Hora de romper relações com Israel

“Sobretudo, sejam sempre capazes de se indignar contra qualquer injustiça cometida contra qualquer pessoa em qualquer parte do mundo. Esta é a qualidade mais linda de um revolucionário”.


Carta de Ernesto Che Guevara aos seus cinco filhos.<

Além da forte indignação humana contra o bárbaro genocídio no Líbano, os mais de 10 mil participantes da unitária, plural e solidária passeata em São Paulo neste domingo, dia 6, apresentaram como proposta concreta a exigência de que o Brasil rompa as relações diplomáticas com o Estado terrorista de Israel. A cobrança das forças políticas e sociais que organizaram o protesto é plenamente justificada. Afinal, o que ocorre nesta região afronta todas as normas do direito internacional e representa um dos episódios mais tristes de agressão a uma nação soberana e de extermínio de um povo. Parece que os sionistas israelenses desejam repetir, com requintes de crueldade, a triste história do holocausto nazista contra o povo judeu.


 



Segundo informações oficiais, até o último dia 2 já morreram 200 crianças e 828 adultos libaneses, outros 3,2 mil ficaram feridos e um quarto da população do país – quase um milhão de pessoas – foi desalojado de suas casas pelos intensos bombardeios. A ofensiva é implacável. Além dos ataques aéreos, cerca de 10 mil soldados israelenses ocuparam cinco áreas ao sul do Líbano. Toda a infra-estrutura do Líbano – redes de transmissão de energia, reservatórios de água, o aeroporto central, rodovias e pontes – está sendo alvo da destruição, o que agrava ainda mais a situação deste sofrido povo. Hospitais estão sem energia elétrica para realizar cirurgias, falta água em várias cidades e não há rotas seguras de fuga. A devastação é total.
 


 


Do lado israelense, em três semanas de combate morreram 37 militares e 19 civis – o que prova a enorme desproporção desta “guerra”. As justificativas apresentadas pelos nazi-sionistas também são escandalosas. Alegaram que a criminosa ofensiva decorreu do “seqüestro” de dois soldados israelenses por militantes do Hezbollah, em 12 de julho. Nunca a captura de tropa inimiga foi desculpa para uma ação desta magnitude. A versão alardeada na mídia burguesa foi a de que o grupo libanês fez o seqüestro em território de Israel. Fontes independentes, porém, garantem que o serviço de inteligência militar sionista (Aman) invadiu a região libanesa de Aita-al-Shaab e que seus soldados foram atacados e capturados pelo Hezbollah.


 



A mesma desculpa serviu como pretexto para a bárbara invasão do território palestino em junho passado. Após o seqüestro do soldado Gilat Shalit – que o grupo Hamas pretendia trocar por 150 mulheres e 350 menores presos em Israel, sem julgamento –, o Estado terrorista de Israel bombardeou o país, prendeu um terço do Parlamento Palestino e vários ministros (inclusive o seu chanceler, Mahmoud Zahar), ameaçou publicamente assassinar o primeiro-ministro palestino Ismail Haniyeh e ainda anunciou sua pretensão de realizar ataques aéreos e navais contra a Síria, acusada de abrigar líderes do Hamas. Ou seja: num curto espaço de tempo, os nazi-sionistas agridem o Líbano e a Palestina e ainda ameaçam a Síria e o Irã.


 



Daí a justa indignação do escritor Eduardo Galeano. “Até quando o seqüestro de um soldado israelense poderá justificar o seqüestro da soberania palestina? Até quando o seqüestro de dois soldados israelenses poderá justificar o seqüestro de todo Líbano? Até quando continuará correndo sangue para que a força justifique o que o direito nega? Esta matança de agora, que não é a primeira e nem será, receio, a última, ocorre em silêncio. O mundo está mudo? Até quando seguirão soando em sinos de madeira as vozes da indignação? Destina-se US$ 2,5 bilhões, a cada dia, para os gastos militares. A miséria e a guerra são filhas do mesmo pai: como alguns deuses cruéis, come os vivos e os mortos. Até quanto continuaremos aceitando que este mundo enamorado da morte é nosso único mundo possível?”.


