Ustra foi o chefe do DOI-Codi, o órgão de repressão política durante o regime militar, de 29 de setembro de 1970 e 23 de janeiro de 1974. Pesa contra ele a suspeita de ter torturado mais de 500 militantes de esquerda durante a ditadura militar. Muitas destas pessoas estão desaparecidas até hoje.



Em 2006, quando ocorreu a primeira sessão pública do julgamento do caso Teles, Amélia Teles fez um relato comovente da tortura comandada por Ustra nos porões do regime. “Ele foi o primeiro a me dar um tapa na cara, quando ainda estava no Pátio da Operação Bandeirantes [Oban]. Me jogou no chão com aquele tapa. Me torturou pessoalmente. Também foi ele quem mandou invadir a minha casa, buscar todo mundo que estava lá. Meus filhos e minha irmã. Durante cerca de 10 dias, minhas crianças ficaram na Oban. Me viram sendo torturada na cadeira de dragão, me viram cheia de hematomas, com o rosto desfigurado, dentro da cela. Nessa semana, em que meus filhos estavam por ali, eles falavam que os dois estavam sendo torturados. Disseram: 'Nessas alturas, sua Janaína já está dentro de um caixãozinho'. Disseram também que eu ia ser morta. Isso foi o tempo todo. O tempo todo, o terror. Ali era um inferno”, descreveu Maria Amélia Teles, que ficou onze meses presa no DOI-Codi.



Maria Amélia foi presa na Vila Mariana, na capital paulista, no dia 28 de dezembro de 1972. Seu marido, César Teles, já estava detido. Os dois coordenavam a gráfica do Partido Comunista do Brasil, ao qual pertenciam. Também davam suporte aos guerrilheiros do Araguaia, e por isso foram presos. No dia seguinte, a polícia invadiu a casa de César e Maria Amélia e deteve sua irmã, Criméia Almeida, e seus filhos, Janaína e Edson, na época com 5 e 4 anos de idade. Das dependências do DOI-Codi, todos foram torturados física e psicologicamente.



Da redação,
com agências