Abgail: PCdoB quer ajudar RS a se colocar de frente para o Brasil
A coligação Unidade Popular pelo Rio Grande (PT, PSB, PCdoB, PR) foi a única no Estado a optar por preencher as duas vagas em disputa ao Senado Federal. Com o senador Paulo Paim (PT) definido –nome natural para a disputa, já que busca a reeleição –, a aliança chamou a sindicalista de Caxias do Sul, Abgail Pereira (PCdoB) para a outra vaga. A líder feminista havia participado apenas de eleições municipais – foi candidata a vereadora em 2004 e a vice-prefeita de Caxias do Sul em 2008.
Publicado 19/07/2010 13:48

Nesta entrevista ao Jornal do Comércio, Abgail apresenta suas propostas para o Senado. Ela defende que o parlamentar faça uma representação atuante de sua unidade federativa. Como exemplo, diz que pretende buscar mais recursos para o Rio Grande do Sul através de emendas parlamentares, especialmente na área do desenvolvimento e da infraestrutura, que considera deficitária no estado.
A comunista também afirma que lutará pela moralização da Casa, que está desgastada. "Com raras exceções, é uma galeria de anciãos em fim de carreira com todos os privilégios, e que não cumprem sua função", avalia. E levanta a bandeira do feminismo, área em que iniciou sua vida pública. Identificada com a causa, prega a igualdade de condições entre homens e mulheres no mercado de trabalho.
Jornal do Comércio: Como foi o convite para a senhora concorrer ao Senado?
Abgail Pereira: O PCdoB vem crescendo nos últimos anos e tem chamado para si a responsabilidade de ajudar o nosso Estado a se colocar de frente para o Brasil. Na nossa coligação, o PT ficou com a cabeça de chapa (Tarso Genro) e a primeira vaga ao Senado, e o PSB com o candidato a vice (Beto Grill). Naturalmente, o outro espaço é do PCdoB. Então passamos a discutir essa vaga. Tínhamos uma lista de nomes, como Juliano Rosso, que foi vereador em Passo Fundo, e Sandra Padilha, vice-prefeita de Santa Rosa. Mesmo assim, a direção do partido, unanimemente, apontou para o meu nome. Primeiro por conta de minha trajetória. E também porque queríamos uma mulher na chapa majoritária, que já tinha três homens. Tinha que ser uma mulher com história, um discurso firme, e chegaram ao meu nome.
JC: O Senado passa por uma crise desde o ano passado. A instituição está com uma imagem negativa na sociedade. Qual a sua avaliação?
AP: Tenho uma visão igual a uma parcela muito grande da população. A nossa Câmara Alta precisa de uma renovação. E não se trata apenas de uma renovação de nomes. O Senado precisa renovar os seus propósitos. Não pode ser uma galeria de notáveis, de ilustres, de anciãos em fim de carreira, com todos os privilégios e que não cumprem com a sua função de representar a unidade federativa. Ficam só nos privilégios, com raras exceções. O senador Paim é uma rara exceção. É preciso revalorizar esse espaço privilegiado.
JC: Como?
AP: Nossa proposta é efetivamente representar a unidade federativa e ter as emendas coletivas que contribuam na infraestrutura e no desenvolvimento do Estado. A principal tarefa do Senado é respeitar e representar a unidade federativa e contribuir para o seu desenvolvimento.
JC: Como a senhora pretende contribuir para o Estado?
AP: A perspectiva é desenvolver o estado junto com Tarso Genro. Temos que pensar onde vamos desenvolver a nossa produção, por onde escoá-la. Como estão as nossas estradas? Como estão os aeroportos de pessoas e de cargas? Precisamos de infraestrutura urgentemente. Isso o Executivo vai fazer, mas o Senado tem o papel fundamental de contribuir para trazer recursos e aprovar projetos. Hoje, no nosso estado, as notícias boas são através do governo federal, como o porto de Rio Grande. Com o que o governo do estado contribuiu? Nem reivindicou, nem encaminhou projetos. O estado precisa disso.
JC – A infraestrutura é o ponto crucial?
AP: Com certeza. Precisamos desenvolver a infraestrutura do Estado. Especialmente estradas e aeroportos. Precisamos ampliar o aeroporto Salgado Filho e construir aeroportos regionais, de pessoas e de cargas.
JC: Que outros itens destacaria?
AP: Tem a questão tecnológica e educacional. O Cefet (Centro Federal de Educação Tecnológica) precisa se desenvolver. Se aliarmos as escolas técnicas à tecnologia, à infraestrutura, poderemos ter um mandato vitorioso. O Senado precisa ter uma força ativa na modulagem das políticas sociais. Tem grandes projetos lá que podem contribuir. E podemos desenvolver emendas na questão das mulheres. O PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) 2 vai trazer projetos como um número grande de creches em todo o Brasil. A partir disso, podemos desenvolver políticas sociais. O setor das trabalhadoras rurais é um exemplo de olhar determinado. Queremos ter números de grãos, mas além das sacas, precisamos ver as pessoas. Nosso olhar vai ser também para a questão social.
JC: Qual é a sua plataforma nesta campanha que a diferencia das outras candidaturas?
AP: O meu olhar é para contribuir com a humanização. A exemplo do senador Paim, que tem um olhar para os negros, aposentados, jovens, também terei esse olhar. E mais ainda para as mulheres. Somos 52% da população, estamos no mercado de trabalho, mas há desigualdade das mulheres em espaço de poder, de oportunidades, e de políticas sociais. Há mulheres que morrem por agressão, como a amante do goleiro Bruno… Se queremos humanizar a sociedade, é preciso olhar para isso.