 


Marionete dos EUA



 


Na verdade, a desculpa da “legítima defesa” visa escamotear os planos expansionistas de Israel – e do seu tutor, os EUA. Como adverte reportagem da Carta Capital, a captura de soldados nunca gerou ações tão destrutivas. “Em 1985, o governo do Likud trocou 1.150 prisioneiros por três soldados israelenses. Há pouco mais de dois anos, aceitou libertar 430 prisioneiros palestinos e árabes em troca de um empresário e coronel da reserva seqüestrado pelo Hezbollah”. Além disso, o Exército de Israel sempre se utilizou do seqüestro e de outros métodos bárbaros. Dias antes do recente ataque à Palestina, ele seqüestrou dois civis de suas casas em Gaza. Pouco antes, assassinou 90 palestinos – entre eles, sete membros de uma família que fazia piquenique na praia, incluindo três crianças e uma mulher grávida. O pretexto é esfarrapado!


 



A razão do genocídio atual é que Israel não aceita a viabilização de qualquer acordo nesta região e que os EUA estão perdendo o controle desta área estratégica, rica em petróleo e decisiva no tabuleiro geopolítico mundial. No momento em que o próprio Hamas discutia a possibilidade de aceitar a existência do Estado de Israel como única forma de viabilizar a paz duradoura, os violentos ataques abalam estas esperanças, atiçam o conflito e fortalecem os planos expansionistas do nazi-sionistas. Como lembrou o jornal Avante, do Partido Comunista de Portugal, esta pretensão é bastante antiga. Documento de 1957, elaborado pelo primeiro-ministro David Ben Gourion (1948-63), já pregava a ocupação de territórios palestinos e árabes.


 



Outro texto mais recente, de julho de 1996, intitulado “ruptura limpa: a nova estratégia para a segurança”, defendia abertamente “a anulação dos acordos de paz de Oslo; a eliminação de Iasser Arafat; a anexação dos territórios palestinos; a derrubada de Saddam Hussein no Iraque para desestabilizar a Síria e o Líbano; o desmantelamento do Iraque; e a utilização de Israel como base complementar do programa dos EUA de guerra das estrelas”. Como se observa, além de sua obsessiva ambição, Israel sempre serviu aos interesses ianques. Agora, com a generalização do conflito na região, George Bush usa sua marionete para emplacar o “plano de reestruturação do Oriente Médio”, com a rendição dos países que integram o “eixo do mal”.


 



Não é para menos que os EUA não aceitam qualquer recuo de Israel nesta ofensiva assassina e rejeitam as propostas de cessar-fogo da ONU. “Não vejo qualquer interesse na diplomacia se for para votar ao status quo anterior entre Israel e Líbano. Penso que isso seria um erro. O que nós estamos presenciando, de certa forma, é um começo, são as dores do parto de um novo Oriente Médio”, explicitou a cínica e abjeta serial killer Condolessa Rice, secretária de Estado dos EUA. O plano expansionista da “reestruturação” está em curso, incluindo o “porrete diplomático”, o envio de armas ianques de última geração para Israel e ainda a veneno ideológico da mídia burguesa. O Líbano e a Palestina já foram covardemente agredidos; em 28 de junho, aviões israelenses invadiram o espaço aéreo da Síria, inclusive sobre a área do palácio presidencial de Bashar Assad; já o Iraque está sob ocupação das tropas ianques; e o Irã sofre todo tipo de provocações.


