Em greve, UERJ cancela vestibular e sofre mais cortes

O confronto entre governo e comunidade universitária se intensificou depois que Rosinha anunciou, no fim de março, um novo corte de 25% nas verbas de custeio da UERJ. Em greve decidida coletivamente, professores, estudantes e funcionários, com o ap

A Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e o governo de Rosinha Matheus nunca foram muito afinados. Dotada de autonomia administrativa e política em relação ao Palácio Guanabara e reconhecida historicamente como celeiro para os partidos e pensamentos de esquerda, a UERJ nunca fez parte das prioridades políticas da governadora. Esse divórcio traduziu-se, nesses três anos e meio de governo, na redução gradual das verbas públicas para custeio e para novos investimentos destinadas à universidade, fato que colocou a comunidade universitária em permanente estado de tensão com a governadora.

Os conflitos se exacerbaram depois que Rosinha anunciou, no fim de março, um novo corte de 25% nas verbas de custeio da UERJ. Em greve, decidida coletivamente, desde o dia 3 de abril, professores, estudantes e funcionários, com o apoio da reitoria, mantêm a universidade praticamente parada desde então. Num gesto que acirrou ainda mais a queda-de-braço com o governo, o Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão da UERJ (CSEP) decidiu na semana passada suspender por tempo indeterminado a realização do Vestibular Estadual 2007, marcado para 25 de junho. A poucos meses das eleições, a decisão foi recebida como uma provocação pelo governo, que promete acionar a Procuradoria Geral do Estado para garantir a realização do concurso. Irritada, a governadora ameaçou também cortar o ponto dos grevistas, o que acabou endurecendo o movimento.

Centenas de estudantes de escolas particulares realizaram na segunda-feira (22) uma manifestação em frente ao Palácio Guanabara para protestar contra o cancelamento do vestibular da UERJ. De acordo com a universidade, pouco mais de 72 mil candidatos pagaram a taxa de inscrição do concurso, de R$ 36, que não será devolvida. O governo aproveitou a insatisfação dos vestibulandos para transforma-los em aliados na pressão contra a direção da UERJ: “Esperamos que, independentemente da medida judicial que vamos tomar, o Conselho de Ensino da UERJ demonstre senso de responsabilidade para com esses estudantes e confirme a realização do vestibular já em sua próxima reunião”, disse o secretário estadual de Ciência e Tecnologia, Wanderley de Souza, que recebeu uma comissão de manifestantes em seu gabinete.

O Departamento de Vestibular da UERJ informou que a taxa de inscrição não será devolvida porque o concurso para 2007 não foi cancelado, mas apenas suspenso até “que sejam tomadas medidas para recompor as verbas de custeio atingidas pelo corte de 25% anunciado em março”. Essa passou a ser uma reivindicação também dos grevistas, que exigem ainda aumento de 54% nos salários, aumento das bolsas estudantis e das verbas para melhorar as instalações da universidade, que sofrem com o abandono. Em fevereiro, um bloco de sete toneladas, pedaço de uma passarela, desabou no 12º andar do principal prédio da UERJ, não ferindo nenhuma pessoa por sorte. Agora, as rampas de acesso ao prédio, destaque do projeto arquitetônico localizado ao lado do estádio do Maracanã, estão interditadas.

“A comunidade da UERJ quer melhores condições de trabalho, estudo e pesquisa, além de mais verba para manutenção e reforma do campus. A situação está precária e espero que o governo não espere cair outra passarela para agir”, afirmou o reitor da universidade, Nival Nunes de Almeida. Diretora da Associação de Docentes (Asduerj), Nilda Alves completa, afirmando que “a UERJ não tem condições de receber novos alunos”. O governo reage com dureza: “O verdadeiro motivo do cancelamento do vestibular é a pressão por reajuste de salários. Estão usando a principal missão de uma universidade como pretexto para pressionar o governo. Nós não vamos negociar com os servidores em greve e, se cortarmos o ponto, estaremos obedecendo à lei, pois a greve já dura 50 dias”, disse o secretário Wanderley de Souza.

Repasse em queda livre –
Um levantamento feito pela Assembléia Legislativa do Rio (Alerj), mostra que a cota mensal repassada pelo governo para arcar com as despesas de custeio da UERJ desde o início de 2006 é de R$ 2,9 milhões. Com o corte anunciado pela governadora, que entra em vigor em maio, a cota cairá para R$ 2,2 milhões. Em janeiro de 2003, quando Rosinha assumiu o governo, a cota mensal de custeio da UERJ era de R$ 3,2 milhões. O levantamento feito pelos parlamentares indicou que a universidade carecia de insumos básicos para realizar as tarefas acadêmicas, apresentava graves problemas de estrutura física em seus campus e acumulava dívidas de serviços como água, luz e telefone.

“Enquanto os preços cobrados pelos serviços sobem, as verbas de custeio caem”, lamenta Nival de Almeida. O reitor revela que o gasto total com despesas de custeio da UERJ em 2002 ficou em R$ 48 milhões e que, em apenas três anos, a governadora o diminui em R$ 10 milhões: “Agora, com esse novo corte, o gasto anual cairia para R$ 29 milhões, quase R$ 20 milhões a menos do que no início desse governo”, diz. Após o levantamento realizado pela Alerj, o deputado Paulo Pinheiro (PPS) decidiu dar entrada em uma ação civil pública na Procuradoria Geral do Estado para impedir qualquer nova redução no orçamento da UERJ: “A crise é insustentável. A UERJ não precisa de um reitor, precisa de um mágico”, disse o deputado.

A Secretaria Estadual de Ciência e Tecnologia refuta o estudo dos parlamentares e alega que um acordo feito com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj) vai garantir até o fim deste ano o repasse complementar de R$ 800 mil mensais à UERJ: “Na verdade, ao invés de caírem para R$ 2,2 milhões, as verbas de custeio vão aumentar para R$ 3 milhões a partir de maio”, garante Wanderley de Souza. Em carta enviada à imprensa, o secretário afirma também que o governo já investiu esse ano R$ 1,5 milhão em obras de infra-estrutura no prédio da universidade. O acordo com a Faperj, no entanto, é meramente cosmético, segundo a comunidade universitária: “Como vai ficar ano que vem? A Faperj também não terá verbas e nós nem sabemos quem estará no governo. O importante é lutarmos contra o sucateamento da universidade”, afirma a professora Nilda Alves.