O Natal de Carolina

A luta por justiça persiste no Brasil. O exemplo da escritora Carolina Maria de Jesus, mulher de coragem e caráter, também segue vivo nos nossos corações.

Foto: Anderson Pereira

Numa movimentada avenida de São Paulo, a catadora de material reciclável Carolina Maria de Jesus disputa o mesmo espaço com carros e motos. Puxando o seu carro feito de madeira, cheio de papelão e alguns metais, ela pensa nos filhos que ficaram sozinhos em casa. E com fome.

Carolina mora num pequeno barraco na favela do Canindé com os filhos pequenos João José, José Carlos e Vera Eunice. Negra e mãe solteira, ela trabalha dia e noite para sustentar a família. Nos raros momentos de descanso, ela encontra tempo para escrever.

“Aniversário de minha filha Vera Eunice. Eu pretendia comprar um par de sapatos para ela. Mas o custo dos gêneros alimentícios nos impede a realização dos nossos desejos. Atualmente, somos escravos do custo de vida. Eu achei um par de sapatos no lixo, lavei e remendei para ela calçar”, escreveu Carolina em julho de 1955.

Poucos anos depois, Carolina Maria de Jesus seria encontrada pelo repórter Audálio Dantas durante uma reportagem que ele fazia na Favela do Canindé. A partir desse encontro, Carolina compartilhou com Dantas as suas anotações que fazia num diário. Em casa, o jornalista começou a ler aquele material e logo teve a certeza que encontrara uma nova escritora.

Em 1960, era publicado o livro Quarto de Despejo – uma história de injustiça, racismo e pobreza contada pela própria Carolina Maria de Jesus. O sucesso foi tanto que foram vendidos mais de 100 mil exemplares na época. Sessenta anos após o seu lançamento, a história de Carolina é vivida por milhares de brasileiros.

Hoje, 60% das pessoas presas injustamente no Brasil são negras. Discriminação racial, erros judiciais grosseiros (pessoas presas no lugar de outras, por engano) e falhas na investigação estão entre os motivos para essa injustiça. Se de um lado, o sistema penaliza pessoas inocentes, do outro, a lei não é aplicada como deveria.

Um levantamento realizado pela Agência Pública há dois anos constatou que 34 acusações de assassinatos cometidos por militares em operações de Garantia da Lei e da Ordem não resultaram em condenação.

Entidades de direitos humanos denunciam o risco de parcialidade nesses casos. Desde 2017, a lei 13.491, sancionada pelo então presidente Michel Temer, transfere para as Forças Armadas os julgamentos dos crimes cometidos por militares.

Entre os civis, o caso envolvendo os procuradores da Operação Lava Jato também chama a atenção. O Tribunal de Contas da União (TCU) descobriu que cinco magistrados da operação, que tinha como responsável o promotor Deltan Dallagnol, desviaram R$ 2,5 milhões em diárias. Todos foram condenados a devolverem os recursos, mas os técnicos do TCU continuam investigando outras irregularidades.

Já o ex-juiz da Operação Lava Jato, Sérgio Moro, que julgou o ex-presidente Lula em 2018, foi considerado parcial pela maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Atualmente, Moro é pré-candidato à presidência da República.

A luta por justiça, assim como o exemplo da escritora Carolina Maria de Jesus, segue viva em nossos corações.

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