O que é isso, companheira?

Desde que a presidente Dilma Rousseff foi reeleita, em outubro de 2014, e dada a tibieza com que vem se comportando diante da truculenta e sistemática oposição que a cercou (e a cerca até hoje e certamente até o final do mandato), debateu-se muito, entre seus apoiadores, sobre a necessidade do governo a encarar com maior vigor a luta politica em curso no Brasil. Ou seja, ingressar no cenário do confronto para defender, com a tenacidade, a meu ver imperiosa, o segmento político que representa.

Percebo agora, no entanto, e não sem funda preocupação, que o problema central do governo Dilma, nos dias que correm, já não é simplesmente postar-se com maior altivez e audácia frente a uma oposição quase sanguinária que só pensa e age para apeá-la da Presidência. Tampouco, como sugere a deputada federal Luciana Santos, presidente nacional do PCdoB, “resgatar uma relação com a própria base social que a elegeu, que são os trabalhadores”.

A dramaticidade do momento presente é que Dilma Rousseff passou a defender, como solução para a crise econômica vivida pelo País, um programa, tragicamente eivado das ideias conservadoras que ela combateu em campanha (e por isso foi eleita). Em outras palavras: um programa que a aproxima, perigosamente, dos ideais dos seus adversários.

Natureza conservadora

Dias atrás o senador Lindbergh Farias, do PT carioca, e o economista João Sicsú, publicaram há dias excelente artigo sob o título “O que é isso, Dilma? (essas propostas não são nossas!)”, publicado no site “Carta Maior” e replicado em outros. Os autores apresentam uma ressalva preliminar ao que pretendem dizer: “Sempre estivemos e estaremos ao lado da presidente na defesa do seu mandato e dos valores democráticos. Reconhecemos também os problemas da economia mundial, suas crises e desaceleração generalizada”. Dito isso, criticam duramente o documento “Reforma Fiscal de Longo Prazo”, recentemente anunciado pelo Ministério da Fazenda.

A reforma – que não está voltada para o espaço de um ano (no caso 2016), mas “estabelece regras permanentes” – é mesmo de natureza nitidamente conservadora. Ali está, para mencionar um exemplo gritante, o compromisso de seguir pagando juros aos rentistas e banqueiros, já que o tal superávit primário serve justamente a isso.

“Para recuperar o crescimento”, afirmam os articulistas, “não é sugerida nenhuma medida, mas para ‘flexibilizar os gastos públicos’ (isto é, reduzir despesas obrigatórias) propõe [o documento] inúmeras possibilidades – até mesmo a suspensão da política de valorização real do salário mínimo que impõe gastos à Previdência. O governo abandona a afirmação de que é a redução da atividade econômica uma das causas do problema fiscal e nada fala sobre a recuperação do emprego e da renda”. Ao contrário, apresenta um rol de maldades, segundo Lindbergh e Sicsú, “um tanto óbvias para os ouvidos conservadores: corte de gastos de custeio (ou seja, programas e gastos sociais), suspensão de concursos públicos, corte de salários dos funcionários públicos, corte de benefícios a servidores públicos e suspensão do aumento real do salário mínimo”.

Ao cabo do seu arrazoado, os autores expressam opinião que, pela pertinência, não posso deixar de reproduzir “ipsis litteris” a seguir:

“Em política, a cegueira fatal é daquele que não quer enxergar por covardia. Priorizar uma pauta assim, como centro da ação estratégica, é atirar contra sua própria base em um momento que travamos uma guerra contra o impeachment, que tivemos uma vitória parcial nas ruas ano passado, mas cujos ataques especulativos das forças conservadoras – caso baixemos a guarda – podem retornar antes que se possa respirar. Se algum estrategista do governo pensa que vai conseguir neutralizar as elites adeptas do neoliberalismo com essa pauta, desconhece a história. Esse pessoal está em guerra sem retorno nem acordo contra nosso projeto político”.

“O que pode acontecer com esse movimento arriscadíssimo de cedência permanente de espaço ao adversário – visando erroneamente cativá-lo – resulta em Dilma imobilizar ou perder aqueles que ainda estavam dispostos a ir para as ruas em sua defesa”.

Reflitamos.

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