A queda de Eduardo Cunha e o golpe contra a democracia

A Procuradoria Geral da República (PGR) usou uma palavra forte no pedido feito ao Supremo Tribunal Federal que levou ao afastamento de Eduardo Cunha do mandato de deputado federal e da presidência da Câmara dos Deputados.

Delinquente, esta foi a palavra usada para definir o presidente da Câmara. Ela significa “criminoso” e foi acolhida na decisão do ministro Teori Zavascki na Ação Cautelar 4.070, que afastou Eduardo Cunha de suas funções, decisão confirmada na tarde de quinta-feira (5), pela unanimidade dos onze ministros do STF.

Cunha é o principal mentor do golpe contra Dilma Rousseff, movido por vingança, por não ter recebido apoio do governo para barrar o processo contra ele no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados. E também réu em onze processos no STF, nos quais é acusado de corrupção e de uso de seu mandato em benefício pessoal ou de pessoas próximas a ele.

A decisão do STF, de suspender o mandato de Eduardo Cunha, foi apoiada por governistas e também pela oposição – até porque, de certa maneira, o afastamento de Eduardo Cunha ajudaria a “limpar” o golpe.

A oposição foi hipócrita ao comemorar a decisão do STF – foi aliada de Cunha em todas as medidas tomadas sob seu comando (as pautas “bomba”, por exemplo) que paralisaram o governo e aprofundaram a crise econômica; apoiou o acatamento, por ele, do pedido de impeachment, em dezembro passado, e é seu aliado até agora.

Cunha é um dos comandantes do golpe, aliado de primeira hora do impostor Michel Temer, lembra a deputada Jandira Feghalli (PCdoB-RJ). É junto com ele que Temer, monta o governo repudiado pelo povo, ilegal e ilegítimo, que poderá surgir do golpe, que não ficará “limpo” depois do seu afastamento.

Mas talvez a consequência maior pode ocorrer na luta contra o golpe midiático-judicial em curso. Pode reforçar a percepção de ilegalidade e ilegitimidade do impeachment, como logo notou o deputado federal comunista Chico Lopes (CE), para quem a queda de Cunha pode gerar uma reviravolta contra o golpe.

As irregularidades e ilegalidades da ação de Eduardo Cunha contaminam decisões tomadas na Câmara sob seu comando, sobretudo o acatamento do pedido de impeachment, e a vexatória sessão do dia 17 de abril, que aprovou a abertura do processo golpista. Esse homem, que tão descaradamente abusa do poder, foi quem encaminhou o impeachment!

Há fortes denúncias de coação e intimidação de deputados no Dia da Infâmia, e agora podem fundamentar o pedido de anulação daquela sessão, pensa o deputado Chico Lopes. A decisão do ministro Teori confirma, disse ele, “que uma votação de impeachment sem crime de responsabilidade não poderia ter sido colocada em pauta. Muito menos conduzida por Eduardo Cunha".

De modo semelhante pensa o Advogado Geral da União, José Eduardo Cardozo, que vai basear naquela decisão do STF o pedido para anular o impeachment de Dilma Rousseff. E vai recorrer ao STF alegando que “Eduardo Cunha agia em desvio de poder".

É certo que decisão de Teori Zavascki terá impacto na conjuntura e no processo golpista. São resultados que ainda não se podem prever. Podem reforçar o processo golpista ao retirar da linha sucessória este político réu de graves acusações. Pode reforçar, também, a resistência democrática ao permitir o questionamento da legalidade e da legitimidade de decisões tomadas sob o comando daquele que a PGR classificou como “delinquente”.

Uma consequência visível da decisão do ministro Teori Zavascki deve ser registrada, contudo – assim como Eduardo Cunha, aqueles que formam o comando golpista, e que são alvo de acusações judiciais poderão, a partir de agora, sofrer decisões semelhantes à tomada hoje no STF.