 



A pressão internacionalista



 


Diante desta escalada, a reação mundial está crescendo, embora ainda muito aquém das necessidades. As manifestações de repúdio à violência nazi-sionista são maiores na própria região. Já na Europa ocorreram passeatas e atos em vários países. Até em Israel, grupos pacifistas exigem o cessar fogo e a retomada das negociações de paz. Na América Latina, a ação mais contundente foi tomada pelo governo venezuelano. O presidente Hugo Chávez ordenou a retirada do seu embaixador em Israel, “porque causa indignação ver como esse Estado continua bombardeando e esquartejando inocentes com os aviões gringos que eles têm. Como se explica que o mundo olhe isso de braços cruzados, que não faça nada para frear este horror?”.   


 



O governo de Cuba também emitiu duro comunicado exigindo o imediato cessar-fogo. Segundo sua nota oficial, “a responsabilizando desta selvagem agressão contra a população civil libanesa, que constitui um ato de terrorismo de Estado, é de quem apóia econômica e militarmente o agressor e de quem atua como vassalos servis e cúmplices. O governo americano, com o seu veto, impediu o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas de atuar. A sua pública e criminosa oposição à exigência de um cessar-fogo abortou outras iniciativas de paz. A União Européia, com raras exceções, serve de cúmplice e aceita as brandas declarações impostas pelo Império do outro lado de Atlântico”.


 



Já o governo Lula enviou carta ao secretário-geral da Organização das Nações Unidas, Kofi Annan, na qual manifesta explícita condenação aos ataques de Israel. “O Brasil se sente diretamente atingido pela violência contra civis na região, que já vitimou sete cidadãos brasileiros, inclusive crianças. Repudiamos o terrorismo, não importa sob que justificativa, mas não podemos deixar de condenar, nos termos mais veementes, a reação desproporcional e o uso excessivo da força que tem resultado na morte de grande número de civis, inclusive mulheres e crianças, e na destruição da infra-estrutura do Líbano”, afirma o comunicado. O Mercosul também rejeitou a assinatura de um tratado de “livre comércio” com Israel.


 



Apesar de positiva, a manifestação do governo Lula é insuficiente diante da radicalização do genocídio. A proposta de retirar o embaixador brasileiro de Israel, num sinal de rompimento das relações diplomáticas, já seria cabível. Afinal, o Estado sionista já desrespeitou 46 resoluções da ONU condenando Israel. “Até quando o governo israelense exercerá o privilégio de ser surdo? As Nações Unidas recomendam, mas não decidem. Quando decide, a Casa Branca impede que decida, porque tem direito de veto. A Casa Branca vetou, no Conselho de Segurança, 40 resoluções que condenavam Israel. Até quando as Nações Unidas continuarão atuando como se fossem o outro nome dos Estados Unidos?”, indaga Eduardo Galeano.


 



Segundo Marjorie Cohn, integrante da Associação de Juristas dos EUA, a ação de Israel no Líbano é uma flagrante violação de todas as leis de guerra, incluindo a Quinta Convenção de Haia, de 1907 (artigo 50), a Quarta Convenção de Genebra sobre a proteção de civis em tempo de confrontos, de 1949 (artigo 33) e o Protocolo I de 1977, sobre a proteção de vítimas de conflitos internacionais armados (artigo 75). Mais do que as normas jurídicas, as fotos de centenas de crianças destroçadas pelos bombardeios, publicadas no Portal Vermelho, reclamam uma ação urgente contra o Estado terrorista e bandido de Israel.


 



No atual conflito, os sionistas nem sequer respeitam o direito brasileiro de retirar os seus compatriotas da região em guerra. O próprio ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, queixou-se à mídia de que o governo de Israel não ofereceu qualquer garantia para que os brasileiros e seus descendentes atravessem a fronteira em segurança, o que tem criado enormes dificuldades ao transporte. Diante destes fatos, José Reinaldo de Carvalho, secretário de relações internacionais do PCdoB, avalia que se “justifica que cresça o clamor pela retirada de nossa embaixada daquele país”. Esse foi exatamente o clamor dos presentes na passeata em São Paulo, que deve incentivar uma massiva campanha de solidariedade no Brasil inteiro.

As opiniões expostas neste artigo não refletem necessariamente a opinião do Portal Vermelho