O governo do PSDB em São Paulo e os problemas na mobilidade urbana

A mobilidade urbana é um dos problemas mais sérios nas grandes cidades, sejam as capitais ou cidades de regiões metropolitanas. Sem altos investimentos e uma política de integração e visão compartilhada do transporte coletivo, não há perspectiva de melhora a curto prazo. No Brasil, a maior responsabilidade sobre o transporte coletivo de massa é dos governos estaduais.

Por Alcides Amazonas*

mobilidade urbana SP

Em São Paulo, os 24 anos de governo do PSDB não trouxeram melhorias nesse setor. Ao contrário, acumulam-se promessas não cumpridas e escândalos envolvendo projetos de mobilidade urbana. Na capital, a cada ano aumenta o tempo que as pessoas ficam no trânsito em seu deslocamento diário de casa para o trabalho ou para a escola. Se esse é um problema sério para o conjunto dos moradores da capital, é bastante ampliado quando se trata dos moradores da periferia.

Por ano, o paulistano passa, em média, o equivalente a um mês e meio parado no trânsito. O tempo gasto diariamente para fazer a totalidade de seus deslocamentos aumentou 20 minutos entre 2015 e 2016. Em 2015, os moradores da capital gastavam 2h38 em congestionamentos, tempo que passou para 2h58 em 2016. O número faz parte de uma pesquisa do Ibope, encomendada pela Rede Nossa São Paulo. Para calcular os índices, o instituto analisou a percepção do paulistano sobre mobilidade.

A Pesquisa Sobre Mobilidade Urbana considera deslocamentos como ir e voltar do trabalho, do hospital ou da academia ou deixar e buscar os filhos na escola. Entre quem usa automóvel todos ou quase todos os dias, o tempo médio para os deslocamentos chegou a 3h06. Os usuários do transporte público gastaram 3h11. Os dados sobre ciclistas e os que se deslocam a pé não foram divulgados.

Já o tempo que o paulistano passa no trânsito para fazer sua atividade principal – trabalhar ou estudar, por exemplo – bateu recorde. O número é o mais alto desde 2009, ano em que foi incluída a pergunta sobre tempo de deslocamento. Em 2016, o gasto diário foi de 2h01; em 2015, era 1h44.

O engenheiro e mestre em Transporte pela USP, Sérgio Ejzenberg, disse em entrevista ao jornal "O Estado de S. Paulo" que os moradores da periferia foram os mais prejudicados. “Cresceu o número de pessoas que gastam mais de 3 ou 4 horas para o serviço. O que opera na periferia é o sistema de ônibus auxiliar, não o convencional. Esse pode ser um foco possível de problema a ser estudado”, diz.

Enquanto a população sofre nos congestionamentos, inúmeros escândalos são noticiados sem que, no entanto, tenham alguma consequência para o partido, seus dirigentes ou governadores. Em São Paulo, a área de transporte e mobilidade urbana é um dos setores mais utilizados para o desvio de dinheiro público, mas a população não tem a exata noção do problema. E o que explica essa blindagem?

Um dos aspectos é o alto investimento que o governo estadual faz na “grande imprensa”, em revistas como "Veja", "Época" ou "IstoÉ". Na semana passada, ficamos sabendo que o governador Geraldo Alckmin prestou depoimento no STJ sem que uma única linha tenha sido escrita sobre isso. O depoimento foi secreto e, só depois, houve poucas linhas sobre o tema.

Metrô de São Paulo

Criado em 1968, o Metrô opera desde 14 de setembro de 1974. Porém, a extensão atual do metrô é de apenas 89,8 quilômetros, contabilizando todas as linhas. São 79 estações, sendo 70 operadas pela Companhia do Metropolitano (mais conhecida por Metrô, empresa estatal), sete operadas totalmente pela ViaQuatro (empresa privada) e duas estações operadas pelo Metrô e pela ViaQuatro (Luz e República). Passaram-se 50 anos desde que o Metrô de São Paulo foi criado. Praticamente em metade deste período, a empresa esteve sob comando do PSDB.

Para efeito de comparação, a Cidade do México, inaugurou seu metrô em setembro de 1969. E hoje, ele tem 12 linhas em operação, 163 estações e 226,488 quilômetros de extensão. Esse número deve crescer, pois está sendo construído um trecho de 4,6 km da Linha 12.

