Favoritismo de Lula faz PT desprezar aliados históricos

Pesquisas de opinião apontam que o capital eleitoral de Lula pertence a ele próprio e independe dos grupos a sua volta. Popularidade deixa o governo perigosamente mais confiante e o presidente mais convencido de que foi ungido por mãos divin


Nelson Breve – Carta Maior

O vento sopra a favor da reeleição do presidente Lula, mas o oceano da campanha eleitoral continua revolto e perigoso para embarcações avariadas. Faltando menos de quatro meses para a eleição, ele navega sobre uma aprovação de 60% do eleitorado (66% entre os homens, 67% nas cidades médias, 68% nas famílias mais pobres, 69% entre os menos escolarizados e 73% no Nordeste) e tem uma vantagem de 20 pontos percentuais para a soma das intenções de voto dos demais postulantes ao cargo de presidente da República, segundo a mais recente pesquisa do Ibope, patrocinada pela Confederação Nacional da Indústria (CNI).

É um feito considerável para o chefe de um governo que há mais de um ano vem sendo bombardeado pela mídia e taxado de ladrão e corrupto pelos adversários. “O povo é muito mais sábio. Quanta indignação houve por parte de alguns neste país. Depois de um ano e meio batendo sem parar, sai uma pesquisa, eu subo, eles descem”, constatou Lula ao falar nesta sexta-feira (16), em Brasília, para mais de mil jovens participantes do 13° Congresso da União da Juventude Socialista (UJS), ligada ao PCdoB.

Os acontecimentos desse período turbulento até reforçam o messianismo do presidente, que se considera predestinado a “fazer com que os pobres deste país deixem de ser mais pobres”. Na tempestade de denúncias, a oposição não conseguiu uma evidência cabal de que Lula tenha participado ou fosse conivente com a corrupção ou o suborno de parlamentares e dirigentes partidários.

A atmosfera confusa levou os caciques do PSDB a escolherem o candidato menos competitivo, o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin, um político sem magnetismo pessoal e avesso aos rapapés da política. Desavenças internas e situações imprevistas, como os vestidos da dona Lu e a rebelião da organização criminosa paulista, abalaram a imagem do principal adversário de Lula, justamente no momento de preparação da campanha tucana. Na estratégia equivocada da oposição para tornar seu candidato mais conhecido no Brasil profundo antes de consolidar a simpatia do eleitorado anti-Lula, ele até foi barrado em festa no Nordeste.

Por outro lado, a verticalização das coligações forçou o PMDB a esvaziar a candidatura com maior força eleitoral que o partido teve nos últimos 20 anos. A ala governista do partido nem precisou fazer grande esforço, pois a popularidade do ex-governador do Rio de Janeiro Anthony Garotinho emagreceu junto com a greve de fome que ele fez, na tentativa de desviar o foco do noticiário político (ou policial) da origem nebulosa dos recursos que financiavam sua estrutura de campanha.

Com Garotinho e o PMDB fora da corrida presidencial, a verticalização espantando da disputa nacional também os partidos médios que estão ameaçados pela cláusula de barreira e o candidato tucano encalhado na ilha dos 20% das intenções de voto, a vitória de Lula no primeiro turno passou a ter probabilidades concretas. E a perspectiva de manutenção do poder é o melhor atrativo que um candidato tem para aglutinar forças políticas de apoio nos estados.

Nesse sentido, a verticalização acabou ajudando a reforçar o “lulismo”. Se a proximidade da sigla PT amplia os riscos eleitorais para candidatos de outros partidos, o vínculo à imagem de Lula é trunfo político, especialmente no Nordeste. Além disso, a constatação de que a aprovação do governo pelo eleitorado está aumentando, inclusive entre segmentos formadores de opinião (de 36% para 45% no eleitorado com ensino superior entre 31 de maio e 7 de junho), sempre ajuda convencer líderes políticos indecisos (do PMDB, do PTB, do PP, do PL e até do PFL) a subirem nos palanques estaduais que apóiam a reeleição do presidente.

Do outro lado do palanque lulista, até a queda do ministro da Fazenda Antonio Palocci acabou reacendendo a esperança dos militantes da esquerda em uma possível mudança de rumo na política econômica em um segundo mandato de Lula. O discurso de maior ousadia nas mudanças deixou de ser uma dissidência no governo. Agora, tem respaldo do comando do Ministério da Fazenda e da Casa Civil. Até nisso o presidente foi agraciado, pois a demissão do condutor da política econômica foi recebida com indiferença pelo mercado financeiro, mostrando que o fiador da estabilidade sempre foi o próprio Lula.

