Roteirista de “Diários de Motocicleta” encena fim de Che Guevara

Após assinar o roteiro de "Diários de Motocicleta", o escritor José Rivera sentiu que ainda tinha muito a dizer sobre Ernesto "Che" Guevara — o revolucionário argentino que liderou, ao lado de Fidel Castro, a Revolu&ccedil

Agora Rivera resolveu escrever uma peça que, segundo ele, mostra que Guevara é ainda atual e teria muitas opiniões sobre a guerra no Iraque. "Quando você está numa situação em que está matando pessoas e ninguém sabe realmente por quê, os tempos exigem que alguém formule essas perguntas", disse o roteirista, em entrevista concedida em Nova Iorque, onde sua peça "School of the Americas" (Escola das Américas) vai estrear na quinta-feira (06/07). "Che constantemente formulava essas perguntas e criticava as investidas imperialistas dos Estados Unidos em todo o mundo”.

Porto-riquenho que cresceu em Nova Iorque, Rivera disse que parte dos diálogos da peça se aplica diretamente à guerra liderada pelos EUA no Iraque. "O que Che fala no filme são coisas sentidas por pessoas em todo o mundo. Na década de 1960, Che disse que o maior inimigo do mundo era os Estados Unidos — e há pessoas que dizem o mesmo hoje", declarou o roteirista.

A peça conta a história da última noite de vida de Che Guevara, antes de sua morte na Bolívia, onde ele passou seu último ano de vida tentando fomentar um levante comunista. O guerrilheiro argentino, figura-chave da revolução cubana, foi capturado por tropas do governo e detido numa escola, enquanto os governos boliviano e americano decidiam seu destino.

Uma professora chamada Julia Cortes insistiu em visitá-lo e acabou ficando amiga do revolucionário. José Rivera contou que tomou conhecimento da história da professora quando fazia pesquisas para escrever o roteiro de "Diários de Motocicleta", filme de 2004 sobre a viagem transformadora que Guevara, na época um jovem estudante, fez pela América Latina na companhia de um amigo.

Julia, que hoje está na casa dos 70 anos, foi entrevistada para um documentário suíço ao qual Rivera teve acesso. "Fui seduzido pela presença dela. Ela falou sobre o encontro com Che e sobre o que os dois conversaram. Tive a impressão de que aquele encontro realmente mudou a vida dela", disse Rivera. "Comecei a imaginar essa história da última amizade de Che”.

Visões distintas
Rivera disse que, para a peça, imaginou diálogos que abrangem desde o casamento e os filhos de Guevara, a influência de sua mãe, seus ideais e sua filosofia, além de algumas dúvidas sobre o rumo que ele tomou em seus últimos anos de vida.

"Em várias entrevistas Julia fala sobre as coisas das quais ela e Che conversaram, mas é tudo muito resumido", disse Rivera. Desde que compôs a peça, o escritor falou com a professora, que foi localizada na Bolívia por um parente de Patricia Velazquez — a atriz venezuelana que representa Julia. "Patricia pôde falar com ela ao telefone, e elas combinaram de Julia ir a um cybercafé. Através da Internet, tivemos um bate-papo com todo o elenco”.

"Ninguém além dela sabe realmente o que aconteceu naquele quarto." Rivera — que recebeu uma indicação ao Oscar pelo roteiro de "Diários de Motocicleta" — tinha 13 anos quando Guevara foi morto, em 1967, e se recorda bem do incidente. "Era a época em que Martin Luther King foi assassinado, quando Bobby Kennedy e Malcolm X foram assassinados. Parecia ser parte de nossos tempos o fato de todos nossos heróis serem mortos, um a um", conta.

Rivera disse que, na época, Che Guevara era uma figura tão controversa quanto é hoje: um "demônio" para muitos cubanos exilados e críticos da revolução cubana liderada por Fidel Castro — mas, para muitos universitários dos anos 1960 e esquerdistas, especialmente na Europa, uma figura carismática e idealista.

"Minha filha foi à escola usando uma camiseta de Che Guevara e foi criticada por um dos professores, que disse que Che é terrorista e lhe perguntou: 'Para que glorificar um terrorista?"', disse Rivera. Ele não prevê levar a peça para Miami, mas as encenações podem ajudar os conservadores americanos a ver Che de modo menos estúpido.

Da redação, com agências internacionais