Eleição na Holanda pune políticas de austeridade
“Rutte vence, Wilders bloqueado”. É praticamente assim que começam todos os comentários sobre as eleições legislativas na Holanda. Contudo, a verdadeira mensagem do eleitor foi outra: os partidos governamentais foram punidos por suas políticas liberais de austeridade e a traição dos sociais democratas do PVDA (Partido do Trabalho, sigla em holandês) resultou numa espetacular queda.
Por Marc Botenga, no jornal “Solidaire”, do Partido do Trabalho da Bélgica
Publicado 18/03/2017 11:35

Eles tinham prometido uma política social aos holandeses. Em seu lugar, aplicaram uma política de austeridade muito à direita. Hoje pagam o preço dessa traição. Os liberais do VVD (Partido Popular para a Liberdade e a Democracia, sigla em holandês) comemoram porque perderam menos. Na verdade, deveriam sentir vergonha. Mark Rutte, primeiro-ministro e chefe dos liberais, repetia os propósitos do nacionalista islamofóbico Geert Wilders, do PVV (Partido para a Liberdade, sigla em holandês). Os problemas sociais estiveram ausentes dos debates.
Os social-democratas afundam
A coalizão governamental VVD-PVDA perdeu cadeiras no Parlamento. Quem mais caiu foram os sociais-democratas. Na campanha eleitoral de 2012, eles tinham prometido aos holandeses uma política social. Mas se apressaram a entrar numa coalizão com os liberais de Rutte, que tomou medidas de austeridade às custas da atenção à saúde e das aposentadorias e pensões. Hoje, os sociais-democratas não obtiveram mais que 6% dos votos: uma degringolada histórica. Eles perdem, por assim dizer, quatro quintos dos seus eleitores. O ministro das Finanças, Jeroen Dijsselbloem vai, portanto, perder seu posto ministerial. Ele ainda preside o Eurogrupo (que reúne os países da zona do euro) e ficou tristemente famoso por sua dura abordagem da questão grega.
Após as eleições, o VVD não teve senão elogios para com o “senso de responsabilidade” da social-democracia. A falência desta enfraqueceu igualmente todo o campo progressista. Claramente, os eleitores votaram em menor número na centro-esquerda. Tudo beneficiou a direita.
Os liberais nas pegadas de Wilders
Igualmente, o primeiro partido governamental, o liberal VVD, perde oito cadeiras no Parlamento. Uma perda menor da que Mark Rutte temia e do que previam as pesquisas. A operação de “salvação” de Rutte contou com dois componentes.
Primeiro, Rutte retomou os propósitos de divisão e ódio de Geert Wilders. Todo mundo devia “agir normalmente”. As pessoas deviam canalizar seu descontentamento para aqueles que “não atuam normalmente”, ou seja, as minorias, os muçulmanos, os refugiados, a Turquia… Não se devia falar dos problemas sociais, nem da especulação imobiliária ou dos seguros de saúde privados. O governo Rutte fez da Holanda um paraíso fiscal, onde empresas de todo o mundo buscam um endereço de “caixa postal” a fim de escapar dos impostos. As multinacionais ficam, assim, com as mãos livres e os acionistas podem enriquecer à saciedade. Wilders é inteiramente favorável a isso. Por diversas vezes, ele votou contra proposições do SP (esquerda, Partido Socialista, sigla em holandês) que se opunham ao seguro de saúde dedutível, o pagamento antecipado pelo paciente. Quanto à proteção aos locatários contra os aumentos dos aluguéis, Wilders e o VVD também disseram “não” em uníssono.
Em busca de uma alternativa social
O segundo componente do discurso de Mark Rutte foi a velha cantilena de que o crescimento econômico doravante beneficiaria todos os cidadãos. Mas, depois de anos de política neoliberal, ocorreu o inverso. São cada vez mais numerosos os holandeses que adiam seus tratamentos de saúde devido ao aumento das tarifas (seu número mais que duplicou desde 2010). A idade da aposentadoria aumenta. O mercado da habitação está em crise, com aluguéis muito caros. Os estudantes devem tomar empréstimos para financiar seus estudos e é pesadamente endividados que eles começam em seguida uma carreira. No mercado de trabalho, há atualmente cerca de um milhão de pessoas ocupadas em regime de precariedade, muito mal remuneradas e sem acesso a uma proteção social digna deste nome.
Isto precisa mudar, é o que os eleitores pensam. De uma maneira ou de outra, todos os partidos de oposição progridem. Alguns se posicionam no conforto do centro, como o CDA (os democratas-cristãos, sigla em holandês), D66 (liberais de esquerda) e o GroenLinks (a esquerda verde), que sobe com uma imagem jovial e dinâmica. Outros se perfilam em torno de um tema ou de um grupo de público particular – Partido para os Animais, Partido dos Aposentados (50Plus) e o Partido dos Imigrantes (DENK, sigla em holandês). O SP é o partido que tem mais votos à esquerda. Seja qual for o governo que se formará depois das eleições, a pressão de baixo será essencial para arrancar uma verdadeira mudança.
Há manifestamente grandes oportunidades para um tal movimento de esquerda, que substitua a traição dos social-democratas por uma alternativa social unificadora.