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Granma: EUA têm oportunidade de mudar política para Cuba

O artigo ''O futuro da OEA se parece com o passado'' – publicado, ontem, no diario oficial cubano, Granma, defende que a Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), iniciada hoje, em Honduras, é uma oportunidade para que o Governo do

''Não se trata de analisar se Cuba deve ou não entrar na OEA, mas de reparar uma injustiça histórica'', diz o artigo. ''É hora de passar das palavras aos fatos e deixar de lado a retórica anticubana. Não existem razões para que os Estados Unidos mantenham o bloqueio e não restabeleçam suas relações com a ilha'', acrescenta o Granma.

O texto faz um resgate histórico da interferência norte-americana na OEA e lembra que o presidente cubano,  Raúl Castro, e seu irmão e antecessor, o líder Fidel Castro, reiteraram nos últimos meses que o Governo de Havana jamais voltará ao organismo, que suspendeu Cuba em 1962. Fidel Castro escreveu em uma recente coluna que respeita os Governos dos países amigos que solicitaram o retorno de Cuba à OEA, mas declarou que a ilha não deseja fazê-lo.

''Talvez amanhã (hoje), na 39ª Assembleia Geral em Honduras, seja eliminada a resolução de 1962 como um ato de reivindicação aos povos latino-americanos e caribenhos. No entanto, existem pressões para boicotar essa iniciativa'', diz o artigo.

''Aconteça o que acontecer nesta Assembleia de San Pedro Sula (Honduras), Cuba mantém sua decisão e se sustenta na história'', conclui o texto.

Leia abaixo a íntegra:



O futuro da OEA se parece com o passado


Por Abel Santamaría González*, no Granma

No dia 2, começará o 39º Período Ordinário de Sessões da Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), em San Pedro Sula, Honduras. Seu secretário geral, Miguel Insulza, assinalou, no dia 17 de abril, durante a V Cúpula das Américas, que este será ''o âmbito onde se deve discutir a anulação da decisão tomada em 1962 de suspender a participação de Cuba na instituição (…). É uma resolução obsoleta (…), a OEA deveria eliminar essa resolução, que é um resíduo da Guerra Fria (…)''.

Também em Porto Espanha, o presidente estadunidense realizou um chamado aos países do continente para esquecermos o passado e confiarmos nos Estados Unidos. Obama afirmou: ''Não podemos permitir que sejamos prisioneiros de desacordos do passado (…) Hoje, não vim discutir sobre o passado, mas pensar sobre o futuro(…), como vizinhos temos responsabilidade de confiarmos uns nos outros''.

Posteriormente, a secretária de Estado, Hillary Clinton, declarou, durante a 29ª conferência em Washington do Conselho das Américas, em 13 de maio, que: ''Como o presidente Obama deixou bem claro, aguardamos o dia em que todos os países das Américas, inclusive Cuba, possam participar de nossas alianças hemisféricas de maneira compatível com os princípios da Carta Democrática Interamericana''.

Seria possível para os povos latino-americanos e caribenhos esquecer mais de 200 anos de agressões de seu vizinho do Norte? O que mudou no sistema político dos Estados Unidos para que se possa confiar na sua ''nova'' vontade, em seu ''Sistema Interamericano'' e em suas alianças hemisféricas? Por que Cuba não está interessada em ingressar na OEA?

Uma história imperial de crimes e cumplicidade

O ''sistema interamericano'' e as ''alianças hemisféricas'' se sustentam nas concepções estratégicas e doutrinais de dominação desenhadas pelos Estados Unidos desde os primeiros anos da nação. Suas origens remontam a 1788, quando um de seus ''pais fundadores'', Alexander Hamilton, se referiu à ''criação de um Grã Sistema Americano, superior a todas as forças'', que inspirou a formulação da Doutrina Monroe (1823), sob a frase a ''América para os americanos'', e a doutrina do ''Destino Manifesto'' (1845), que diz que ''graças à providência, os estadunidenses foram designados a estender suas hegemonia sobre todo o continente para desenvolver o grande experimento de liberdade e auto-governo''.

Porém, é até finais da primeira metade do século XX, no contexto da Segunda Guerra Mundial, que os Estados Unidos conseguem estruturar seu citado ''sistema interamericano'', com a fundação, em 1942, da Junta Interamericana de Defesa, a subscrição dem 1947 do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR) e com a criação, em 1948, da OEA.

