Conversas entre Jucá e Machado enfatizam papel de Temer no complô

Na semana passada, a comissão de impeachment no Senado negou a inclusão da conversa gravada de Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, com senador Romero Jucá (PMDB-RR), na defesa da presidenta Dilma Rousseff. O áudio mais completo disponível na internet tem nove minutos de duração.

Por Marcelo Zelic*, no Viomundo

Senador golpista: Jucá e o histórico de pendências judiciais - boavistaagora.com.br

Por curiosidade, resolvemos confrontá-lo com a transcrição publicada pela Folha de S. Paulo, em 23 de maio de 2016, e com outras que circulam pela mídia.

Depois de ouvir várias vezes, notamos que alguns trechos considerados inaudíveis podem ser compreendidos.

Por cautela, limpamos um pouco os ruídos. Escutamos mais várias vezes, com fone e sem fone de ouvido, em diferentes níveis de volume.

Conclusão: há, de fato, algumas omissões e incongruências em relação ao que foi veiculado. As falas pintadas em amarelo não constam das transcrições publicadas. Ao final deste post, a íntegra de ambas.

Logo no começo, o primeiro trecho que não aparece na transcrição publicada é a afirmação de Sérgio Machado de que não sabe se a Queiroz Galvão irá refazer sua delação, o que lhe seria péssimo, segundo o próprio. O “Queiroz” é omitido. Em relação à Camargo Corrêa, ele diz que ela “vai fazer de novo (delação)” em vez de “vai fazer ou não”, como foi publicado.

Diante disso, por que uma nova delação da Queiroz seria péssima para Machado?

Ao dizer “e, aí, amigo, eu vou falar de mim…”, ele estava ameaçando Jucá e os demais poderosos do PMDB?

Imediatamente, reagindo à situação descrita, Jucá questiona Machado sobre a situação. Aí, em meio a falas superpostas, Jucá, depois de concordar com Machado de que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, não vale um “cybazol” (cibalena, remédio antigo para dor de cabeça), solta uma frase que não aparece nas transcrições divulgadas: “o governo vai te segurar”.




Aqui, é importante lembrar que a conversa entre os dois peemedebistas ocorreu em março de 2016.

Àquela altura dos acontecimentos e no contexto da conversa, “o governo vai te segurar” não se refere ao de Dilma Rousseff, mas, sim, ao que os golpistas buscavam instalar no país.

As forças golpistas capitaneadas pelo presidente da Câmara, o deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), na Câmara, e por Jucá no Senado, já articulavam às claras a derrubada de Dilma e a sua substituição pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB-SP).

A fala de Jucá – “o governo vai te segurar” – reforça a denúncia sobre uma conversa do deputado federal Cabuçu Borges (PMDB-AP), vazada no domingo, 17 de abril, antes da votação do impeachment.

Pelo Whatsapp, Cabuçu revela a um interlocutor não identificado a suposta promessa de Temer (que ele identifica como T) de parar a Lava Jato se o impeachment de Dilma fosse aprovado pelo Congresso.

Diante da dúvida do interlocutor, Cabuçu diz: “[ele] me botou na linha os ‘chefes do MP e Judiciário e confirmaram’; “Confirmaram q param tudo se votarmos com Cunha”.

Cabuçu não negou a autenticidade da conversa. Nem ela foi desmentida posteriormente.

Aparentemente, Cabuçu termina a conversa com o tal interlocutor sem estar convencido de que a estratégia de Cunha, Temer & cia dará certo.

Sérgio Machado também tem dúvidas sobre uma solução jurídica para o seu caso e pressiona Jucá por uma saída política.





Após esse diálogo segue-se um longo silêncio.

Jucá retoma, perguntando a Sérgio Machado se conversou com o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado.

Após manifestar sua confiança em Jucá em resolver a situação, Machado diz que quer conversar com o ex-presidente José Sarney e o “vice”.

Naquele contexto, tudo indica que se referisse ao então vice-presidente Michel Temer. Porém, pelo que foi divulgado, ficou parecendo que Machado queria um encontro apenas com Sarney e Renan.


Portanto, os “esses três” apontados por Jucá em frase não divulgada na íntegra são: Renan, Sarney e provavelmente Temer.

Machado faz uma cobrança: que esses “encontrem uma saída” para a situação.

A conversa torna-se dramática com a exposição da suposta estratégia de Janot de enviar o processo de Sérgio Machado para o juiz Sérgio Moro, em Curitiba (PR). Descer é confessar, é fazer a delação.

Para começar, num trecho incompreensível, Temer pode ter sido citado por Machado. Ficou essa dúvida na transcrição do áudio tratado, por isso está pintada de laranja.

Pela transcrição incompleta do áudio, fica omitida também a atuação de Jucá: “Eu converso com o Renan, converso com o Sarney, ouço a eles e vamos sentar pra gente…”

Jucá diz ainda que “precisará ver também as suas coisas”.


Na conversa, Juca e Machado reafirmam um acordo. Na transcrição divulgada, é omitida uma fala crucial de Jucá: “É o acordo, botar o Michel”.

Fica claro que Romero Jucá não apenas opina que a única saída política é trocar o governo.

Jucá atuava para isso e ali, na conversa com Machado, ele estava ali articulando uma ação política, como afirmou no começo da conversa. Um conluio para depor a presidenta Dilma.

Diante dessas incongruências, cabe ao ministro Teori Zavascki e ao procurador-geral Rodrigo Janot a divulgação da íntegra dos áudios e das degravações das fitas de Sérgio Machado, livres de erros de transcrição ou omissões.

É vital que a sociedade conheça, diretamente da fonte, o inteiro teor dessas conversas nada republicanas. Se ainda existe justiça neste país, os áudios não podem ficar de fora do processo de defesa da presidenta Dilma Rousseff.