E o que dizer da péssima estréia do atacante Ronaldo, da Seleção Brasileira, na Copa do Mundo? Teria sido castigo divino pela deselegância de ter constrangido o candidato à reeleição, ao comparar as especulações sobre seu excesso de peso com as ultrapassadas insinuações de que o presidente costuma exagerar na apreciação de bebidas alcoólicas? Só falta fracassar a festa de São João tradicionalmente organizada pelo senador José Jorge (PFL-PE), candidato a vice-presidente na chapa de Alckmin, que atacou Lula com ofensas similares.

A FORÇA DO LULISMO

Predestinação, sorte ou habilidade política, o fato é que o “lulismo” está mais forte hoje do que antes da tsunami que varreu o Planalto Central, afogando biografias históricas. Seja porque o PT se despedaçou no processo das denúncias de corrupção ou porque não surgiu nenhuma alternativa que empolgasse as bases sociais do país. Ou, ainda, porque os principais mastros da caravela petista desabaram, mas o barco não naufragou, mostrando que o capitão do navio sabe comandar os marinheiros em condições adversas e enfrentar as intempéries.

Pesquisas qualitativas encomendadas pela Fundação Perseu Abramo, do PT, confirmam essas impressões sobre os motivos da recuperação eleitoral de Lula. Apoiadas por um abrangente levantamento quantitativo da imagem do governo e do presidente, realizado no início de abril, tais avaliações indicam que o lastro dele junto ao eleitorado não é pequeno. A vontade de fazer um bom governo é apontada como virtude de Lula por 62%. A coragem para enfrentar pressões e a confiança que ele transmite, por 53%. A disposição para cumprir promessas e o preparo pessoal são mencionados por 44% e a capacidade de comando, por 42%.

A crença nas denúncias caiu de 45% para 27% do eleitorado, de agosto do ano passado para abril, enquanto a percepção de que as acusações seriam mais falsas do que verdadeiras subiu de 9% para 22%. Para 38%, o motivo das denúncias é político. A corrupção é considerada muito grande por 55%, mas 79% acham que vem de longe e acabou aparecendo agora. Apenas 17% consideram que aumentou neste governo. Para confirmar a sensação de que Lula consegue se comunicar diretamente com o povo, a pesquisa apurou que 30% do eleitorado gostam muito de ouvir o presidente, 39% acreditam no que ele fala e 43% gostariam que ele falasse mais.

Contrastando com o descrédito geral dos eleitores na classe política e nos partidos, as pesquisas de opinião apontam que o capital eleitoral de Lula pertence a ele próprio. Independe de seus apoiadores ou das pessoas e grupos que ele escolheu para ajudá-lo a governar o país. Essa popularidade deixa o governo perigosamente mais confiante e o presidente mais convencido de que foi ungido por mãos divinas.

DESPREZANDO ALIADOS

Assim, ele continua levando o PMDB na conversa, o que faz desde que venceu a eleição passada. Só entrega o espaço prometido (o cargo da vez é o Ministério da Saúde) depois de arrancar várias contrapartidas, sucessivamente. Até com os aliados mais antigos o tratamento é cruel. Tanto os dirigentes do PSB, quanto o comitê central do PCdoB, se desorientam no jogo da alternância entre afagos do presidente e insensibilidade da direção do PT nas negociações para a formação dos palanques estaduais.

Lula fala na fusão futura dos três partidos de esquerda. Mas o PSB e o PCdoB querem e precisam crescer na disputa eleitoral deste ano, que vai rebaixar politicamente os partidos que não alcançarem pelo menos 5% do total de votos válidos para deputados federais em todo o país. Perdem prerrogativas na Câmara, recursos do Fundo Partidário e tempo para a divulgação de propaganda partidária institucional na televisão.

O PSB enxerga na eleição deste ano a grande oportunidade de ter uma bancada inédita de 60 deputados, rivalizando com o PT na hegemonia política da esquerda. Se ultrapassar a cláusula de barreira, poderá ser escoadouro natural dos parlamentares eleitos por partidos progressistas que não alcançarem o patamar mínimo de votos exigido para exercer a representatividade no Congresso. Fazer coligação formal para apoiar Lula impediria composições estaduais mais vantajosas.

Esse sacrifício exigiria contrapartidas em apoio do PT a candidatos majoritários do partido. “Nossa vontade de coligação formal não é maior que a nossa possibilidade. O mais importante é não prejudicarmos os resultados nos estados”, avisa o secretário-geral do PSB, Renato Casagrande. A lista começa com Pernambuco, onde o presidente do partido, Eduardo Campos tem possibilidade de se eleger governador se o ex-ministro da Saúde Humberto Costa abrir mão da candidatura petista. Mas existem outros 13 estados em que candidatos socialistas estão em palanques distintos ou totalmente opostos aos do PT.

