Os Data Centers no Brasil
Plano nacional busca atrair R$ 2 trilhões em 10 anos com incentivos para Data Centers sustentáveis, fortalecendo a soberania digital e impulsionando a indústria nacional.
Publicado 12/05/2025 15:50

Quatro horas da manhã. Acorda-se cedo. Mensagens, pela internet, para não fazer barulho. Uma colega professora me alerta: “O debate está quente em Brasília. Temos que acompanhar. É decisão estratégica para o Brasil e para o Nordeste.”
Não entendendo direito, questiono do que se trata. Com calma, me explica, é sobre um Plano de Internalização de Data Centers, feito pelo Ministério da Fazenda, em parceria com o da Indústria e a Ciência e Tecnologia. Começo a entender, embora não tivesse informações.
Centro de Processamento de Dados, conhecido como Data Center, uma instalação física projetada para armazenar, processar e gerenciar dados de forma segura e eficiente, isso eu sabia. É fundamental para a digitalização das empresas, é onde se armazenam e processam as informações das empresas e instituições, básico para dar agilidade e eficiência às decisões.
Querendo mais detalhes, procuro um amigo especialista. De uma maneira didática, ele me explica:
“Os Data Centers são como o coração da computação de hoje. Ao invés de termos dados espalhados e distribuídos, eles são concentrados em um local e de certa maneira protegidos e melhor administrados para as diversas aplicações (bombeados para diversos usos).
Outra analogia seria comparar eles com centros de logística, onde se armazenam dados (itens), que são usados/distribuídos quando necessários.
Em função da aplicação, eles assumem desenhos diferentes: dedicados a uma empresa ou a vários usuários, voltados para uma grande quantidade de dados ou estratégicos para empresas ou informações sigilosas de governo, serviços que envolvem restrições de tempo de acesso ou não.”
Procurando mais informações, vejo na internet que os Data Centers são classificados em níveis, de 1 a 4, dependendo da disponibilidade de infraestrutura e, principalmente, de sua capacidade de suportar falhas e manutenção com um mínimo de interrupções.
Estados Unidos, Alemanha, Reino Unido e China possuem um grande número de Data Centers, sendo que a América do Norte, disparado, é o maior, tem cerca de metade dos mais sofisticados, nível 3 e 4.
Como são equipamentos tecnologicamente sofisticados e caros, as empresas e instituições que deles precisam, todas da era digital, preferem contratar seus serviços e pagam caro por esses serviços. Como não temos em quantidade e qualidade esses equipamentos no país, os serviços representando um ônus para a Balança de Pagamentos.
Acrescente-se a isso que os Data Centers consomem uma quantidade de energia significativa, tem operação contínua de seus equipamentos. Além, para o resfriamento de seus equipamentos e servidores, precisam de enormes volumes de água o que pode ser um problema para abrigá-los em muitos locais.
O aumento de armazenamento e processamento de dados, impulsionado inclusive pela Inteligência Artificial, leva a um aumento desproporcional de uso de energia e água que deve ser considerado. Aí entra o Brasil como potencialmente produtor de energias renováveis em larga escala e ainda dispondo de volumes de água compatíveis.
Discordando daqueles que sempre usam o chavão de que não temos um Projeto Nacional de Desenvolvimento, na transição para o atual Governo, no meu entender, construímos um projeto que, talvez, por circunstâncias políticas não esteja sendo posto em prática totalmente.
Nele, além de abordar temas sociais da máxima importância, definiu-se como prioridade estancar a desindustrialização do País, que vinha faz anos. Missões foram definidas. Voltadas para a melhoria das condições de vida como metas, mas, não só, também, buscando maior competitividade das cadeias produtivas da nação. Nessa direção, estruturou-se o Plano Nova Indústria Brasil.
Neste, a Missão IV visa a transformação digital de nosso parque fabril para dar maior competitividade à nossa indústria. São priorizados campos como Big Data, internet das coisas, Inteligência Artificial e Robótica, por exemplo. Tecnologias disruptivas que podem alterar o estágio atual do setor. Para todas elas, Data Centers são fundamentais, principalmente os de classificação superior.
Com esse cenário, resolveu-se fazer um Plano específico para Data Center tendo à frente o Ministério da Fazenda, por ter forte ênfase em incentivos fiscais para a captação de investimentos de monta, tendo como parceiro o MDIC e o MCTI, que articulam o setor e tem profundo conhecimento da realidade setorial.
Um plano ambicioso para promover o crescimento do setor de Data Centers no Brasil. Tem como objetivo atrair investimentos de R$ 2 trilhões em 10 anos. Dizem os documentos:
“Cria uma política nacional para Data Centers, com incentivos fiscais, segurança jurídica e regras específicas para o setor, visando posicionar o Brasil como um centro global para Data Centers.”
