A potência política do experimentalismo latino contemporâneo

Luiz Felipe Leprevost é poeta, ator, escritor, dramaturgo e ainda canta e às vezes dança. Mas além de tudo isso, provoca quem entra em contato com sua obra. E não provoca pouco. Impulsionada por esta provocação, conversamos sobre o que esta geração de jovens escritores está fazendo e sobre como podemos “classificar” a literatura contemporânea latino-americana, se é que precisa ser classificada.

Por Mariana Serafini

Luiz Felipe Leprevost por Olavo Costa - Olavo Costa

Para Leprevost, é como se os jovens escritores estivessem “usando” tudo que este continente já produziu de uma forma “experimental e divertida”. Somos herdeiros do realismo mágico, e depois, de uma onda “realista” que não deu margem para os jogos psicológicos da geração anterior. Somando tudo isso, o que surge agora é uma turma disposta a experimentar e criar algo novo, não do zero, mas totalmente diferente.

A América Latina é marcada por episódios políticos que impactaram diretamente nossa produção artística, não só a literatura, mas a música, o cinema, as artes plásticas. É como se não tivéssemos o direito de “escapar” do discurso político. E hoje, Leprevost acredita que esta veia política esteja, antes de tudo, na forma. “O [Alejandro] Zambra, por exemplo, fica o tempo inteiro fazendo experimentos, e a política está nisso também. Em toda a obra de grandes pessoas na América Latina é por aí que entra a política, também pelo jeito que você conta, o jeito que você monta a coisa; o que não está dito no livro às s vezes é mais importante do que está dito”.

“Estou relendo bastante o Cortázar, o livro Um tal Lucas, e é lindo, e extremamente político. Fica muito claro por meio da alegoria, ou por meio do ‘no sense’, que é possível falar fortemente de política fazendo essas analogias, ou seja, dizer da coisa sem dizer”.

O próprio Leprevost é assim, seus livros são marcados por muito experimentalismo. Ele transita com leveza e intensidade pela prosa e pela poesia, assim como pela música e pelo teatro. Acabou de lançar “Tudo urge no meu estar tranquilo”, um livro de poemas. Ao mesmo tempo que está no palco, com a companhia Armazém, encenando Hamlet.

Antes disso, o curitibano que largou as manhãs de céu azul e jardins cobertos de geada para viver no ensolarado Rio de Janeiro, fez do frio, do cinza e do clima bucólico do Sul seu objeto de “estudo” à exaustão. Ele é autor de Ode Mundana (2006), Inverno dentro dos tímpanos (2008), Barras antipânico e barrinha de cereal (2009), Manual de putz sem pesares (2011), E se contorce igual a um dragãozinho ferido (2011) e Salvar os Pássaros (2013).

Sua última obra, ele vê como “uma resposta natural do corpo” como se a poesia fosse uma “resposta imediata, intuitiva e urgente” à sua necessidade de literatura e a forma, além do conteúdo, é também uma mensagem política.

A não integração latino-americana

Recentemente Leprevost participou do Mundial Poético de Montevideo, um festival que reúne poetas de todo o mundo e, principalmente, da América Latina. Em meio à efervescência da produção local, ele se sentiu como “um primo distante”, porque os autores de língua hispânica “se entendiam”, não só pelo idioma, mas por estarem de fato mais próximos uns dos outros no sentido de acompanhar o que está sendo produzido agora.


Juan Pablo Villalobos por Olavo Costa 
 

“Existe um distanciamento, mas tem também um acolhimento incrível, com um interesse grande pelo Brasil. Senti como se nosso grupo fosse especial, os brasileiros eram muito queridos, com uma presença muito iluminada”.

Em contato com estes escritores da mesma geração, Leprevost percebeu que mesmo “distantes”, há características comuns e o experimentalismo, sem dúvida, é uma delas.

Nos autores contemporâneos que ele tem lido também percebe esta marca. “Festa no Covil [do mexicano Juan Pablo Villalobos] por exemplo, é super experimental”. Fora isso, Leprevost indica uma série de livros contemporâneos interessantes, romances e poesias, que dão conta de “narrar” o que está acontecendo agora no continente. “’Continuação de ideias diversas’, do Cesar Aira, em que ele vai escrevendo algumas crônicas e pequenas filosofias; é um livro muito bonito. Eu li também ‘O Homem mais Portátil do Mundo’, um livro de ensaios curtos muito poéticos e belos do Arturo Carrera. ‘Inocência’ do Carrera também, são poemas onde ele trabalha a memória da infância”.