No PCdoB, o preço é menor, mas o problema é o mesmo. A direção do partido acredita que existem quatro possibilidades de eleger candidatos majoritários. O ex-ministro do Esporte Agnelo Queiroz para o governo do Distrito Federal, o senador Leomar Quintanilha para o governo do Tocantins e os deputados Inácio Arruda e Jandira Feghali para vagas ao Senado no Ceará e no Rio de Janeiro. Apenas esta última terá apoio do PT.

Nos outros três estados, os petistas não querem saber de ajudar os aliados. “O PT precisa ter mais desprendimento. Tudo que queremos é ter a chance de disputar um lugar na sombra, porque no sol todos têm direito”, reclama Inácio Arruda, que disputa a candidatura com o ex-ministro das Comunicações Eunício Oliveira, do PMDB, e gostaria que os petistas cedessem ao menos a vaga de vice-governador na chapa do ex-prefeito de Sobral (CE) Cid Gomes, do PSB, irmão do ex-ministro da Integração Nacional Ciro Gomes, que será candidato à Câmara, também pelo PSB.

QUESTÃO DE SOBREVIVÊNCIA

O problema é que o PT também tenta sobreviver ao pós-lulismo. Com o cenário bastante favorável à reeleição do presidente, o partido está fazendo as contas para que as perdas eleitorais decorrentes dos escândalos que derrubaram importantes dirigentes petistas sejam as menores possíveis. O PT pretende lançar candidatos a governador em pelo menos 18 estados, na tentativa de manter uma bancada federal o mais próxima possível dos cerca de 80 deputados que possui atualmente.

Pode até ceder espaço aos aliados se o presidente Lula precisar e pedir. Mas a direção do partido não pretende sacrificar candidaturas além do estritamente necessário, só por solidariedade aos aliados. A avaliação de dirigentes petistas é que a coligação formal com PSB e PCdoB tem apenas valor simbólico.

Na prática, o apoio dos aliados históricos agregaria ao tempo de propaganda no rádio e na TV apenas cerca de um minuto por programa. Em um cenário provável com seis a oito candidatos à Presidência, os programas do PT devem ter entre 5 e 7 minutos, contra 6 a 8 minutos da coligação PSDB/PFL. Não haveria grande perda se a coligação de Lula fosse composta apenas pelo PT e, provavelmente, o PRB do vice-presidente, José Alencar.

A questão da candidatura a vice é um assunto praticamente superado na medida em que o PMDB descartou qualquer possibilidade de integrar a coligação encabeçada por Lula. Ciro Gomes chegou a ser cogitado para o posto, mas a tendência é de repetir a chapa com Alencar. A explicação oficial é que o atual vice não agrega votos para o presidente, mas pode tirar muitos do eleitorado mineiro se saísse magoado do processo.

De olho em 2010, o governador de Minas, Aécio Neves, que é um tucano apoiado por muitos petistas, andou se intrometendo na coligação alheia e recebeu Alencar no Palácio da Liberdade para mandar um recado ao Palácio do Planalto: para o bem de todos, é melhor que o mineiro continue vice. O que, de fato, nem ele, nem o PT, nem ninguém com mínimas perspectivas de disputar o poder daqui quatro anos querem é ver Ciro em condições privilegiadas na corrida pela sucessão de Lula. “Ciro de vice seria sinalizar a sucessão”, advertem petistas e peemedebistas.

O ônus do veto ao ex-ministro da Integração acabou ficando com a ala governista do PMDB, que, mesmo não formalizando a coligação, terá um ou dois representantes na coordenação da campanha de reeleição de Lula. A alta popularidade do presidente está aumentando o peso governista na gangorra do PMDB. Depois de quase eleger um líder oposicionista para a bancada da Câmara, boa parte do partido foi se bandeando para o lulismo, a ponto de o líder no Senado, Ney Suassuna (PB), prever a adesão de mais de 20 diretórios estaduais ao palanque do presidente.

“Geddel é um exemplo vivo de como a atuação política é dinâmica”, ironizou o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), há algumas semanas, ao reparar o empenho de Geddel Vieira Lima (BA), ex-líder da bancada federal do partido durante o governo FHC, no sepultamento da candidatura própria do PMDB. O deputado baiano reencontrou as benesses do poder ao se aliar com o ex-ministro Jaques Wagner na disputa pelo governo da Bahia contra o grupo político do senador Antonio Carlos Magalhães (PFL), e está sendo fiel a Lula até nos votos contra reajustes maiores para aposentados.

