Jô Moraes participa de ato pelo Memorial da Anistia

“Fazer a defesa da democracia, mas sobretudo cobrar a resposta que ainda tem de ser dada às famílias dos desaparecidos na ditadura militar, à sociedade. Este período de nosso história ainda não se fechou e sua herança mais dolorosa é o insepultamento de muitas de suas vítimas. Quando houve a execução de Bin Laden, os EUA procuraram dizer à sociedade que ele teve um enterro, respeitando os rituais de sua religião. E é isto que estamos cobrando aqui, é o que toda a sociedade humana exige”.

Jô Anistia

A declaração é da deputada federal Jô Moraes (PCdoB/MG), que conheceu parte dos horrores dos anos de chumbo do Brasil, e que no sábado (14) participou com o prefeito Márcio Lacerda e cerca de uma centena de pessoas, do lançamento da Associação dos Amigos do Memorial da Anistia, no antigo prédio da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais (Fafich), no bairro Santo Antônio. Atrás do prédio, numa parceria entre a UFMG, o Ministério da Justiça e o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento será construído o Memorial da Anistia. Um conjunto arquitetônico, que abrigará um centro histórico com documentos relativos ao período da ditadura militar, um teatro e uma praça, totalizando cerca de 4 mil metros quadrados.

A entidade formalizada ontem, através de um documento em prol da agilização das obras, autorizadas desde 2009, reúne parlamentares, representantes da sociedade civil organizada, jornalistas, ativistas políticos, professores, estudantes e familiares das vítimas do período.

Espera

O depoimento dos familiares dos desaparecidos deram o tom do ato, reiterando os dizeres de uma faixa colocada no alto do palco improvisado: “Esquecer o passado é estar condenado a repeti-lo: ditadura nunca mais”.

Aos 82 anos, usando uma camiseta com a estampa do rosto do filho “Paulinho”, dona Maria Leonor Pereira Marques embora chamada ao palco, não conseguiu se expressar. Passados 39 anos desde a última notícia que teve do filho, ativista do PCdoB na região do Araguaia, ela ainda se emociona ao falar dele, Paulo Roberto Pereira Marques, que soube anos depois, estar morto, mas nunca recebeu o corpo. “É como se ele fosse entrar pela porta, a gente sempre espera. Tem uma esperança”, confidenciou.

Em seu nome falou a filha, Maria de Fátima Marques Macedo que, embora com 15 anos à época, confessou o inconfesso, então: Sabia das atividades do irmão, de sua luta contra a ditadura militar, das reuniões que participava.

“A história do Brasil não fala da violência. De nenhuma época, nem mesmo da ditadura. Até as pessoas entre si evitavam e ainda evitam comentar. Dez anos depois que saiu de casa é que soubemos que ele estava na clandestinidade. A Guerrilha do Araguaia foi o símbolo dessa violência, do extermínio cometido pela ditadura. Falaram que ele estava morto, que havia um corpo, depois não era ele, e até hoje não sabemos direito como foi a ação, onde ele está.”
Como no sábado era aniversário do nascimento de Paulinho, os representantes do PCdoB presente, fizeram uma chamada, iniciando pelo seu nome, representando todos os desaparecidos da guerrilha.

Memória

Vice-presidente da Comissão Nacional da Anistia do Ministério da Justiça, Sueli Bellato relatou a necessidade de um Centro de Memória “para ouvir, ver e guardar a história. Essa história, para que ela não se repita. Para que não sejamos surpreendidos com um golpe de poder. Temos de ser os vigilantes da democracia para que ela seja concluída”, desafiou.

Ao falar do Memorial, ela observou que as etapas exigem várias formalidades, justificando em parte a cobrança dos presentes, já que foi autorizada há dois anos: “A constituição do conselho curador, as etapas envolvem muita gente, muitos papéis, várias exigências, mas estamos trabalhando com vários historiadores”, disse.

Bellato também destacou o simbolismo do ato e a necessidade da apropriação do espaço como forma de se “apoderar da história de quem lutou para fazer o Brasil livre”.

Já o prefeito Márcio Lacerda se comprometeu a concretizar de fato o projeto. Lembrou que foi a Brasília participar de reuniões com tal propósito. O ex-vereador Betinho Duarte, e um dos coordenadores da Associação dos Amigos do Memorial da Anistia, reiterou a disposição de lutar para que as obras tenham início e sejam concluídas. “Vamos resgatar a verdade sobre a ditadura militar com fatos e os registros da época. Temos um vasto memorial que será disponibilizado. Esse é o memorial que o Brasil precisa e merece”.

De Belo Horizonte, 
Graça Gomes