Futebol: Dança dos técnicos é parte da cultura da desorganização
Faz parte da cultura dos dirigentes do futebol brasileiro demitir o técnico do clube quando o time não apresenta em campos resultados que a direção esperava obter, em um curto espaço de tempo. Essa é uma das equações mais óbvias do futebol brasileiro: Derrotas mais queda de posições na tabela igual a demissão do técnico.
Por Humberto Alencar
Publicado 10/08/2010 18:21
O Campeonato Brasileiro teve início em maio deste ano e foi interrompido pela Copa do Mundo da África do Sul por aproximadamente um mês. Reiniciado, alguns times obtiveram maus resultados e suas diretorias começaram a reproduzir a chamada "dança dos técnicos", demitindo aqueles que obtiveram resultados aquém dos esperados.
No último fim de semana, o Grêmio Porto Alegrense demitiu Paulo Silas do comando de seu time de futebol. O Ceará também resolveu encerrar o contrato com Estevam Soares. O time gaúcho vem mal no campeonato e aparece no setor proibido da tabela, aquele que destina a Série B, ou segunda divisão, àqueles quatro times que terminarem o campeonato nas últimas colocações. Ou seja, prejuízo financeiro à vista.
Os cearenses partiram para o descanso mensal da Copa liderando o campeonato junto com o Corinthians, com 17 pontos ganhos. Donos da melhor defesa até então, com 1 gol tomado, o surpreendente time do Ceará era comandado por PC Gusmão, que no interregno da Copa foi comandar a equipe do Vasco da Gama. Para seu lugar, o "vovô" contratou Estevam Soares.
Acabada a Copa e decorridas 6 rodadas desde então, o Ceará obteve apenas mais três pontos ganhos, frutos de empates com Corinthians, Palmeiras e Atlético Goianiense, amargando a queda para a quarta colocação na tabela do torneio além de um infrutífero ataque, que com seis tentos não supera o ataque do último colocado do torneio, o Atlético Goianiense.
Segundo a mídia alencarina, a campanha do Ceará devia-se à administração do clube, que tem os "pés no chão" desde as contrações, "gestão econômica e democrática", até o marketing". No entanto, a diretoria falhou ao trazer um técnico questionável para o lugar do bom PC Gusmão.
De última hora, a diretoria escolheu Mário Sérgio para técnico do clube e o Ceará, com ele, lutará para não cair e, quem sabe, obter uma vaga na Copa Sul-Americana, uma espécie de torneio de consolação para aqueles que não obtêm vaga para a Copa Libertadores da América.
Situação parecida vive o Mosqueteiro gaúcho. O Grêmio anunciou Renato Gaúcho para o lugar de Paulo Silas, demitido depois de uma série ruim de resultados que deixou o clube na zona de rebaixamento. Silas obtivera destaque no ano passado, quando fez boa campanha pelo catarinense Avaí. Este ano, como técnico do Grêmio, foi campeão gaúcho e seu time exibia um futebol razoável, até ser praticamente dizimado por contusões em seu elenco.
Para piorar ainda mais a situação de Silas, o Inter, arquirrival do Grêmio, enfunou as velas na Libertadores e partiu em velocidade para disputar a competição continental e o Mundial de clubes. Nada pior para as hostes tricolores que ver o Colorado despachar o São Paulo e rumar "descontrolado" rumo a Dubai, onde será disputada a sétima edição do Mundial de Clubes da Fifa. Sobrou para Silas.
Outro afetado pelo desempenho do Internacional foi o técnico Ricardo Gomes, que treinava o São Paulo até o dia 5 de agosto, quando seu time venceu o Colorado no Morumbi por 2 a 1 mas foi desclassificado pelos critérios de classificação da Libertadores, que favorece o clube que marcar mais gols como visitante nas disputas eliminatórias antecedentes à final.
O São Paulo, decantado pela mídia como a equipe mais organizada e planejada do Brasil, arranhou essa imagem ao demitir Muricy Ramalho do cargo há pouco mais de um ano, após o time ser eliminado pelo Cruzeiro da Libertadores de 2009. Muricy era tricampeão brasileiro pelo clube, um título não só inédito no clube como também no campeonato.