Assim como Geddel, os líderes peemedebistas nos outros 25 estados e Distrito Federal estão felizes por poder fazer as coligações que melhor atendam seus interesses. Renan vai apoiar um candidato tucano em Alagoas. Sarney colocará o partido a serviço do PFL da filha Roseana, no Maranhão. Assim, o partido espera eleger o maior número de governadores e de deputados federais e continuar com a maior bancada no Senado.

O partido será fiel da balança qualquer que seja o vencedor da disputa. “O PMDB vai sair da eleição mais forte do que entrou”, prevê o novo líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR). “Vai ser importante para o governo, independente de ter ou não ter o vice”, constata o senador, que também já foi líder governista na Era FHC. Ele será candidato ao governo de Roraima com apoio do PT, do PPS e do PSB, pelo menos.

Em cerca de 10 estados será praticamente impossível juntar o PT e o PMDB no mesmo palanque. São casos em que os peemedebistas fazem oposição a governos petistas (AC e MS) ou apoiados pelo PT (MA e RN), ou o PT faz oposição a governos sustentados pelo PMDB (AL, DF, PE, PR, RJ, RS e SC).

No entanto, na maioria desses estados existe a possibilidade de o PMDB dar apoio ao presidente. “Dois palanques não é ruim para o Lula”, avisa o secretário nacional de Organização do PT, Gleber Naime, que coordena o Grupo de Trabalho Eleitoral do partido (GTE). O mesmo raciocínio vale para o caso de candidatos do PSB e do PCdoB virem a enfrentar petistas nos estados.

Essa situação terá que ser definida até o fim do mês (28 e 29), quando estes dois partidos realizam suas convenções. Mas seria melhor para Lula que as coisas estivessem resolvidas até o próximo sábado (24), quando sua candidatura deverá ser homologada na convenção nacional do PT, em Brasília.

CALCANHAR DE AQUILES

Com o favoritismo do presidente Lula, começa a se insinuar o espírito de uma eleição meia-boca. De um lado, a oposição cumprindo tabela sem convicção da possibilidade de virada, concentrando a disputa nos governos estaduais e espaços no Parlamento e jogando a culpa da derrota sobre os ombros do candidato que forçou a passagem, atropelando a lógica eleitoral. De outro, os aliados do governo ficam achando que ninguém precisa se esforçar muito pela reeleição porque o presidente já estaria se considerando vitorioso e devedor apenas de si próprio.

Aí está o perigo. Assim como a direção do MLST planejou apenas uma ocupação tranqüila do Congresso, sem incidentes mais graves, o governo e o PT estão se comportando como se estivessem fazendo um favor ao permitir o apoio dos aliados. Quando Tétis mergulhou o filho Aquiles no Rio Estige, imaginou que ele estaria protegido de todos os males do mundo. Sua vulnerabilidade só foi constatada depois que a flecha de Ulisses atingiu-lhe o calcanhar intocado pelas águas imortalizadoras.

Se a disputa engrossar no meio da campanha, o empenho da militância dos aliados históricos fará falta, pois os outros apoiadores não terão constrangimento algum em se lançar ao mar e embarcar no navio da oposição. A mesma pesquisa que aponta o favoritismo de Lula mostra que o eleitorado ainda está volátil. Parte dos votos nulos e brancos declarados estão migrando para a condição de indecisos.

Isso acontece, especialmente, no eleitorado feminino, entre os jovens e os eleitores com ensino médio e superior, nas Regiões Sudeste, Norte e Centro-oeste, nas capitais e no interior, em grandes e pequenas cidades, entre ricos e pobres. Lula vem recuperando popularidade no eleitorado de nível superior, mas parece estar perdendo no de nível médio. Volta a ter confiança da classe média, mas cai no conceito das famílias que ganham entre um e dois salários mínimos. Melhora nas capitais e grandes municípios, mas piora nos pequenos e nas Regiões Norte e Centro-oeste, talvez por causa crise na agricultura.

Essa volatilidade mostra que não dá para enfrentar a campanha de salto alto. O presidente leva vantagem quando aparece praticamente eleito justamente no momento de formação dos palanques estaduais. Mas a embarcação não está em perfeitas condições, apesar da expressiva melhora na comunicação do governo, que está conseguindo mostrar o lado positivo de suas ações para contrapor à campanha denunciatória da oposição.

Pesquisas encomendadas pelo PT mostram uma vitrine de programas considerados bem-sucedidos pelos brasileiros. Bolsa-família, Fome-zero, Operação tapa-buraco, Farmácia popular, Brasil alfabetizado, Luz para todos são programas conhecidos por mais de 70% dos eleitores e avaliados positivamente por mais de 50%.

