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Quem são os paramilitares e a extrema-direita na Colômbia

Depois do atentado do dia 12 de agosto no centro de Bogotá, em frente à sede uma das rádios mais importantes do país, a imprensa na Colômbia voltou a usar o termo “forças obscuras” para se referir aos autores, ainda desconhecidos, da onda de violência que começou no país após troca de governo de Álvaro Uribe para Juan Manuel Santos, apenas cinco dias antes.

O conceito sem definição não esclarece os responsáveis, mas traz à mente dos colombianos os anos 1990 de Pablo Escobar, época de chacinas e bombas nas ruas. O Opera Mundi decidiu explorar quem são os setores da direita que teriam interesse em detonar bombas e qual mensagem querem passar para o novo presidente.

O coordenador do programa de políticas públicas e de paz do influente think tank Nuevo Arcoíris, Luís Eduardo Celis, lembra que a origem da expressão “forças obscuras” remonta ao início dos anos 1980, época do governo Belisario Betancur, quando ocorreu uma série de atentados em reação à aproximação entre o governo e as guerrilhas.

"Naquela época, a expressão se referia a setores políticos da direita que sabotavam as negociações", diz o pesquisador. “Desde então, fala-se de ‘forças obscuras’ para designar quem usa a violência contra a saída negociada para o conflito. São setores que acreditam que a esquerda armada no país deve ser eliminada fisicamente, que não existe negociação de nenhum tipo e que não há lugar na Colômbia para ela. São setores que se beneficiam do conflito e para os quais a paz não convém”.

Celis ressalta, porém, que ninguém sabe até agora quem plantou a bomba em frente à rádio Caracol, na capital do país. “Na Colômbia, infelizmente, existem pelo menos três setores que cometem atentados a bomba: as FARC [Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia], o tráfico de drogas e as tais ‘forças obscuras’. Mas é claro que há pessoas que não desejam nenhuma negociação e nenhuma alternativa à derrota militar da guerrilha. São setores que ganham com o clima de incerteza gerado por esse tipo de ação”, explica.

Segundo Celis, é possível que estes setores se articulem com militares na ativa ou na reserva. "Se quisermos dar uma definição, as ‘forças obscuras’ podem ser entendidas como setores da direita que envolvem políticos, empresários e um braço armado composto por militares na ativa ou na reserva e que operam com estruturas paramilitares. Creio que, durante o governo Uribe, estes setores foram os responsáveis, por exemplo, pelos atentados contra o então senador Germán Vargas Lleras [hoje ministro da Justiça], ou pela série de falsos atentados que criaram um clima de terror que favoreceu a reeleição de Uribe e que a procuradoria reconheceu como tal, processando integrantes das forças armadas. Foi a primeira vez que se falou na Colômbia de ‘falsos positivos’ que, naquela ocasião, eram falsos atentados".

Latifúndio

A razão, segundo o analista, deve ser buscada na estrutura da propriedade da terra na Colômbia. "É certo que um dos setores econômicos que mais têm alimentado o paramilitarismo e a violência no campo é o da pecuária e do latifúndio em geral. O setor dos grandes proprietários de terras é, sem dúvida, o mais atrasado da sociedade colombiana. Nosso campo foi e continua sendo um campo profundamente antidemocrático e controlado por elites muito reacionárias".

Celis acredita que o início do novo governo não agradou a estes setores. Para ele, Santos e Uribe representam projetos diferentes com interesses diferentes, mas os sinais enviados pelo atual governo, com apenas três semanas de poder, são “interessantes e inesperados”.

“Esses sinais tocam dois temas centrais do conflito: a questão agrária e as garantias políticas. O ministro da Agricultura Restrepo fez uma declaração histórica sobre o tema da terra em um recente debate convocado pelo ativista de direitos humanos Iván Cepeda. Falou de restituição e de uma série de leis que, se aplicadas, levariam quase a uma reforma agrária. É uma mensagem que atinge diretamente o coração do conflito e prepara o caminho para uma possível solução do mesmo", diz o pesquisador.

Resistência

Já para o coordenador do Observatório do Conflito Armado, Ariel Ávila Martínez, da mesma ONG Nuevo Arcoíris, acha que é possível cravar que as “forças obscuras” são "estruturas e elites emergentes ilegais de extrema-direita”. Segundo ele, elas poderiam estar por trás deste atentado porque têm medo de um possível processo de democratização que Santos propõe.

“Na Colômbia, existe historicamente uma resistência à democratização local e regional. Muitas dessas elites, como por exemplo as das planícies do leste, sempre estiveram na ilegalidade: o tráfico de drogas, de esmeraldas, a expulsão de terras em massa. São elites em ascensão, em processo de consolidação, que durante a época do presidente Uribe conseguiram se reforçar e legalizar por meio de uma série de leis que lhes permitiram tornar legal o que adquiriram ilegalmente", afirma.

Três tendências

A diretora do projeto Vote Bem, Claudia López, é uma das mais reconhecidas pesquisadoras do conflito armado colombiano. A analista acredita que há uma recomposição de forças dentro da direita. Para ela, os direitistas dividem-se em três grandes grupos: a direita progressista; a direita legal, mas radical; e a direita abertamente ilegal e narco-paramilitar.

Se é certo que a coalizão que apoiou Uribe em suas duas eleições é a mesma que apoiou Santos, o novo presidente não concedeu representação no gabinete aos setores da direita narco-paramilitar nem entregou instituições nacionais a elas. Uma segunda grande diferença é que Santos não está disposto a gastar seu capital político com a proteção política ou judicial destes setores.

"A bomba pode ter sido uma mensagem para Santos, avisando que não se pode ser eleito com o apoio destes setores e depois não co-governar com eles", diz Claudia López.

Custo político

Ela também se declara "agradavelmente surpresa" com o novo discurso do governo sobre o tema da terra e sua restituição às vítimas e aos 4 milhões de deslocados, tirando-a dos traficantes e dos paramilitares, mas não acredita que será fácil passar das palavras à ação.

"Santos sabe que essa terra está sob o poder de testas-de-ferro que têm representação política e vão reagir. Acredito que este será o ponto culminante. Isso exige uma ruptura com a direita traficante e mafiosa que tem representação política muito forte na coalizão da Unidade Nacional. A pergunta é se realmente o presidente Santos fará esta ruptura, que tem um custo político muito alto. Ele está disposto a perder 29 de seus senadores ligados a estes setores? Isso porque, somando os senadores do PIN, setores do Partido de la U e conservador, ligados à estrutura política da máfia e do paramilitarismo, chegamos a esse número. Quem coloca mais 29 votos? Creio que a manobra de trazer a Mudança Radical e os Liberais para a coalizão poderia ser a resposta e uma manobra de antecipação para pagar esses custos políticos", analisa.

Mas Claudia admite que, se a bomba veio destes setores de extrema direita e se houver uma ruptura, pode ter início uma nova temporada de bombas e massacres. "Para eles, recorrer à violência não foi um problema no passado. Não vejo por que deveria ser agora", prevê.

Fonte: Opera Mundi