Este sistema constitui toda uma rede de instrumentos políticos, econômicos, jurídicos, ideológicos e militares de caráter hegemônico-continental que se aplicariam durante a Guerra Fria, com base na ''contenção do comunismo'' e caracterizada por uma postura militarista global, que priorizaria a criação de um ''sistema de alianças'' militares em todo o mundo.

Após quatro décadas, com a queda do campo socialista no início dos anos noventa e ao desaparecer o pretexto do comunismo, os formuladores da política estadunidense desenharam as ''novas ameaças'' a sua segurança nacional, como fórmula de dominação para a região.

Uma vez criadas as condições hemisféricas e  como parte do seu projeto hegemônico para o Terceiro Milênio, o presidente Bush, durante a III Cúpula das Américas, em Quebec, no Canadá (abril 2001), e na 31ª Assembléia Geral da OEA, em San José, Costa Rica (junho 2001), solicitou que se preparasse uma Carta Democrática Inter-americana, adotada pela OEA em 11 de setembro do mesmo ano.

A apresentaram em uma reunião extraordinária, em Lima, Peru, como ''o início de uma nova era do Sistema Interamericano'' baseada na defesa da sua fórmula de ''democracia representativa''. A República Bolivariana da Venezuela tentou, sem êxito, adicionar ao documento o conceito de ''democracia participativa''. É óbvio que tudo estava preparado, mas os Estados Unidos precisavam de uma boa desculpa para voltar a oxigenar seu desgastado instrumento e estabelecer outro cínico documento.

Posteriormente, em sua 32ª Assembléia Geral, em Bridgetown, Barbados, em 2002, e na Conferência Especial sobre Segurança (México, 2003), a OEA incorporou uma nova e perigosa fórmula de intervencionismo  na região, ''reconhecendo que as ameaças, preocupações e outros desafios à segurança no Hemisfério são de natureza diversa e alcance multidimensional e que o conceito e o enfoque tradicionais devem ser ampliados para abranger ameaças novas e não tradicionais, que incluem aspectos políticos, econômicos, sociais, ambientais e de saúde.''

Se adotou a Declaração sobre Segurança nas Américas, que legitimou a Carta Democrática Inter-americana e, em essência, deliberou que qualquer assunto pode ser interpretada pela OEA como um risco para a ''segurança hemisférica'' e, portanto, requer uma resposta militar, que seria ''democrática''.

No entanto, nenhum documento condena o comportamento unilateral dos Estados Unidos, que ameaçava com o uso preventivo da força e seu desrespeito pelos princípios do direito internacional, como evidenciado neste período nas invasões ao Afeganistão (2001) e ao Iraque (2003 ). O mesmo foi feito com o Haiti (2004), embora a sua Carta Democrática defina que ''qualquer governo democraticamente eleito pode ser retirado do poder.''

Não se pode pecar pela ingenuidade. A região tinha experimentado, na segunda metade do século XX, agressões armadas ''democráticas'' similares dos Estados Unidos, na Guatemala (1954), República Dominicana (1965), Granada (1983), Panamá (1989) e Haiti (1994).

No entanto, a OEA nunca exigiu que a superpotência respeitasse e cumprisse os princípios fundadores da sua Carta, baseados na auto-determinação, no respeito da soberania e da não ingerência nos assuntos internos e externos dos seus estados-membros.

Também é cúmplice dos mais de um milhão de latino-americanos e caribenhos mortos ou desaparecidos por causa da repressão das ditaduras militares, representantes dos interesses oligárquico-imperialistas.

Complô anticubano

Em Agosto de 1959, os Estados Unidos, durante a Reunião de Consulta dos Ministros de Relações Exteriores, em Santiago do Chile, tentou atacar Cuba, sob o pretexto de abordar a situação que existia no Caribe.

Um ano mais tarde, em Agosto de 1960, em uma reunião semelhante em San José, Costa Rica, o secretário de Estado norte-americano, Christian Herter, atacou Cuba, ''por aceitar a ajuda que lhe é oferecido pela URSS.''