É notável que ao longo dos anos a demora para aumentar a extensão das linhas passa pelos inúmeros desvios e por estratégias eleitoreiras. Desde os anos 90, o governo tucano vem construindo novos trechos a passos lentos e inaugurando estações estrategicamente quando se aproximam as eleições.

Entre a maioria dos escândalos que nunca chegaram a ser investigados de maneira séria, há a volúpia do PSDB em garantir a privatização do setor. As privatizações geram grandes lucros para as empresas privadas, mas o retorno para os cofres públicos é mínimo. Além disso, a privatização do Metrô com a ampliação das concessões de linhas acarreta uma situação de desmonte e precarização nas demais linhas, já que a conta não fecha e não há dinheiro suficiente para manter todo o sistema.

A primeira privatizada, a Linha 4–Amarela do Metrô de São Paulo, foi planejada para ligar a estação Luz à Vila Sônia. Mas hoje só chega até a Estação Butantã, duas estações ainda seguem apenas como promessa. Recém-inaugurada, a estação Oscar Freire, foi entregue pela metade, após oito anos de atraso.

Em 2010, a previsão era que a linha estivesse totalmente concluída até o fim de 2014. Hoje, é prometido para o final de 2019, 15 anos após o início da construção. Essa linha foi concedida à Via Quatro, pertencente ao Grupo CCR, por 30 anos. Os grandes gastos começaram, quando em 2010 foi contratado um empréstimo junto ao Banco Mundial, no valor de 209 milhões de dólares.

Acidentes e atrasos

A pressa em acelerar obras atrasadas pode ter contribuído para os vários acidentes que aconteceram durante os muitos anos de construção. Houve um total de dez acidentes só nas obras da Linha 4, sendo pelo menos três, segundo a revista "CartaCapital", causados por erros de engenharia. A primeira morte registrada foi de um funcionário soterrado em 2006, nas escavações da Estação Oscar Freire.

Na construção da Estação Pinheiros da Linha 4, em 2007, um buraco de acesso às obras dobrou de tamanho em pouco menos de dois minutos e engoliu várias casas condenadas, três carros, três caminhões e um micro-ônibus que passava na região no exato instante do acidente. Uma parte do túnel de acesso da construção da estação desmoronou, abrindo uma cratera de mais de 80 metros de diâmetro.

Inicialmente o Consórcio Via Amarela garantia que não havia mortos e propôs que a cratera fosse aterrada. Isso não aconteceu porque as equipes de resgate foram avisadas por familiares que algumas pessoas só poderiam estar ali. O corpo da primeira vítima só foi resgatado no quarto dia de busca. Sete pessoas morreram no acidente, o maior da história do Metrô paulista. Foram interditados 94 imóveis. Cerca de 230 moradores ficaram desabrigados e foram transferidos para hotéis.

Em reportagem, a "CartaCapital" ouviu um engenheiro que indicou "inúmeros" sinais de falhas na construção. Operários da escavação haviam constatado um pequeno afundamento na laje superior da estrutura na véspera do acidente, mas os engenheiros do consórcio optaram por consertar o defeito antes que ele aumentasse.

A reconstrução do trecho destruído no acidente da Estação Pinheiros custou 23 milhões de reais. No entanto a reserva do seguro da obra para indenizações era de vinte milhões de reais. Os gastos mais uma vez aumentaram. Um mês após o acidente, o Metrô retirou das estações quase todos os mapas que incluíam a Linha 4, explicando que o mapa confundia os usuários, que pensavam que a linha já estava operando.

Em março de 2010, o Ministério Público moveu uma ação civil apontando a omissão do Metrô de São Paulo como motivo principal para o acidente, solicitando de funcionários da companhia, seis especificamente, uma indenização de 240 milhões de reais em danos materiais e morais. O consórcio Via Amarela também foi responsabilizado na ação. O Ministério Publico concluiu que o Metrô teria permitido que o consórcio fizesse economias irregulares na obra, ignorando a segurança do trabalho. A estação só foi inaugurada em maio de 2011.

