A empáfia de Moro no Senado
Diante da balbúrdia que se instalou no Ministério da Justiça e Segurança Pública com as denúncias contra o ministro Sérgio […]
Publicado 19/06/2019 18:24
Diante da balbúrdia que se instalou no Ministério da Justiça e Segurança Pública com as denúncias contra o ministro Sérgio Moro, nada mais natural, para esclarecer tudo, do que uma confrontação das versões com os fatos. Não foi o que aconteceu na audiência da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado nesta quarta-feira (19). Moro prometeu dar “esclarecimentos”, mas o que se viu foi um desfile de exibicionismo senatorial dos governistas, que sopraram fogo nas práticas abusivas da Operação Lava Jato servindo-se do proverbial proselitismo do ex-juiz.
Apesar da ação da oposição, não foi, nem de longe, um encontro para estudar a fundo a questão, propor investigação e sugerir meios para melhorar o combate à corrupção. Mas também não foi um balde de água fria nas labaredas do caso. É preciso prosseguir com a exigência de que tudo seja rigorosamente apurado. Não se pode ignorar a gravidade das práticas, agora mais à vista, dos que atentaram contra a Constituição e os interesses nacional e popular.
Como têm se pronunciado os setores que vocalizam a primazia do direito constitucional e os interesses da nação — por conseguinte da democracia —, todas as atitudes no âmbito dos Poderes da República devem obedecer a esses preceitos, rigorosamente. Com base neles, é possível interpretar fatos e indicar, com propriedade, o que realmente existe nos argumentos contra e a favor das graves denúncias envolvendo o ministro e a polêmica Operação Lava Jato. Estão corretas as posições da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), assim como de partidos de oposição, que propõem o imediato afastamento de Moro.
As denúncias que vieram à tona deram ensejo a debates acalorados, como é legítimo e saudável, mas esse calor deve evoluir para ações mais concretas. Se há denúncias, é preciso investigá-las com rigor, uma mobilização cívica compatível com a regulação institucional do país. O que não está de acordo com essa premissa da legalidade democrática, como mostra a indignação social manifestada pelos setores que zelam pelos princípios do Estado Democrático de Direito, é a tentativa de justificar atitudes flagrantemente ilegais, arbitrárias.
A gravidade das denúncias cobra atitudes assim porque elas atingem os pilares da República. Está se falando do centro dos Poderes constituídos da nação — o respeito à Constituição —, aviltado pelas denúncias surgidas sobre os conhecidos desmandos do ex-juiz, em conluio com os procuradores da Operação Lava Jato. Não é aceitável, numa República democrática, que o rompimento, pelo então juiz, com a lógica da sua função para favorecer determinados interesses não seja severamente investigado.
Além das denúncias recentes, são conhecidas as práticas de arbítrios de Moro — muitas explícitas, outras disfarçadas com vazamentos para segunda, terceira e quarta intenções —, como acusações, suspeitas e indícios divulgadas como se fossem provas de culpabilidade sem que a pessoa envolvida consiga ser ouvida no devido processo legal, com amplo direito de defesa, como determina a Constituição. Dizer que esse é o único método de combate à corrupção é um argumento revestido de espetacular hipocrisia.
A corrupção — assim como qualquer crime ou ilícito — deve ser punida com o máximo rigor. Para esse fim, um país civilizado precisa de uma legislação eficiente, premissa que o Brasil erigiu, dando instrumentos legais para punir e coibir ilegalidades de toda ordem. Sem a observância desses princípios, prevalece o oportunismo, as manobras espúrias e as afrontas aos interesses do povo e da nação. É o que se tem visto nesse espectro da Operação Lava Jato, constituído como palco para encenação de interesses escusos.
Isso decorre da lógica de que o Brasil não entrou nessa crise por acaso. É um projeto de poder, um processo político e ideológico. O recurso do vazamento pela Operação Lava Jato, como se sabe, foi utilizado de maneira quase sistemática — e seus autores normalmente expostos como heróis. O pior é que, depois da “operação vazamento”, o que se ofereceu ao público foi uma história de que havia um candidato capaz de restaurar os bons costumes. Aí veio o bolsonarismo.