Pagando o (alto) preço
A presidente Dilma Rousseff optou por enfrentar a difícil situação econômica do país adotando uma receita de fundo neoliberal, o ajuste fiscal. Os resultados já aparecem – e, reconheçamos, de modo dramático. Segundo a revista Carta Capital, “de dezembro a abril, a taxa oficial de desemprego, medida pelo IBGE, já subiu de 4,3% para 6,4 %.
Publicado 09/06/2015 18:32
No período, a renda do trabalhador praticamente estagnou”. Ainda segundo a revista, a situação vai se agravar. “A recessão econômica de 2015, capaz de fazer o PIB recuar 1,2% nos cálculos da equipe econômica, causará mais demissões e queda salarial daqui a dezembro”.
Não é por menos que a já anêmica popularidade da presidente venha sendo ainda mais corroída. A aprovação do seu governo, segundo aferições do Datafolha e do Ibope beiram os 10%, enquanto sondagens mais recentes apontam inéditos 7%. É claro que parte do desgaste presidencial provém da rancorosa campanha movida desde as eleições de outubro pela direita e seu suporte midiático, mas deve-se admitir que os efeitos do ajuste fiscal contribuíram para isso. A guinada no discurso da presidente, da campanha do segundo turno às primeiras semanas após as eleições, fez com que ela perdesse o apoio de muitos dos seus próprios eleitores, que se sentiram enganados. O compromisso anunciado no discurso de posse – “nenhum passo atrás, nenhum direito a menos” – anda razoavelmente relativizado.
Tempos difíceis
A previsão futura não é boa. O próprio governo admite uma situação difícil até fins de 2017, o que poderá complicar o desempenho eleitoral dos partidos que apoiam a presidente nas eleições municipais de 2016, palco de armação da sucessão em 2018. O desgaste que se observa já resvala em Lula. Em artigo anterior (“As razões e seu preço”), mencionei que “a situação também não é refrescante para os partidos e movimentos de esquerda que dão sustentação política ao governo. Como a presidente, tiveram lá suas razões para votar pelo ajuste proposto. Mas também pagarão por isso um preço nada desprezível. Seus parlamentares ficarão indelevelmente marcados por tal voto, expostos à exploração oportunista da direita, que tudo fará para desgastá-lo junto aos trabalhadores”.
Tudo isso vem provocando, obviamente, reflexões e preocupações entre os que se postam na defesa da legitimidade do mandato da presidente e contra os arroubos golpistas da direita. A presidente está convencida da justeza do caminho que escolheu para enfrentar uma economia em dificuldades, ou seja, uma opção fundada nos juros altos, superávit primário e câmbio flutuante. Entrevistada pelo jornal belga “Le Soir”, dias atrás, Dilma foi enfática: "O ajuste é essencial. Não é algo que você pode ou não fazer: não há alternativa senão fazê-lo". Mas o que para a presidente parece óbvio, injunção técnica sem margem para escolhas (ela chegou a afirmar ao “Le Soir” que o ajuste “não é nem de direita, nem de esquerda, nem de centro"), está na contramão do que pensam importantes lideranças do movimento social e personalidades do mundo político e acadêmico do Brasil.
“Programas de austeridade são um poço sem fundo porque devastarão a economia, empregos e a arrecadação”, afirma o economista Joao Sicsu, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), citado em meu artigo anterior. E completa: “Existe saída para reequilibrar o orçamento. A saída são políticas voltadas para o crescimento. O resultado fiscal é sempre o reflexo da saúde de uma economia. Uma economia estagnada gera um orçamento desequilibrado. Por outro lado, uma economia forte e dinamizada produz aumento da arrecadação e o resultado é o equilíbrio fiscal”.
O que pesa – e pesará ainda mais – na consciência pública, é a fundada impressão de que o ajuste penaliza os trabalhadores, deixando fora do sacrifício proposto – total ou parcialmente – aqueles que mais possuem. E o imposto sobre grandes fortunas? E o imposto sobre polpudas heranças? E a tributação sobre os bilhões de dólares anualmente remetidos ao exterior pelas multinacionais? É claro que o governo depende do congresso para avançar num modelo tributário que inclua também a justa contribuição de ricos e milionários. Mas, a despeito desse obstáculo (de um congresso reacionário como o eleito em outubro passado) e da correlação de forças que não o favorece, o governo poderia ao menos anunciar mais claramente suas intenções.
Considerações críticas dessa ordem – e existem muitas outras, de natureza política e econômica, que o espaço não me permite examinar – não podem faltar às reflexões dos apoiadores da presidente, sob o risco de se tornarem meros adesistas. Unidade e luta como reafirmou o PCdoB, que nos últimos dias de maio realizou sua 10ª Conferência Nacional. Apenas unidade conduz ao adesismo. Somente luta, a um oposicionismo inconsequente e favorecedor objetivo do golpismo da direita.