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Brasigóis Felício: A feira do povo

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No sertão nordestinado
a feira do povo
é uma economia de centavos


 


São ovos ambicionados
de um viver sextavado


 


Um real é dinheiro digno
de consideração e apreço


 


Galinha do pé seco
não dá pra quem quer


 


Zé da buchada quer enricar
só de as destripar


 


Mais velha que as penosas
só a perpétua necessidade


 


Manga e mamacadela
fazem lama de derrama


 


Quem vendeu umbu a beça
agradece a Deus, alegroso,
com um sorriso banguelo


 


Pitomba e melancia
entram em promoção
depois que se desmancham:


 


“Comprem de mim,
que minha minhas irmãs estão buchudas,
e minha mãe vai parir!”


 


O chão é azinabrado pelo sangue
de animais estripados
à vista do freguês


 


Que é para ele ver
o quanto é duro morrer


 


Cabeças de bode,
de porcos e vacas nos fitam
com olhar esbugalhado


 


 


 


Na feira do povo
muitos têm que morrer
para sustentar a fome eterna
dos que só vivem para comer


 


A freguesia vem do agreste
onde só vive cabra da peste
calcinado na caatinga
onde a vida é bem mofina


 


Da vida ávida por viver
é feita a feira do povo:


 


O desespero é gritado
no rebanho de condenados
do sertão nordestinado.