O BNDES e a caixa-preta do Banco Central

O novo presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano, tomou posse na terça-feira (16) afirmando […]

O novo presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano, tomou posse na terça-feira (16) afirmando que a sua prioridade é explicar a chamada "caixa-preta" na instituição. O termo é uma mera ilustração da fantasia ideológica do presidente Jair Bolsonaro, a obsessão pelo que ele define como “financiamento a países comunistas” — uma quimera desmentida até pelo primeiro presidente bolsonarista do BNDES, Joaquim Levy.

Na verdade, trata-se de uma cortina de fumaça que tenta ocultar a gravidade das prioridades que desmontam o banco tal como ele foi concebido e fundado em 1952, no segundo governo do presidente Getúlio Vargas. O preposto de Bolsonaro anunciou a venda de ativos do BNDES no valor cerca de R$ 110 bilhões, além da devolução de R$ 126 bilhões neste ano ao Tesouro, dinheiro que deveria ser investido no fomento da economia e que será transferido para a engrenagem que move a ciranda de pagamento dos juros financeiros.

Montezano também prometeu transformar o BNDES em banco de serviços para que ele possa ter “sustentabilidade financeira, e não o lucro”. O que isso quer dizer, ainda é uma caixa-preta — para usar o termo preferido de Bolsonaro. Aliás, essa definição fica melhor compreendida com o resgate da sua origem. O termo foi cunhado pelo ex-presidente Itamar Franco ao se referir ao Banco Central (BC). Como presidente da República, ele teria telefonado para a instituição perguntando o valor das reservas em dólar do governo e ouviu que o dado era sigiloso.

Em 2004, Itamar Franco, à época embaixador do Brasil em Roma (Itália), voltou ao assunto para dizer que o BC continuava o mesmo. “Foi e ainda é uma caixa-preta", disse ele. Na verdade, o ex-presidente denunciava o que hoje volta com força — a política monetária contracionista que tem como um dos seus propósitos submeter o BNDES ao seu ditame. Ou, dito de outra, arrocha os investimentos públicos em infraestrutura e nas áreas sociais para estabilizar o pagamento dos juros no cassino neoliberal gerenciado pelo BC.

Um dos alvos dessa ditadura monetarista sempre foi a Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) do BNDES, considerada um mecanismo de “subsídio” para os juros dos empréstimos do banco. Esse objetivo foi de certa forma atingido com a troca da TJLP pela Taxa de Longo Prazo (TLP) em 2017, o primeiro tiro de grosso calibre na instituição — além da transferência de R$ 339 bilhões para o Tesouro desde 2015.

O ataque ao BNDES segue o programa de governo de Bolsonaro, que tem no Ministério da Economia, comandado pelo banqueiro Paulo Guedes, um dos seus principais sustentáculos. Ele faz parte da política de privatizações selvagens, um processo de desmonte do Estado desenvolvimentista fomentado com base nas empresas estatais estratégicas para a economia nacional. Aliás, é o caso de recordar que na “era” neoliberal, nos anos 1990, o BNDES funcionou como mero comitê de administração das privatizações.

É importante notar que toda essa onda bolsonarista, com mais pontos de exclamação do que argumentos, tem como meta a autonomia do BC, uma obsessão neoliberal. De mãos livres, sua política monetária poderá se impor sobre qualquer obstáculo. A principal vítima é a ideia de um projeto nacional de desenvolvimento, no qual o Estado teria papel protagonista como agente indutor da abertura de um novo ciclo de crescimento. E, consequentemente, o futuro do Brasil e dos brasileiros.