Paralelamente, o presidente Dwight Eisenhower (1953-1961), através da Agência Central de Inteligência (CIA), organizava uma invasão ao território de Cuba para estabelecer um governo provisório, que soliciatria ''oficialmente'' ajuda dos Estados Unidos e da OEA. Em 19 de outubro de 1960, anunciou formalmente ''o embargo parcial'' das exportações estadunidenses para Cuba, e, em 3 de janeiro e 1961, rompeu relações diplomáticas e consulares com o nosso país.

Tudo estava pronto para nos agredir. O presidente John F. Kennedy (1961-1963) aprovou a invasão mercenária pela Baía dos Porcos, em 17 de abril de 1961, e, em apenas 72 horas, obteve a sua primeira grande derrota na América.

Os Estados Unidos desencadearam depois uma feroz ofensiva no campo diplomático para isolar Cuba. Durante a VIII Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores, em Punta del Este, no Uruguai, em Janeiro de 1962, pressionou os estados membros da OEA para aplicarem sanções contra o nosso país.

Finalmente, aprovaram a resolução VI, intitulada Exclusão do atual Governo de Cuba de sua participação no sistema interamericano, que definia que ''a adesão de qualquer membro da Organização dos Estados Americanos ao marxismo-leninismo é incompatível com o Sistema Inter-americano e o alinhamento desses governos com o bloco comunista romperia a unidade e solidariedade do hemisfério. ''

Fracassos do Isolamento

Passaram-se 47 anos de exclusão de Cuba do ''sistema inter-americano.'' Para o nosso país, a possibilidade de reingressar na OEA seria apagar uma história imperial de crimes, tendo em conta que esta organização foi cúmplice do bloqueio genocida, da tentativa de isolamento e de atos terroristas do governo dos Estados Unidos contra a ilha, que provocaram um saldo de 3 478 mortos e 2 099 incapacitados.

O cenário atual é bastante diferente. O capitão e os seus instrumentos foram deixados sozinhos. Cuba rompeu o isolamento imposto pela OEA e seu mentor. Tem relações diplomáticas com 186 Estados. Preside, desde 2006, o Movimento de Países Não-Alinhados. É membro de 83 mecanismos e organizações internacionais.

Mais de 500 delegações de alto nível nos visitam anualmente. Houve universal rejeição do bloqueio norte-americano, com 185 votos nas Nações Unidas para a sua eliminação. Recentemente foi reeleita para um segundo mandato como membro do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.

Talvez amanhã (hoje, terça-feira, 02), na 39ª Assembléia Geral, em Honduras, seja eliminada a VI resolução de 1962, como um ato de reivindicação dos povos da América Latina e Caribe. No entanto, existem pressões para boicotar esta iniciativa.

O senador estadunidense Robert Menendez, representante da máfia de Miami e que preside a subcomissão de assuntos externos, encarregada da supervisão de assistência internacional, ameaçou publicamente a OEA, em 20 de maio, com a possibilidade de apresentar um projeto ao Congresso para cortar o orçamento do organismo, se for revogada a resolução que suspendeu Cuba em 1962.

Deve-se ter em conta que a sede permanente está localizado em Washington, a poucos quarteirões de distância da Casa Branca, e que os Estados Unidos contribui com cerca de 60% (US$47 milhões) para manter seu oneroso aparato burocrático.

Esta é a segunda oportunidade que tem a nova administração estadunidense de retificar sua política para a região e, em especial, para o nosso país. Não se trata de analisar se Cuba deve ou não ingressar na OEA, mas de reparar uma injustiça histórica. É tempo de passar das palavras aos factos e pôr de lado a retórica anti-cubana. Não há razão para que os Estados Unidos mantenha o bloqueio e não restabeleça suas relações com a ilha.

Recentemente, os líderes da Revolução Cubana, apoiado pelo seu povo, através dos suas reflexões e discursos, em Cumaná e Sauípe, ratificaram que ''jamais ingressaremos na OEA e respeitamos os critérios dos governos dos países dos países irmãos da América Latina e Caribe que pensem de outra forma, mas não desejamos ser parte dessa instituição. ''

Aconteça o que acontecer nesta Assembleia, em San Pedro Sula, Cuba mantém firme a sua decisão e se sustenta na história.

* Abel Santamaría González possui uma licenciatura em Direito e maestrante o Instituto Superior de Relaciones Internacionales Raul Roa García.