Julgamento na Comissão de Anistia homenageia mãe que perdeu filhos no Araguaia

Julieta Petit da Silva, uma senhora de 85 anos, recebeu homenagem especial na audiência de julgamento da Comissão de Anistia, realizada nesta quarta-feira (12), em Brasília. Apresentada por Ronald Freitas, membro do Comitê Central

Acompanhada da única filha sobrevivente, a caçula Maria Laura Petit, a velha senhora, emocionada, não conseguiu falar sobre o assunto. "Generosa, Corajosa, Determinada e Persistente, na sua justa luta por ver a memória e os direitos de seus filhos estabelecidos e respeitados", disse Ronald Freitas e, dirigindo-se à ela: "Tenha certeza, que junto com os demais, os nomes de seus filhos estarão para sempre escritos na história, na memória e no coração do Brasil e dos brasileiros".

Também a guerrilheira Luzia Reis Ribeiro, uma das sobreviventes, fez declaração emocionada, finalizando com um poema de Bertolt Brecht, intitulado "Aos que Virão Depois de Nós": Vocês que vão emergir das ondas em que perecemos, pensem/ Quando falarem das nossas fraquezas nos tempos sem sol/ De que vocês tiveram a sorte de escapar/ Quando chegar o tempo em que o homem seja amigo do homem/ Pensem em nós com um pouco de compreensão".

Cerca de 44 processos foram julgados nesta quarta-feira, incluindo um grupo de 23 integrantes da Guerrilha do Araguaia, que receberam declaração de anistiados políticos pela Comissão de Anistia. Desde que foi criada em 28 de agosto de 2001 até o dia 11 de abril, a Comissão protocolou 54.231 processos. Destes, foram julgados 22.968, tendo sido aprovados 10.834. A Comissão espera julgar até o final do ano mais 30.393 processos.

Estabelecendo a justiça

O resultado do processo, segundo as palavras de Freitas, representa o estabelecimento da justiça "a esses homens e mulheres, que souberam honrar suas famílias e o seu País. E ao fazer-se justiça, se reafirma mais uma vez, a lição que nos foi legada pela mitologia grega, imortalizada no clássico de Sófocles – Antígona -, onde se aprende que o ‘justo’ é aquilo que corresponde aos mais profundos e nobres impulsos do ser humano, e não aquilo que é imposto por um governo, por mais poderoso que momentaneamente seja".

O julgamento, que aconteceu no auditório do Ministério da Justiça, contou com a participação dos conselheiros Egmar José de Oliveira, Beatriz do Valle Barieri e Luiz Carlos Duarte Mendes.

No seu parecer, o relator, advogado Egmar José de Oliveira, usa a poesia de do próprio Lúcio Petit para destacar e defender a atitude "da juventude do Araguaia, a guerra dos jovens Jaime, Maria Lúcia, Regiliena, Lúcia, Emília, Danilo, Eduardo, Glênio, Dower, José Genuíno, Otacílio, Pedro Sandes, Pedro de Albuquerque Neto, do Zezim e de tantos outros – todo o sentimento que lhe moveu: "Nem é preciso dizer/ Qual foi o meu paradeiro/ Hoje ajudo a libertar/ Todo o povo brasileiro…".

Ao comentar o resultado do julgamento, Ronald Freitas disse que "ao agir assim, os senhores estarão sendo a demonstração viva da capacidade de regeneração do próprio Estado, que estará se mostrando capaz de superar erros e também se mostrando maior e mais importante que eventuais governos que se considerem maior que a história e a vida".

Araguaia continua

Para Ronald Freitas, "as lutas travadas naqueles anos (de chumbo), dentre as quais se destaca a resistência do Araguaia, não foram em vão, mas que elas continuam. O Araguaia continua".

O líder comunista lembra que "hoje, novos desafios são postos com o mesmo conteúdo, e estão a nos exigir discernimento e coragem para vencê-los e superá-los", acrescentando que "como parte da luta e resistência de nosso povo a essa situação, insere-se a eleição de Lula à presidência da república em 2002".

E destaca que "após décadas, volta ao governo do país um conjunto de forças políticas democráticas, progressistas e de esquerda, deslocando deste espaço as elites tradicionais, nacionais e estrangeiras, que, conservadoras e preconceituosas como são, tudo procuram fazer para que seus "legítimos representantes" voltem aos postos de mando da república".

Para Ronald, "essas elites mudam um pouco os instrumentos de desestabilização, mas continuam com os mesmos objetivos: afastar do governo segmentos sociais que não lhes sejam totalmente dóceis".

Forças inimigas

O deputado Jamil Murad (PCdoB-SP), que acompanhou a audiência, enfatiza as palavras do companheiro de Partido. Ele disse que "essa é uma causa que jamais sairá da nossa consciência e do nosso coração. Essa é a luta do povo brasileiro. Muitos companheiros morreram, todos sofreram e agora novos problemas são colocados pelas mesmas forças inimigas do povo, inimigas do Brasil e do progresso, que procuram de outras formas e mecanismos golpear os interesses do nosso povo por justiça, por liberdade e independência".

O líder do PCdoB na Câmara dos Deputados, Inácio Arruda, outra presença na audiência, repercutiu o julgamento em seu discurso da tribuna da Casa. Na opinião do líder comunista, "se buscou reparar danos aos que tombaram no nosso País, enfrentando, não as Forças Armadas, mas a direita brasileira, que golpeou o País, cerceou a liberdade, instalou o arbítrio e perseguiu democratas, socialistas, comunistas e todos aqueles que levantaram sua voz para protestar e pôr outra alternativa que não aquela que estava instalada na nossa Pátria".

Também participaram da audiência Aldo Arantes, Pedro de Oliveira e Fábio Tokarski. O cineasta Ronaldo Duque exibiu, durante a audiência, um trecho de quatro minutos do filme "A Conspiração do Silêncio", que conta a história romanceada da Guerrilha do Araguaia. O filme entra em exibição no circuito comercial, no próximo dia 29 de maio, em São Paulo, Rio e Brasília.

De Brasília,
Márcia Xavier

Clique no link abaixo para ler a íntegra do pronunciamento de Ronald Freitas
http://www.vermelho.org.br/base.asp?texto=592