Morreu `Primeira Leitura´; a direita fica mais burra

Por Bernardo Joffily

A revista Primeira Leitura, e o site correspondente, anunciaram nesta segunda-feira (19) que, depois de cinco anos, “encerram a sua trajetória”. O projeto fecha as portas alegando falta de anúncio

A caracterização como direitista não partiu do próprio veículo – este é um antigo cacoete da direita brasileira, que nunca se enxerga como tal – mas  foi alegremente acatado por ele. “Eu não fujo deste nome”, declarava o seu diretor de redação, Reinaldo Azevedo, sempre que a ocasião se apresentava.


Em guerra contra “o apedeuta”


A revista e o site surgiram na fase final do governo Fernando Henrique, como porta-vozes do ex-ministro das Comunicações de FHC, Mendonça de Barros, que hoje coordena o grupo de trabalho de economia da campanha Alckmin. Começou procurando se diferenciar da linha que chamava “malanista” (do então ministro da Fazenda, Pedro Malan), mas sob este estandarte se lançou de cabeça na campanha de José Serra em 2002.

O veículo manteve, desde 2003, oposição intransigente e beligerante ao governo Lula. Em 2004, Mendonção afastou-se e Reinaldo Azevedo (que teve uma fugaz passagem juvenil pelo trotskismo) assumiu a direção. Na crise política de 2005, pediu mais e mais radicalização oposicionista. Na disputa intra-PSDB, entrou fundo na defesa da opção Serra. Em seguida entrou em campanha pró-Alckmin, que qualifica de “candidato de centro-direita”, porém cobrando sempre mais contundência anti-Lula.

No confronto com o governo, o PT e o presidente, Primeira Leitura assumiu as bandeiras mais extremadas. Reinaldo Azevedo, defende a privatização da Petrobras e do Banco do Brasil. Abraçou também o preconceito generalizado nas elites contra a suposta incultura de Lula, a quem gostava de chamar “o apedeuta” (“sem educação, ignorante, grosseiro”, segundo o dicionário Houaiss, que no entanto prefere “apedeuto”).


Saudades da direita de outrora


E, no entanto, havia vida inteligente em Primeira Leitura. Uma inteligência de direita – e que já fora mais profunda, menos verborrágica e auto-satisfeita nos tempos de Mendonção. Mas, de qualquer forma, neurônios em funcionamento.

Com o fim de Primeira Leitura, a direita brasileira fica um pouco mais burra. Recrudesce um fenômeno que não é por certo absoluto, mas perceptível a olho nu. Um emburrecimento que vem de longe, quem sabe um efeito colateral da ditadura militar, que podia prescindir da força das idéias, pois tinha a das armas.

Olhemos em torno.Quais pensamentos e pensadores da direita de hoje se comparam com os de meio século atrás, como Aliomar Baleeiro, Bilac Pinto, Afonso Arinos e a Banda de Música da UDN?  Quais economistas ultraliberais ombreiam com um Eugênio Gudin ou um Roberto Campos? Qual jornalista reacionário chega aos pés de um Carlos Lacerda? Até Fernando Henrique – a quem não se podia negar algum talento sociológico, embora questionável no mérito, e antes de virar a casaca – terminou, quem diria, como o autor de “A arte da Política”…


Faltaram anúncios e faltaram leitores


Os responsáveis por Primeira Leitura recusam a clássica desculpa de que “não souberam nos compreender!”. Avaliam que “fomos, sim, muito bem compreendidos ao longo deste tempo. Nada nos faltou, a não ser, obviamente, anúncios em número suficiente para que o projeto pudesse seguir adiante”.


Primeira Leitura
assevera que o seu site “chega ao fim com 2 milhões de page views por mês, o que faz dele, talvez, o mais visitado de política e economia do país fora dos grandes portais”. E que “a revista, com tiragem de 25 mil exemplares, sempre vendeu, entre assinaturas e bancas, de 70% a 80% do total” – números que são controvertidos.

No caso do site, o exagero é facilmente verificável por meio do portal Alexa (www.alexa.com ), que monitora a visitação das páginas da web no mundo. Nesta terça-feira (20), o www.primeiraleitura.com.br  constava em 118.923º lugar no ranking mundial do Alexa, tendo recuado 7.840 colocações nos últimos três meses.