Em 2012, acidentes fatais em obras do Metrô voltaram a ocupar o noticiário, pois dois operários morreram após acidente na obra de extensão da linha 5-Lilás do Metrô (Estação Eucaliptos).

Concessão das linhas 5 e 17

Os metroviários, em janeiro de 2018, realizaram uma paralisação e denunciaram o edital de licitação que teria sido direcionado à CCR para a concessão das linhas 5 e 17. Sobre justificativa de melhor serviço a ser entregue à população, o governador tentava justificar a privatização, mas o usuário logo pôde vivenciar tudo bem diferente do prometido. As panes no sistema sobre trilhos são constantes e só aumentaram nos últimos anos. Dados indicam que a Linha 4-Amarela, privada, mesmo sendo mais nova, menor, e ter menos trens rodando, apresenta mais problemas graves, em termos relativos, com lentidão ou interrupção do serviço, do que as quatro linhas operadas pela empresa estatal, o que mostra que o serviço privado é ainda é inferior.

Desde 2012, já foram contabilizadas 446 falhas em todo o sistema. A Linha 4-Amarela, elogiada pelo governador tucano, tem 1,25 pane por quilômetro e 1,14 pane por trem em operação, enquanto a Linha 1-Azul tem 1,12 pane por quilômetro e 0,57 pane por trem em operação, a Linha 2-Verde tem 1,22 pane por quilômetro e 0,81 pane por trem em operação, e a Linha 3-Vermelha tem também 1,22 pane por quilômetro e 0,67 pane por trem em operação.

Às vésperas de deixar o governo do estado para concorrer à Presidência, Alckmin autorizou, em 12 de janeiro, por meio de decreto, a primeira concessão internacional do transporte intermunicipal de passageiros no estado. A concessão foi travada pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado) questionando diversos pontos do edital.

Plano de mobilidade

No último dia 23 de março, o governo Alckmin anunciou a contratação de um consórcio liderado por uma empresa alemã, pelo valor de R$ 20,8 milhões para realizar um estudo de mobilidade. O Consórcio terá quase dois anos para propor alternativas de transporte de carga e de passageiros, no período de 50 anos, para a chamada macrometrópole paulista, que reúne as regiões metropolitanas de São Paulo, Campinas, Sorocaba, Vale do Paraíba e Baixada Santista. Juntas, elas concentram 75% da população do estado (33 milhões de pessoas) e 80% do PIB paulista.

Na semana que antecedeu sua saída do Executivo, o agora ex-governador de São Paulo fez uma série de inaugurações. No entanto, as péssimas condições das estações mostram que o único objetivo é usar as inaugurações como vitrine eleitoral, como denunciou a diretoria do Sindicato dos Metroviários de São Paulo.

Além da falta de estrutura para os funcionários atenderem aos passageiros, algumas novas estações estão inacabadas, como a Adolfo Pinheiro, da Linha 5. A estação de Moema, também da Linha 5, foi inaugurada sem portas e com uma entrada não concluída. A estação Oscar Freire, da Linha 4-Amarela, foi inaugurada com anos de atraso e sem um dos acessos finalizados. Na Linha 15-Prata, sete estações foram entregues, após seis anos de atraso, com falhas logo após a primeira semana de testes.

Os metroviários lembram que, além dos atrasos, o ex-governador também foi denunciado por corrupção, Ele foi citado nos processos que envolvem o executivo da Odebretch Marcio Pelllegrino, que teria feito pagamento em dinheiro vivo para as campanhas de Alckmin de 2010 e 2014, que foi candidato ao governo do estado.

Na linha 13-Jade da CPTM, os problemas se repetem. A linha de trem que liga a zona leste ao Aeroporto de Cumbica, em Guarulhos, foi inaugurada no final de março com quatro anos de atraso em relação ao começo da obra. Inicialmente ela seria utilizada para a Copa do Mundo de 2014. O serviço ainda passa por testes. Para quem sai do centro de São Paulo, da Estação da Luz, são duas horas para chegar ao aeroporto de Guarulhos, com quatro baldeações. Tempo muito próximo ao que demora um carro em um dia de muito congestionamento.

Ou seja, a mobilidade não melhora com o trem e os paulistanos continuam a esperar soluções que não vieram com os governos tucanos.