Irã: uma saia justa para o imperialismo

Quando o presidente iraniano, Mahmud Ahmadinejad, disse, em 20 de fevereiro, ser “justo se aqueles que querem conversar conosco também parassem suas atividades”, ele tocou num nervo exposto da diplomacia do imperialismo: a igualdade de condições entre nações soberanas. Ele expôs, com essa condição, aquele que é o ponto central da disputa entre as potências ocidentais, com os EUA à frente, e seu país: o direito de uma nação desenvolver a tecnologia necessária para seu próprio desenvolvimento e para sua afirmação como nação soberana e independente.


 


Ahmadinejad reagiu, daquela forma, às exigências ocidentais para que o Irã suspendesse seu próprio programa de enriquecimento de urânio. E o fez às vésperas do vencimento do prazo dado pelo Conselho de Segurança da ONU para que seu país suspendesse as pesquisas e aceitasse as imposições do imperialismo para a vigilância e controle das pesquisas nucleares no Irã. A data fatal era o dia 21 de fevereiro, fim do prazo dado pela resolução 1737, aprovada pela ONU em 23 de dezembro de 2006.


 


O prazo foi vencido e o governo do Irã persistiu na defesa de sua soberania, deixando os EUA e as potências ocidentais em uma saia justa, que vai desde as pressões para que o Irã aceite negociar a redução de seu programa nuclear, até as ameaças, abertas ou veladas, de um ataque militar norte-americano contra o país dos aiatolás.


 


O governo dos EUA parece encontrar-se em um beco de saída difícil. Na sexta-feira, a secretária de Estado americana, Condoleezza Rice, assegurou que Bush persistia no propósito de encontrar uma saída negociada para a crise que, alias, ele próprio criou ao ameaçar o Irã e incluí-lo na lista dos países que fazem parte do “eixo do mal”. “Deixamos muito claro”, disse ela, “que estamos no caminho diplomático e que pode ter êxito se a comunidade internacional se mantiver unida em confrontar o Irã”.


 


Não é uma posição confortável, embora pareça a possível. O Irã, esbravejam os norte-americanos, podem ser alvos da guerra de 2007. Mas não é uma tarefa fácil. Cálculos de analistas norte-americanos mostram que um ataque contra o país exigiria um esforço monumental, com milhares de vôos e o lançamento de mísseis durante semanas, sem a garantia de eliminar o programa nuclear iraniano. Os serviços de inteligência dos EUA simplesmente não sabem onde está localizada a imensa maioria das instalações nucleares iranianas. Eles têm informações seguras sobre 18 instalações, mas existem pelo menos 70 delas dispersas pelo Irã.


 


Além disso, tudo indica que as bombas “arrasa-bunker” dos EUA não conseguiriam penetrar até a profundidade onde estão enterrados os locais blindados.


 


Por isso os muitos analistas duvidam que haverá um ataque militar norte-americano contra o Irã. Mesmo porque os EUA já estão envolvidos em duas guerras difíceis, no Afeganistão e no Iraque, além de haver pouco apoio internacional para um ataque destas dimensões.


 


No outro lado da disputa, o Irã manifesta baixa propensão a acatar as pressões ocidentais, comandadas pelos EUA. Como disse Ahmadinejad, no dia 23, seu país vai resistir à pressão mundial e manter o programa nuclear. “Se mostrarmos fraqueza frente ao inimigo, as expectativas vão aumentar, mas se nos erguermos contra eles, por causa dessa resistência eles vão recuar”, disse ele. E o ex-presidente Akbar Hashemi Rafsanjani, um moderado, disse que o Ocidente “não vai conseguir resultados desse jeito [com sanções]”. “Só vão criar problemas para si, para o mundo e especialmente para nossa região”.


 


E o Irã mostra músculos para resistir: no mesmo dia 23, o país inaugurou a fabricação de modernos navios de guerra capazes de transportar helicópteros e lançar mísseis mar-mar e mar-terra, demonstrando uma capacidade bélica que pode constranger a agressividade imperialista, particularmente dos EUA.


 


Apesar disso, existem aqueles que temem a repetição, no Oriente Médio, da mesma atuação dos EUA no Vietnã: às vésperas de deixar o cenário daquela guerra, os EUA – como que para demonstrar força – atacaram maciçamente países vizinhos, como o Camboja, acusados – como no caso do Irã – de proteger os guerrilheiros vietcongs. No caso atual, o Irã seria apresentado como culpado de proteger a resistência iraquiana contra a ocupação norte-americana. O governo britânico, por exemplo, teme que o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, mande atacar o Irã antes do fim de seu mandato. “Bush não quer deixar a questão para o sucessor”, disse uma fonte ouvida pelo jornal The Times.


 


É um cenário de agravamento da crise internacional e de dificuldade para o imperialismo: o Irã não é o Iraque, e um ataque contra o país poderá ter conseqüências de difícil previsão. Mesmo porque se trata de uma potência regional com considerável poder de fogo, que pode ser usado em defesa de sua independência e também em ataques contra as capitais européias que estão no raio de alcance de seus mísseis. Resta saber, nestas condições, qual será a aposta belicista de Bush contra uma nação cujo delito, para o imperialismo, é defender sua soberania.