JC: A sua candidatura é uma novidade em relação a outros nomes que já eram conhecidos…
AP: Posso ser o novo na candidatura ao Senado, mas não sou nova na política. Faço política desde os 13 anos, no movimento da juventude, de mulheres, dos trabalhadores. Tenho uma história. As candidaturas postas são todas legítimas, são nomes fortes, porque têm uma aparição pública maior que a minha.
JC: Outras coligações optaram por não preencher as duas vagas ao Senado e concentraram a campanha em um nome. A Unidade Popular pelo Rio Grande optou por lançar dois candidatos. Qual a sua avaliação?
AP: São estratégias diferentes. A candidatura da Ana Amélia (Lemos, PP) usará todo o tempo de TV, (Germano) Rigotto (PMDB) também. Mas é importante lembrar que são duas vagas para o Senado neste ano. Os partidos da nossa coligação avaliaram que devemos concorrer com dois nomes. Isso potencializa mais as candidaturas. No nosso caso, temos um negro e uma mulher, os dois oriundos do movimento social e popular, com história, trajetória. Claro, a batalha não vai ser fácil. Ana Amélia estava dentro das nossas casas todos os dias pela televisão, Rigotto foi governador. Então, tenho dificuldade em ser um nome tão conhecido. Mas sei o papel da minha candidatura e me sinto honrada de estar cumprindo.
JC: Essa conjuntura de candidaturas únicas nas alianças adversárias pode beneficiá-la?
AP: Esse não é um raciocínio errado. Sou da região da Serra e Rigotto também. Somos conhecidos e não temos desgaste, me dou bem com ele, nos respeitamos. Não vejo problema em o eleitorado dele fazer dobradinha comigo. Aliás, tive declaração de voto de vereadores do PMDB de Caxias, disseram que é uma boa dobradinha. Se olharmos a questão da mulher, pode ser que digam que querem votar em duas mulheres. "Vou votar na Abgail e na Ana Amélia." A política é muito dinâmica. Não afirmo que esse é um caminho linear. Mas não é uma análise a ser descartada.
JC: A senhora falou em representação da unidade federativa no Senado. E qual será o seu posicionamento em relação ao governo federal?
AP: Os Poderes são distintos e têm autonomia. Como parlamentar, temos independência. E nisso temos uma boa experiência no movimento sindical. Apoiamos o governo Lula (PT) e não deixamos de fazer pressão a ele, pelas nossas reivindicações. Está aí a luta pelo fim do fator previdenciário, pelo aumento do salário dos aposentados.
JC: Ou seja, se for eleita senadora e Dilma Rousseff (PT) presidente, a senhora não vai necessariamente apoiar todos os projetos do governo?
AP: Devemos manter essa autonomia. Vamos continuar batendo na necessidade do fim do fator previdenciário, dos nossos aposentados terem qualidade de vida, de termos políticas públicas para as mulheres e votar definitivamente a igualdade de oportunidades, de ratificar a convenção 156 da OIT (documento da Organização Internacional do Trabalho com recomendações para garantir a igualdade de oportunidades no trabalho aos homens e às mulheres). Vamos continuar com as nossas bandeiras de luta.
JC: Muito se fala que a principal tarefa do Congresso Nacional no ano que vem será fazer as reformas política e tributária. Qual sua posição?
AP: Queremos essas reformas. O PCdoB tem uma posição muito crítica em relação a isso: todo mundo é a favor das reformas, mas ninguém toma a iniciativa concreta. Cada vez mais se coloca na ordem do dia a necessidade de reforma política.
JC: Qual seria o principal ponto da reforma política?
AP: A primeira questão é o financiamento público de campanha. Queremos voto em lista fechada pelos partidos. E nessas listas, queremos um homem, uma mulher (alternadamente). E defendemos também a fidelidade partidária.
JC: E como a senhora vê a possibilidade de um partido poder apoiar uma candidatura em nível estadual e outra, de uma legenda diferente, no plano federal?
AP: Somos pelo pluripartidarismo, em que os partidos tenham o seu espaço, é a questão que eu mais admiro no nosso País. Estamos construindo essa democracia num povo uno, com essa diversidade de cultura. E os partidos fazem parte dela. Agora, existe alinhamento programático e alinhamento que não é ideológico. Isso é ruim para a democracia. A verticalização fortalece os partidos. E precisamos fortalecê-los.
JC: E na reforma tributária, quais são suas propostas?
AP: Precisamos que a Lei Kandir seja revista. Não dá para ficar contribuindo só para exportação. Ainda mais se trabalharmos só com commodities. Precisamos agregar valor para que não se exporte só matéria-prima e depois se importe o produto final. Temos condições de elaborar os produtos, de alavancar essa produção. Essa é a nossa proposta na reforma tributária. Além da questão dos trabalhadores.
JC: Qual questão dos trabalhadores?
AP: A reforma tributária também se deve contemplar os trabalhadores, que pagam tributos. Imposto de Renda? Salário não pode ser considerado renda. Então, isso entra da reforma tributária. E em relação aos estados, a recuperação do ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) que foi arrecadado. É preciso algo mais equânime. Temos grandes perspectivas de fazer esse debate com a comunidade. O Senado tem condição de contribuir, mas precisamos de uma reorientação para que ele cumpra, de fato, com o seu papel de auxiliar para o desenvolvimento.
Fonte: Jornal do Comércio (RS)