Não é uma atração de investimentos sem regras bem definidas. Vale salientar que no Plano se tem um forte enfoque na sustentabilidade.
Propõe-se que aos equipamentos aqui localizados que se basearem em energia renovável, como solar, eólica ou hidrogênio verde, terão benefícios fiscais diferenciados.
Segundo o Ministério da Indústria, se incorpora isenções tributárias para os investimentos necessários com impacto de mais longo prazo, como compra de equipamentos e construções físicas, em contrapartida à vinda para o país das grandes empresas do setor.
Há contrapartidas para o Fundo Nacional de Desenvolvimento Industrial e Tecnológico, recursos que visam financiar pesquisa e desenvolvimento e adensar a cadeia produtiva com conhecimento.
Ainda, a isenção de Impostos de Importação só será concedida a produtos que não tenham produção de similares no país. Memórias, servidores, equipamentos de Tecnologia da Informação aqui já sejam produzidos não terão esse benefício.
Reduzir a dependência externa dos serviços dos Data Centers é fundamental. No ano de 2024 houve um déficit na Balança Comercial de mais de sete milhões de dólares, apenas com os Estados Unidos.
Com esse Plano finalizado, cabe um processo de busca de investidores. E o primeiro passo está sendo dado esta semana.
O Ministro da Fazenda foi à América do Norte para detalhar para grandes investidores, como Amazon, Google e Nvidia o plano. No seu discurso está a necessidade tecnológica do país, a oportunidade de negócios e a transformação ecológica.
Também, a importância de priorizar o poder computacional para as instituições e empresas implantadas no País. Pelo menos 10% da capacidade gerada pelos investimentos com os incentivos têm que contemplar instituições e empresas que atuam no Brasil.
Segundo cálculos feitos pelo Governo, como já dito, há um potencial de atração de investimentos de 2 trilhões de reais, em dez anos, o que não é pouco.
Embora o programa pareça ser bem estruturado, reações contrarias começaram a existir.
Estados que já atraíram empresas, como o Ceará, em que existem Zonas de Processamento para a Exportação com benefícios similares específicos, precisam de ações compensatórias que devem ser negociadas com o Governo Federal. Tenho certeza que serão.
Mais que uma crítica, um alerta usual e relevante é quanto à segurança informacional e soberania nacional. Há receio de que, ao se associar com as grandes Big Techs se esteja abrindo mão da privacidade e sigilo em prol dos americanos.
Evidentemente, essas negociações terão que levar em consideração este fator e medidas protecionistas deverão ser adotadas. Países como a China e alguns da Comunidade Européia têm adotado modelos que parecem ser seguros e confiáveis. Podem servir de parâmetro para nós.
Sempre há uma visão conspiratória por detrás de algumas críticas a qualquer plano nacional que seja elaborado. Não é diferente para este. Surgem os primeiros textos contrários com a seguinte alegação:
“Essas empresas (com quem se pretende negociar, as Big Techs) foram e continuam sendo peças centrais na arquitetura de desinformação, manipulação e espionagem que empurrou o Brasil ao colapso institucional vivido na última década”.
Ou seja, critica-se o programa por estar procurando empresas externas que usariam seu poder de mercado para manter o País na “dependência e submissão tecnológica”, inclusive manipulando as informações armazenadas.
Entendo a resistência, mas considero despropositado. Um mercado que cresce a passos largos, em que não temos capacidade financeira ou tecnológica para nos inserir autonomamente, não pode ser desprezado por razões políticas ou ideológicas.
Claro que outras parcerias serão procuradas, por exemplo, com empresas dos BRICS que têm a tecnologia adequada. Serão muito bem vindas. Mas, limitarmos nossa busca a essas é desconhecer a realidade desse mercado específico e desprezar parcerias que podem ser viabilizadas em mais curto espaço de tempo, com possíveis bons resultados.
É um espaço importante para auxiliar na reindustrialização do País. Um espaço em que temos posição privilegiada na concepção da sustentabilidade energética.
Onde podemos ter uma ação com impactos regionais redistributivos se soubermos direcioná-la como política pública espacialmente alocativa. Lembrando, por exemplo, que o Nordeste é o maior produtor de energia eólica nacional, grande produtor de energia solar e, com a estrutura de Pecém e Suape, apresenta-se como potencial principal produtor de hidrogênio verde.
Um programa que parece bem estruturado e dimensionado, mas, pode e deve ser aperfeiçoado, que muito pode contribuir para um desenvolvimento mais harmônico, modernizante e aderente com as tendências contemporâneas, é um passo significativo para a inserção brasileira nas tendências atuais do setor produtivo.