Daniel Dantas no banco dos réus

Os cidadãos que ainda se dão ao trabalho de acompanhar as peripécias do Caso Satiagraha vão se convencendo de que […]

Os cidadãos que ainda se dão ao trabalho de acompanhar as peripécias do Caso Satiagraha vão se convencendo de que há ali algo de cada vez mais podre e malcheiroso.  A julgar pela opinião publicada, o delegado Protógenes Queiroz, que deflagrou aquela operação da Polícia Federal, tornou-se agora o vilão. Enquanto o banqueiro Daniel Dantas passou de acusado a vítima.


 


O caso volta à baila na semana em que Dantas será julgado por um crime – tentativa de suborno – em que foi pilhado em flagrante: o episódio foi gravado pela PF. E será julgado pelo juiz Fausto Martin De Sanctis, da 6ª Vara Federal de São Paulo. Uma tentativa de afastar o juiz naufragou nesta segunda-feira no Tribunal Regional Federal da 3ª Região.


 


De Sanctis tornou-se conhecido em julho, por decretar, por duas vezes, a prisão do dono do banco Opportunity. Primeiro por corrupção, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, sonegação fiscal e formação de quadrilha. E em seguida pela tentativa de suborno, que será julgada nesta quarta-feira (19).


 


O banqueiro chegou a passar algumas horas preso, em 8 de julho, antes de beneficiar-se com dois fulminantes habeas corpus concedidos pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes. Este mês o Supremo respaldou a decisão de Mendes, por nove votos a um. Os ministros acusaram De Sanctis de autoritário, insubordinado, desequilibrado e insolente.


 


Do Supremo à mídia dominante e à bancada tucano-demista na CPI dos Grampos, sobem os gritos de ''pega ladrão!'', imitando a fábula. O caso se inflama e infecciona, carregado de toxinas.


 


Conceda-se ao dono do Opportunity o tratamento-padrão democrático de que todos são inocentes até o devido julgamento em contrário. Admita-se que a condenação de Dantas pela opinião popular vem menos de um conhecimento circunstanciado das acusações que pesam sobre ele (em grande medida escamoteadas ao público) e mais da impopularíssima condição de banqueiro. Aceite-se que agentes da PF possam ter exorbitado das funções que deles se espera na nova condição republicana atribuida ao órgão após 2003.


 


Ainda assim o odor pestilento invade as narinas e impregna a suspeita alimentada por incontáveis antecedentes: Dantas pode se safar. Ainda que De Sanctis não vergue; ainda que tenha a solidariedade explícita de centenas de outros juizes; ainda que conte a patente simpatia dos brasileiros (que, curiosamente, nenhum instituto de pesquisa se interessou em medir). Pode se safar porque o sistema é assim, feito para punir ladrões de galinha, jamais banqueiros. Crime de rico a lei encobre.


 


Vistas as coisas pela ótica da esperança, já será inusitado que Daniel Dantas, com tantos e tão poderosos padrinhos, esteja quarta-feira no banco dos réus. A esperança é assim teimosa: graças a ela o ceticismo mil vezes confirmado não se desnatura em cinismo estéril e embrutecedor.