Pra que serve o Senado?

Sempre que surge este assunto, pululam múltiplas imagens de Incitatus: enfeitados com pedras preciosas, a dormir entre mantas púrpuras, cada um com dezoito criados pessoais. Deu no Estadão deste domingo que a oposição já quer largar a CP

Motivo declarado: Represália à decisão da base aliada de rejeitar a quebra do sigilo de gastos feitos com cartões corporativos pela Presidência da República. O verdadeiro motivo? Nada há de importante para comprometer o governo. A não ser as barrigas das “bailarinas” e a desmoralizar o denuncismo da oposição e da mídia. Outro motivo: a manutenção da CPI também trará auditorias para muitas contas do governo tucano. [1]


 


Na semana passada, a manchete do Jornal do Brasil acusou o Planalto de contratar 40 bailarinas com cartões corporativos. Detalhe: a cem reais cada. Desmoralizada a barriga, o JB uma vez mais não reconheceu a irresponsabilidade. Para piorar, a Controladoria Geral da União (CGU) relacionou 11 erros grotescos, que envenenaram o noticiário sobre cartões corporativos. “Um varejão de miudezas que pendurou nas manchetes uma penca de equívocos e injustiças”, segundo o insuspeito jornalista de oposição Josias de Souza, da Folha. Roupas de cama, pagas pela Anvisa; o pagamento a clínica de estética, feito pela Polícia federal; a Agricultura contrata uma agência de matrimônio; a Marinha, compra bichos de pelúcia.


 


A Marinha também comprou bens de consumo na Beleza Cosméticos Ltda; e uma caixa de bombons; pagamentos com cartões feitos numa joalheria e outras numa lavanderia; motoboy pagando com cartão do governo. Cruz credo. Reparar o forro de uma mesa de sinuca e pagar despesa em choperia. Melhor mandar matar. Errado! Todos estes itens foram plenamente explicados e justificados pela CGU. Uso legal e legítimo dos cartões corporativo do governo – leia o link [2]. Ao que parece, a chamada “CPI das Tapiocas” arrisca os congressistas a sofrer, eles próprios, uma outra CPI, dessa vez, para investigar o teatro das comissões parlamentares de inquérito e a inutilidade de boa parte do que se divulga na mídia. [2]


 


Soberania relativa


 


Segunda-feira é dia de se percorrer páginas da Internet para checar em diferentes mídias as notícias que costumam ser efêmeras, não repercutidas. Segunda, 17, a BBC Brasil divulgou que a Anistia Internacional e a Cruz Vermelha estão denunciando o recrudescimento da violência no Iraque e a situação “desesperadora” das condições de vida, cinco anos depois da invasão dos cascos azuis do Pentágono. Hoje, somente dois em cada três iraquianos têm acesso à água potável, que é comprada com até um terço do salário familiar. Um terço dos iraquianos precisa de ajuda humanitária para viver. Pelo relatório da Anistia as condições humanitárias pós Saddan Hussein pioraram muito. [3]


 


Embora os EUA vivam a reafirmar que a segurança no Iraque esteja melhorando, a Organização Mundial da Saúde (OMS) revela 150 mil mortes até junho de 2006. Ano em que morreram 35 mil pessoas. No Iraque atuam 160 mil soldados ianques e cerca de quatro mil já morreram desde o início do conflito. Que temos com isso?


 


Analisemos três emblemáticos episódios: A invasão do Equador pelo exército colombiano, treinado e financiado pelos EUA, com a participação de mercenários israelenses. A presença de sofisticada base de informação em território da Tríplice Fronteira, no Paraguai. A visita da simpática senhora Condoleezza Rice, pregando uma “soberania relativa” para nossa região. Pense!


 


Condi, go home!


 


Não é sem razão que o Brasil lidera uma batalha diplomática na Organização dos Estados Americanos (OEA) que quer evitar manobras dos EUA para desculpar a Colômbia. Brasil e Estados Unidos, no episódio da invasão do Equador, ficaram em posições antagônicas. Lula da Silva condenou a violação da integridade regional e W. Bush apoiou aquilo que denomina de “luta contra o terrorismo”. A posição do governo brasileiro se fia em firmes e representativas posições de Caracas, Santiago e Buenos Aires. Na OEA, Washington repisará a tese da “soberania relativa” e Brasília, a inviolabilidade do artigo 21 da carta da OEA (ler o jornal argentino Página/12, de 17/3/). [4]


 


O antagonismo entre Brasília e Washington também se manifesta na acertada posição brasileira, reiterada pelo ministro Amorim que, embora reprovando a metodologia de luta, não considera as Farc uma organização terrorista, status defendido por EUA. No entanto, o Palácio do Planalto prefere que o contencioso entre Colômbia e Equador se resolva no âmbito sul-americano ou, no máximo, latino-americano. Sem ingerências estadunidense, impertinentes e indesejáveis. E Lula já avisou a Condoleezza Rice que quer criar um âmbito de solução de conflitos regional, já discutido com a Argentina, um Conselho Sul-americano de Defesa, a substituir a manjada Junta Interamericana de Defesa. EUA ficam fora.


 


Entrevista de Lula censurada pela mídia


 


Nada ficamos sabendo sobre a participação destacada do Brasil nesse processo latino-americano. Tal descompasso reflete em censura velada da nossa mídia ao brilho presidencial. Para ilustrar o ponto a que chegamos, semana passada a revista britânica, The Economist, reuniu em Brasília um grupo de jornalistas. Na pauta, o discurso e as respostas de Lula sobre favelas, a estagnação econômica no Brasil dos últimos 26 anos, mudanças na educação, o preconceito contra o projeto Bolsa Família, inclusão digital, explosão industrial e reforma tributária, entre outros assuntos de interesse nacional. Nenhuma repercussão foi dada ao fato. Porque será? [5]


 


Talvez algum ressentimento pelo fato de Lula ter mudado de tom. Altivo com as provocações de vários setores, principalmente da oposição a quem falta discurso. O Conversa Afiada [5] dá o novo tom da metamorfose presidencial: “Esses dias eu recebi aqui o ex-presidente de Portugal, Mário Soares. Ele veio, como jornalista, fazer uma entrevista para a TV Pública de Portugal. No meu gabinete, ele falou: 'Presidente, eu não estou entendendo. Eu leio a imprensa estrangeira e vejo que o Brasil está muito bem, eu converso com empresários e vejo a economia muito bem. Mas quando eu leio a imprensa brasileira (ou ouço meus amigos tucanos) eu penso que o Brasil acabou, parece que acabou o Brasil'.


 


Notas


 



[1] http://noticias.br.msn.com/brasil/artigo.aspx?cp-documentid=6518905
[2]  http://josiasdesouza.folha.blog.uol.com.br/arch2008-03-02_2008-03-08.html#2008_03-03_02_47_48-10045644-27
[3] http://noticias.br.msn.com/artigo_BBC.aspx?cp-documentid=6521438
[4] http://www.pagina12.com.ar/diario/elmundo/4-100849-2008-03-17.html
[5] http://conversa-afiada.ig.com.br/materias/481001-481500/481298/481298_1.html

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