Stiglitz: “Brasil deve manter medidas de estímulo”
Joseph Stiglitz: professor da Universidade Columbia e Prêmio Nobel de Economia; ao contrário do que pede o FMI, Brasil ainda não deveria acabar com seus pacotes de ajuda, diz analista
Por Patrícia Campos Mello, no jornal O Estado de S. Paulo
Publicado 06/10/2009 13:35
O risco de a economia mundial ter uma recaída e voltar a mergulhar numa recessão é “muito grande”, e por isso o Brasil ainda não deveria acabar com seus pacotes de estímulo. Essa é a opinião de Joseph Stiglitz, professor da Universidade Columbia e vencedor do Prêmio Nobel de Economia.
Muitos analistas acham que a economia brasileira corre risco de superaquecer e projetam grande alta de juros em 2010. O Fundo Monetário Internacional (FMI) diz que o Brasil é um dos países que deveriam rever seus estímulos econômicos, porque sua economia já está se recuperando e há risco de atrair excesso de dólares.
Mas, para Stiglitz, crítico contumaz do Fundo, o conselho do FMI pode ser precipitado. Stiglitz diz também que ainda não há uma alternativa confiável para a acumulação de reservas nos emergentes como forma de proteção contra crises, divergindo de outra recomendação do Fundo. Abaixo, trechos da entrevista que Stiglitz concedeu ao Estado.
O FMI diz que o Brasil é um dos países que deveria rever seus estímulos econômicos, porque sua economia já está se recuperando e há risco de atrair um excesso de dólares. O senhor acha que está na hora de o Brasil acabar com estímulos fiscais ou monetários?
É difícil para qualquer país ter certeza sobre uma estratégia de saída porque é difícil ter qualquer certeza sobre a economia global. Portanto, é apropriado pensar em estratégias de saída para os pacotes de estímulo, mas não implementar nada ainda.
Há risco de recessão em dábliu (duplo mergulho – depois de breve recuperação, a economia voltaria a mergulhar na recessão)?
Sim, o risco de uma recessão “duplo mergulho” é muito grande. É mais arriscado tirar os estímulos agora, que pode ser prematuro, do que mantê-los até que se tenha mais certeza sobre a recuperação do mundo. O Brasil é menos dependente de exportação que outros países e muitos ficaram surpresos quando o País foi afetado pela crise. Agora o País está em recuperação. Mas não há argumento para se retirarem os estímulos o Brasil neste momento.
O FMI quer atuar como “banco central mundial” e recomenda a emergentes como o Brasil que aumentem seus déficits em conta-corrente e reduzam a acumulação de reservas. Seria a maneira de os emergentes colaborarem com o ajuste dos desequilíbrios globais, já que as reservas estão na origem desses desequilíbrios. O que o sr. acha disso?
É preciso reconhecer que os países que estão acumulando reservas não estão consumindo. E há um grande problema na economia mundial hoje, que é recuperar a demanda agregada, já que os EUA estão deixando de ser o consumidor de última instância. Mas a questão é: qual é a melhor forma de reativar a demanda mundial? Não está claro se a melhor maneira de fazer isso é aumentando o consumo, em vez de elevando o investimento. Essa foi a estratégia que deixou os EUA em apuros, então tenho dúvidas de que seja a estratégia certa.
Grande parte dos emergentes foram menos afetados que os países ricos pela recessão, e eles argumentam que um dos motivos foi precisamente o alto nível de reservas.
Exatamente. Se nós tivessemos mecanismos alternativos de proteção ou se criássemos uma economia global mais estável, poderíamos pensar em reduzir reservas. Mas o movimento de desregulamentação dos anos 80 criou um mundo mais instável, que tornou necessária uma maior acumulação de reservas. As reservas são o sintoma, não a causa.