Serra esboça política externa contrária ao interesse nacional-II

É parte do interesse nacional brasileiro e do interesse comum dos povos da América do Sul, que o Mercosul seja a base para a inserção soberana deste bloco de países num mundo crescentemente multipolar. A recente integração da Venezuela reforça essa possibilidade, formando uma vértebra geoeconômica estruturadora de um mercado comum sul-americano.

Na semana passada, um conhecido embaixador aposentado, assessor de Serra, reclamou que “desapareceu a agenda de liberalização comercial” em detrimento de “questões políticas e sociais”.

De fato, a agenda mercantilista, de simples redução de tarifas, está em baixa no bloco. A agenda para o Mercosul proposta pelo governo Lula – inversamente à agenda do período neoliberal agora retomada por Serra – busca pôr no centro o combate às assimetrias econômicas estruturais, numa agenda de integração de corte desenvolvimentista para o Mercosul.

Mas mesmo no plano das trocas mercantis, o Mercosul apresenta grande vitalidade. Como lembrou na semana passada o embaixador brasileiro em Buenos Aires, “o comércio bilateral (entre Brasil e Argentina) cresceu de US$ 7 bilhões em 2002 para quase US$ 31 bilhões em 2008 (4,5 vezes em 6 anos!)”.

Outra face da inserção brasileira e sul-americana no mundo – nas dimensões política, social e cultural, em infra-estrutura, em energia e em defesa – é a Unasul (União Sul-americana de Nações), base para a projeção geopolítica sul-americana.

Temas de política externa tornam-se temas de campanha
O segundo tema de política externa que a oposição busca tornar tema de campanha eleitoral pode ser definida na proposta formulada por Serra, no lançamento de sua candidatura, ao dizer que “vamos usar essa força (do Brasil) para defender os direitos humanos, sem vacilações”.

Um discurso, no mínimo, esquizofrênico. Os mesmos que condenaram veementemente a “não indiferença” brasileira para com o golpe em Honduras, acusando o Brasil supostamente de quebrar uma tradição diplomática de não interferência em assuntos internos são os mesmos que agora propõem interferir nos assuntos internos e soberanos de Cuba e do Irã.

O comportamento vira-lata dos grandes meios de comunicação e da oposição no caso do Irã é estarrecedor. O Brasil, busca coordenar posições com outros grandes países em desenvolvimento (BRIC, IBAS, Turquia) visando evitar um desenlace que isole o Irã e no limite, provoque uma nova guerra no heartland do mundo. Isto, no limite, pode resultar, a depender do desenlace da contenda, em pesadas pressões contra o Brasil – um dos poucos países fora do clube nuclear que domina o ciclo nuclear completo e que em nome dessa autonomia, recusa-se a assinar o chamado Protocolo Adicional do TNP.

Causa igualmente estarrecimento o fato de que alguns grupelhos de ultra-esquerda e analistas mais apressados – visando demarcar supostamente “à esquerda” com a política externa de Lula –, resolvam pôr no centro da mira fatos menores como o recém assinado acordo militar entre Brasil e EUA.

Por certo, acordos no terreno militar com a grande potência imperialista nunca são positivos, mas não justifica, quer por razões táticas ou por razões estratégicas, por no centro do alvo um acordo minimalista, que evidentemente não envolve bases nem tropas – como o lesivo acordo firmado pela Colômbia – e tem as características de um acordo padrão – “acordo-quadro” no jargão diplomático – como os que temos com outros 29 países, como informa o Itamaraty. No momento em que o Brasil está no alvo do imperialismo e de seu aparato ideológico mundial pelo papel altivo na crise do Irã, são posturas inaceitáveis, típicas de quem não enxerga um palmo diante do nariz.

É alta a confiança do povo brasileiro no governo do presidente Lula, comprometido com a segurança e a soberania da nação. Portanto, às forças nacionalistas, de esquerda e democráticas não cabem vacilações ou demarcações sectárias.

O que está em jogo são condições mais ou menos favoráveis à realização do potencial brasileiro, de nosso novo projeto nacional de desenvolvimento.

O retorno das forças políticas e sociais agrupadas em torno da candidatura de Serra ao comando do Estado brasileiro representará retrocesso em toda linha na política externa conduzindo, numa palavra, ao apequenamento do Brasil, em relação às suas possibilidades de tornar-se uma potência progressista e democrática no mundo, jogando seu peso, isto sim, a favor de uma nova ordem mundial – cujos germes podem ser encontrados nas declarações dos BRICs e do IBAS, nas Cúpulas recém realizadas em Brasília.

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