Como alterar a vontade do eleitor

Em junho do ano passado, o Ministério Público Federal (MPF) denunciou à Justiça quatro executivos e duas secretárias da construtora Camargo Corrêa, quatro doleiros e um empresário pela suposta prática de crimes financeiros investigados durante a Operação Castelo de Areia da Polícia Federal. Uma movimentação ilegal de cerca de US$ 16 milhões nos últimos anos.

A operação investiga crimes de superfaturamento de obras públicas e doações ilegais a partidos políticos e candidatos, além de ligações entre os denunciados e membros da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Segundo o Ministério Público os documentos apreendidos já comprovam a ocorrência dos crimes financeiros, mas é possível aprofundar as apurações quanto aos outros delitos, com repercussão na Justiça Eleitoral. (1)

Há cerca de um ano, o senador Pedro Simon questionava da tribuna do senado sobre a milionária participação das empreiteiras no sistema de poder no Brasil: “Por que uma empreiteira vai dar dinheiro para todo mundo? Por amor?” Simon tinha razão. Denúncias posteriores, também feitas pelo MPF, acusaram as principais construtoras do país de formar conluio para fraudar processos de licitação do metrô de Salvador.

Em 23 de maio de 2007, Simon declarou ao jornal gaúcho Zero Hora: “as empreiteiras controlam o Orçamento da União, apresentando projetos diretamente nos ministérios e através de emendas individuais dos parlamentares”. E “Isso acontece desde o governo Collor, quando a CPI do PC Farias e a dos Anões do Orçamento revelaram a corrupção praticada pelas empreiteiras. Tentei criar uma CPI para investigar os corruptores, mas o governo Fernando Henrique impediu”. A blindagem tucana afastava assim o “perigo” instalado em sua base de apoio e contrariava desejos da OAB e de partidos de oposição à época.

Há nomes graúdos, tanto da oposição quanto da situação, entre os envolvidos na Operação Castelo de Areia. Não estão ausentes figuras exponenciais, festejados “combatentes da ética”, como o senador Jarbas Vasconcelos, do PMDB de Pernambuco, e membros do alto tucanato paulista, como o vice-governador, Alberto Goldman. Lamentavelmente, algumas operações com base em denúncias do MPF vêm sendo abafadas por ingerência institucional, com destaque para as ações do STF. (2)

Segundo o Estado de S. Paulo, desta segunda-feira, 22/2/2010, cinco empreiteiras receberam R$ 243 milhões da prefeitura de São Paulo, “depois de doarem, juntas, R$ 6,8 milhões à campanha de reeleição do prefeito (Gilberto Kassab)”. E “o valor dos contratos pode ser superior, já que nem todos foram ainda 100% executados”. A Camargo Corrêa, OAS, Christiani Nielsen, Engeform e S/A Paulista, conforme o site De Olho nas Contas, da própria Prefeitura, obtiveram contratos com secretarias da administração municipal que superam o valor doado em mais de três mil porcento. (3)

Entre as doações consideradas ilegais pela Justiça Eleitoral, a Camargo Corrêa é a campeã, de uma relação onde consta ainda o Banco Itaú e a Associação Imobiliária Brasileira (AIB). Elas totalizam R$ 10 milhões de um total de R$ 29,8 milhões arrecadados para a campanha de reeleição de Kassab em 2008. Para a Justiça Eleitoral, o fato configura “abuso do poder econômico” que “altera a vontade do eleitor”.

Hoje se sabe que o juiz que “aprovou” as contas de Kassab, condenou, ao mesmo tempo, a forma como foi feita a arrecadação de recursos e que agora é alvo de decisão que determina a cassação do mandato do prefeito na capital paulista. Ambas decisões têm em comum o fato de que a forma “dificulta sobremaneira o verdadeiro instituto da prestação de contas no processo eleitoral” e expõe “íntima e perigosa relação negocial existente entre empresas privadas e o poder público”. (4)

(1) Folha SPaulo

(2) Ultimainstância

(3) Estadão

(4) UOL Notícias

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