Segundo os meios de comunicação especializados, a equipe caiu de produção por excesso de vedetismo de algumas de suas estrelas, que não aceitavam jogar fora de posição e que tiveram influência decisiva para a diretoria demitir o treinador, que hoje comanda o Fluminense. Por coincidência, Muricy treina atualmente o clube que lidera o campeonato, demonstrando competência inquestionável.
Ao anunciar no ano passado a substituição de Muricy por Ricardo Gomes, o São Paulo pretendia mostrar arrojo, já que o técnico, ex-jogador tetracampeão do Mundo em 1994 nos Estados Unidos, tinha no seu currículo a bagagem da escola europeia de treinadores, algo que aparentemente é invejado no Morumbi.
Gomes dirigiu equipes francesas desde 2005, sem grande sucesso. No Brasil, também não teve muito êxito nos clubes que comandou. Sua experiência anterior à do São Paulo foi treinar o Flamengo, em 2004, ano em que também comandou o Fluminense.
"Ele foi atleta premiado, de Seleção Brasileira, técnico do PSG, Bordeaux, Monaco, está sendo pretendido pelo Benfica, tem postura e acreditamos mesmo que ele possa seguir este trabalho vitorioso iniciado pelo Muricy", elogiou na época o presidente do clube, Juvenal Juvêncio, após anunciar o acerto.
O período que o técnico permaneceu no clube foi marcado por nenhum título conquistado. Ricardo Gomes foi substituído por Sergio Baresi, treinador das equipes de base do clube e que deverá ocupar o cargo como treinador tampão até a diretoria encontrar um novo substituto para o cargo. A falta de planejamento na questão ficou evidente e o arranhão na imagem foi maior ainda.
Por outro lado, o até então “desorganizado” Corinthians, time que viveu um rebaixamento para a segunda divisão, como seu rival Palmeiras, demonstrou que vive outros dias sob a presidência de Andrés Sanchéz. O técnico Mano Menezes permaneceu no clube por quase três anos, tendo perdido um Paulista e uma Copa do Brasil em 2008, conquistado esses campeonatos em 2009 e perdido uma Libertadores em 2010, ano em que se inicia a comemoração do centenário do clube. Em outras eras, perder a Libertadores teria sido a senha para dar o bilhete azul ao treinador.
A saída de Mano deveu-se apenas à sua decisão de aceitar o comando da Seleção Brasileira de Futebol. Sua substituição foi acertada sem alardes nem a espera de fumaça branca exalando de chaminés. O clube logo contratou o bom Adílson Batista para o cargo e pretende deixá-lo no comando até o fim de 2011, aconteça o que acontecer.
O mesmo sucede com o rival corinthiano, o Palmeiras, que viveu um período turbulento após a demissão de Wanderley Luxemburgo e que agora acertou com o incensado Luís Felipe Scolari, o Felipão, que apesar de não ter nenhuma vitória desde que retornou ao comando do Alviverde, não corre perigo de ser sumariamente demitido após empatar mais um jogo.
Seguidos prejuízos financeiros fizeram alguns clubes cair na realidade e pensar duas vezes antes de demitir seu técnico. Até recentemente um grande clube carioca viveu uma situação insólita, ao ter em sua folha de pagamento nada mais que três técnicos de alto nível. O contrato dos técnicos previa multa rescisória elevada, daí o clube optou por “afastá-los” do cargo mantendo-os, ao mesmo tempo, na folha de pagamento da equipe.
Como prudência e caldo de galinha não fazem mal a ninguém, a atitude “zen” vem sendo adotada pelo Atlético Mineiro, que mesmo balançando na penúltima posição do campeonato conserva no comando o polêmico Wanderley Luxemburgo. Os diretores do Galo preferem ter um pouco de paciência a recorrer às fórmulas mágicas de Candinhos e Nelsinhos, técnicos marcados como "salvadores da pátria", aos quais se recorria na hora da morte.