Nas áreas de atuação, a Educação ocupa o primeiro lugar com 49% de avaliação positiva, seguida de perto pelas Relações Internacionais, com 43%. Talvez seja por isso que Lula tem aparecido muito ao lado do ministro da Educação, Fernando Haddad, e não perde a oportunidade de encaixar nos discursos os êxitos da diplomacia brasileira na sua gestão. Lembre-se, também, que o programa eleitoral do PT exibido em maio abordou exclusivamente o tema da Educação.

Por outro lado, as pesquisas mostram que a popularidade não se sustenta só com a publicidade das ações, pois 48% não acreditam na propaganda e 30% só acreditam às vezes. Além disso, existem vulnerabilidades que podem abrir flancos na candidatura de Lula, caso a oposição consiga encaixar o discurso certo no momento certo.

Quando questionados sobre em que comportamento o presidente teria mudado, alguns aspectos se destacam. A proporção dos que dizem que ele esqueceu as promessas de campanha sobe de 3%, em junho de 2005, para 29%, em abril de 2006. Os que o consideram arrogante ou autoritário aumentaram de 2% para 13% no mesmo período, enquanto os que disseram que ele ficou mais corrupto saltam de zero para 6%.

Mesmo o reajuste de mais de 16% no salário mínimo, considerado um dos principais fatores de recuperação da popularidade do presidente, aparentemente não teve tanto peso assim. 47% disseram que o aumento de R$ 300 para R$ 350 por mês foi menos do que esperavam e só 11% o consideraram melhor que o esperado.

A popularidade de Lula pode ter alcançado seu ponto máximo neste início de junho, quando os efeitos do aumento do salário mínimo na economia estão no auge, com expansão do crédito, aquecimento do comércio e criação de empregos. Daqui a dois ou três meses, a euforia passa e as notícias negativas tornam-se mais relevantes na avaliação do eleitor.

O impacto de um eventual veto do presidente no aumento adicional dos benefícios previdenciários superiores a um salário mínimo, por exemplo. Pode abalar o conceito do presidente junto a alguns milhões de aposentados. Talvez o suficiente para levar a eleição a um segundo turno. O que zera o jogo e pode provocar uma reviravolta, pois a tendência, como observa o prefeito do Rio de Janeiro, César Maia (PFL), é que todos se juntem contra o candidato à reeleição.

No boletim diário que distribui pela internet, o prefeito carioca vive apontando os defeitos da candidatura Alckmin, mas nunca deixou de demonstrar crença em uma possível virada. Ele argumenta com o exemplo de recente eleição no Canadá, na qual o chefe de governo foi bombardeado por denúncias de corrupção, recuperou a popularidade, mas voltou a despencar quando o assunto foi retomado na campanha eleitoral em que saiu derrotado.

Por isso, o PFL tomou a decisão de bater sem mesuras no presidente. Na quinta-feira (15) levou ao ar um programa quase anônimo, no qual insistia que Lula não pode continuar governando, porque tinha ligações com os petistas denunciados por corrupção pelo Ministério Público Federal. “Brasil, um país decente, não merece essa gente”, concluía a propaganda do PFL.

Na próxima semana (22), será a vez do PSDB exibir seu programa partidário. Tudo indica que a linha será diferente da seguida pelo aliado. O objetivo será tornar o candidato tucano à Presidência mais conhecido nacionalmente e tentar estabelecer um contraponto ao atual governo, seja no campo ético ou programático. É a chance de Alckmin mostrar antes do início da campanha que tem viabilidade eleitoral.

Se Lula atravessar o temporal dos programas do PFL e do PSDB sem abalar o casco da embarcação estará muito perto de conquistar o segundo mandato. Neste momento da disputa, é decisivo não assustar o pessoal que está querendo embarcar na candidatura mais promissora, e sempre espera o último momento.

Mas é bom que o comando da campanha mantenha o estado de alerta a bordo, pois, além da agitação do mar provocada pela tempestade de acusações, sempre haverá o risco de um assalto pirata afundar o navio. A oposição está disposta a lançar mão de tudo que for possível para voltar ao poder.

Esse é um cenário que pode descambar para uma crise institucional sem precedentes. Os movimentos sociais que apóiam Lula estão preparados para um enfrentamento drástico caso a oposição lance mão de golpes baixos para tentar vencer a eleição. É o que indica a palavra de ordem cantada pela militância da UJS no encontro com o presidente: “Um, dois, três; quatro, cinco, mil. Ou reeleger o Lula, ou paramos o Brasil!”.

Fonte: Agência Carta Maior