Violência contra a mulher: basta!

O termo "Violência contra a Mulher", introduzido pela ONU em 1993, inclui muitos tipos de agressões, que vão além de físicas, sexuais ou psicológicas. Ela se manifesta de forma múltipla na sociedade patriarcal. Não é apenas a violência física ou verbal, facilmente constatáveis – há também outras formas, como a desigualdade no trabalho (condições ruins, jornadas extensas e salários menores do que os dos homens) e a baixa representação política. E outras mais sutis que, nem por isso, deixam de ser violentas. Elas fazem parte deste cenário de desigualdade de gênero que vitima as mulheres.

O Escritório do Alto Comissariado da ONU para os Direitos Humanos divulgou nesta segunda feira – 25 de novembro, Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra as Mulheres – um documento onde exige que o ato sexual sem consentimento seja tido como um padrão para determinar a violação – o estupro, numa palavra mais clara.

Segundo o documento da ONU, a persistente violação e a violência sexual generalizada e sistemática contra mulheres e meninas é "profundamente enraizadas em nossas sociedades predominantemente patriarcais", onde o ambiente social admite como normal essa violência, que vem de cambulhada com estereótipos sobre os diferentes papeis de gênero, que desvalorizam a mulher.

A declaração agora divulgada orienta os governos a eliminarem a brecha existente entre as leis nacionais e internacionais sobre estupro e a revisar códigos legais para criminalizar de maneira clara a violação e a violência sexual, mesmo dentro do casamento. O documento da ONU mexe numa ferida pouco falada deste aspecto da violência contra a mulher – a que ocorre entre casais, e por isso é encarada por muitos como normal ou natural.

A extensão da violência é revelada por outro documento da ONU cujos dados são alarmantes: uma em cada três mulheres no mundo sofre violência física ou sexual. Como constatou o Relatório Anual das Nações Unidas 2017-2018, as mulheres são vítimas de uma rede de desigualdades que as colocam na pior situação em relação assistência e proteção social. Além das lacunas que existem na educação, renda e acesso a serviços, agravados pela cor da pele, orientação sexual e localização geográfica.

As agressões às mulheres estão espalhadas pelo mundo – se são mais acentuadas nos países pobres da Ásia, Oceania, África e América Latina, não estão ausentes dos países ricos. A ONU mostra que uma em cada dez mulheres na União Europeia declara ter sofrido assediada pela internet desde os 15 anos de idade, sendo alvo de e-mails ou mensagens SMS indesejados, sexualmente explícitos e ofensivos ou outros ataques semelhantes nas redes sociais. Outro estudo, feito em 27 universidades nos Estados Unidos, mostrou que 23% das estudantes universitárias são vítimas de agressão ou má conduta sexual.

Isso para não falar do criminoso tráfico de seres humanos, que é mais uma forma de violência aguda. Segundo a ONU, 71% de suas vítimas em todo o mundo são mulheres e meninas.

Mas a violência nem sempre está tão longe. Dados da ONU mostram que, em 2017, uma em cada duas mulheres (a metade!) assassinadas, o criminoso foi seu parceiro sentimental ou um membro da família.

Mesmo na desenvolvida Alemanha houve, em 2018, 144 mil casos de agressões e ameaças cometidos por parceiros ou ex-parceiros, e a imensa maioria das vítimas eram mulheres: 81%. Os dados foram apresentados pela Ministra da Mulher, Franziska Giffey. As estatísticas criminais mostram que, em 2018, 122 mulheres foram mortas naquele país por parceiros ou ex-parceiros.

No Brasil, em 2018, houve 180 estupros por dia – um a cada sete minutos! -, o maior número desde 2009. Uma visão geral mostra um caso de agressão contra a mulher a cada quatro minutos. Em 2018, apesar da redução no número de homicídios, os feminicídios cresceram 4% resultando em 1.173 mulheres assassinadas. Foram mais de três por dia. Ocorreram ainda, no ano passado, mais de 66 mil casos de violência sexual. A maioria das vítimas eram mulheres negras e menores de 14 anos de idade: 63,8% delas. Em relação à cor da pele, 50,9% eram negras e 48,5%, brancas, revelando um trágico equilíbrio (quase meio a meio) entre as vítimas da selvageria de gênero de pele escura ou mais clara. Para variar, 75,9% dos agressores eram conhecidos das vítimas. E há outra certeza que os dados mostram: temendo represálias apenas 7,5% das vítimas de violência sexual denunciaram o crime à polícia. Os dados fazem parte do 13º Anuário de Segurança Pública, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Sai ano, entra ano, as estatísticas e outros relatos retratam semelhante situação de barbárie. A resistência contra essa situação tem mobilizado mulheres e homens conscientes dessa falta de civilidade que repete, em pleno século XXI, comportamentos incivilizados. Mas não dá para esperar uma mudança mais profunda, aquela que poderá garantir a igualdade entre todos os seres humanos. É preciso dar um basta e lutar todos os dias contra o patriarcalismo predatório que comete tantas barbaridades.