Alencar quer crescimento como lema da reeleição

O vice-presidente José Alencar dá nota 10 ao padrão ético do governo Lula, e frisa que “acompanhei tudo”. Dá 8 para a política monetária, e diz que 8 “já é uma condenação”. Defende, assim c

Folha – Se fosse definir numa frase o tema da campanha da reeleição, qual o sr. escolheria?
José Alencar – Crescimento. Estamos crescendo muito aquém da potencialidade da economia brasileira. Já fomos a oitava economia do mundo. Estamos na 14ª posição. O Brasil tem condições de se situar em posição muito superior.
Folha – O primeiro mandato do presidente Lula deixou a desejar em termos de crescimento econômico. Por quê?
Alencar – Deixou a desejar como os últimos 20 anos também deixaram a desejar. Só que, nesse primeiro mandato, preparamos o Brasil como nunca para crescer. Quando chegamos, o risco Brasil era dez vezes superior ao de hoje. A taxa básica de juros era de 25%. Hoje é de 15,25%. Nossa dívida tinha uma parcela indexada ao dólar. Hoje, é praticamente zero. Pagamos antecipadamente ao FMI.
Folha – Por falar em FMI, o sr. arrancou dos petistas, na convenção que oficializou a candidatura de Lula, o grito de "Fora daqui, o FMI".
Alencar – No passado, havia uma indignação dos brasileiros, e eu me incluo entre esses brasileiros, com a figura daqueles técnicos, que vinham ao Brasil para ditar nossa política econômica. Aquilo era uma subserviência nacional. Então, o brasileiro não queria aquilo, gritava: "Fora daqui, o FMI". O Lula, que tem o mesmo sentimento, mandou o FMI para casa. Só que enaltecendo a credibilidade do Brasil no conceito internacional.
Folha – Durante o mandato, o sr. foi um crítico da política monetária, dos juros altos. Sente-se frustrado?
Alencar – Eles argumentam comigo que têm o mesmo sentimento. E que, com base numa média, a [taxa de juros] do governo passado foi muito superior à nossa. Mesmo assim, continuam altas. Agora, a política de redução gradual está ligada a uma responsabilidade com a economia. Acho que devemos ter um pouco mais de coragem. É aquela história, a frase antiga do PT: "Vamos perder o medo de ser feliz".
Folha – Então, no segundo mandato, tem de ter mais coragem?
Alencar – Não é só coragem. Porque pode parecer sinônimo de irresponsabilidade, e tem que ter responsabilidade.
Folha – O aumento de gastos nesse ano, no governo Lula, está sendo criticado e, para alguns analistas, pode dificultar uma queda maior nos juros. O que o sr. acha disso?
Alencar – É natural, em época de eleição, criticar. Mas digo que o Lula é intransigente com essa questão, ele não abre mão de que não podemos exacerbar gastos. Não significa, porém, retirar condições de sobrevida dos pobres que estão sendo beneficiados pelo Bolsa-Família.
Folha – O sr. já disse que o discurso de campanha não assumiu o poder. O que é preciso fazer para que ele tome posse num eventual segundo mandato?
Alencar – E ainda não assumiu o poder. Por quê? Porque chegamos e a casa estava desarrumada. Hoje está arrumada. A inflação está controlada e baixa. Mas não podemos admitir inflação, pois não podemos admitir irresponsabilidade fiscal.
Folha – O sr. acha que uma reforma política é prioridade, principalmente para evitar outro mensalão?
Alencar – A reforma política não tem nada a ver com o mensalão. O mensalão é uma coisa que a história vai se incumbir de trazer à tona, com as verdades, e por inteiro. Porque tem muita coisa aí que não foi esclarecida e que afeta vários outros redutos partidários no Brasil.
Folha – O sr. ficou decepcionado com a revelação do escândalo do mensalão envolvendo o PT e até o seu ex-partido, o PL?
Alencar – Qualquer coisa que acontece na vida pública que possa ser objeto de repulsa me deixa indignado. Porque acaba afetando a todos os homens públicos. O cidadão comum olha para a gente e fica na dúvida. Passamos a ser um daqueles.
Folha – Foi uma decepção o festival de absolvições de deputados envolvidos no mensalão. Só três foram cassados.
Alencar – Tem de ver o processo. Não posso igualar o pessoal que recebeu dinheiro dessa história chamada mensalão. O Congresso deve ter feito o trabalho de verificar caso a caso. Agora, posso dizer, por exemplo, que o [deputado petista] Professor Luizinho não tem nada a ver com qualquer crime. O João Paulo [PT-SP], não acredito que pudesse fazer. O João Magno [PT-MG] é um rapaz sério, conheço bem. O Romeu Queiroz [PTB-MG], não acredito que tenha feito nada de forma errada. Daí a razão por que foram absolvidos.
Folha – Falando em desvios éticos, como o sr. analisa a queda do ministro Antonio Palocci?
Alencar – Foi um episódio que não precisava ter acontecido. Qualquer um ficaria indignado, porque havia um rapaz, chamado Francenildo, que era caseiro, e que afirmou que o ministro Palocci ia na tal casa [do lobby, onde se reunia a República de Ribeirão Preto]. De repente, chegou a notícia de que havia depósitos incompatíveis com o salário dele. Daí houve uma infelicidade do Palocci. Qualquer um gostaria de verificar aquilo, mas não daquela maneira, então foi o grande erro. Se ele tivesse pedido em juízo a abertura do sigilo bancário do cidadão que o acusava, não teria acontecido nada disso.
Folha – E a queda do ex-ministro José Dirceu?
Alencar – Ninguém provou nada contra ele. Tem um ditado antigo que fala: a voz do povo é a voz de Deus. E Deus vê em secreto. Mas o povo também vê em secreto. Tanto que não afetou a imagem do Lula.
Folha – A oposição vai usar os desvios éticos do PT para bombardear o presidente Lula na campanha…
Alencar – Tomara que use, porque é chover no molhado. Porque o Lula não tem nada a ver com isso, eu estou perto dele. Não se mete nessas coisas.
Folha – Ele pode ser atacado de ter sido omisso.
Alencar – Poderia se não tivesse determinado a saída dos ministros, alguns deles grandes companheiros.
Folha – Como o sr. analisa a posição do PSDB e do PFL em relação ao governo Lula?
Alencar – Eu sempre achei que o melhor caminho para se disputar uma eleição é trabalhar a favor de uma causa, não contra alguém. Eles querem outro caminho. Provavelmente não podem defender a causa deles. Porque, se falarem de economia, vão atirar no próprio pé. Então, partem para a agressão pessoal, que considero que só vai fazer crescer, na opinião pública, a imagem do presidente.
Folha – O sr. acredita que, se dependesse apenas do Alckmin, o tom da campanha seria outro?
Alencar – No momento em que ele leu um discurso, numa convenção do partido em Belo Horizonte, marcou posição igual a essa de ataque pessoal, como um verdadeiro desespero.
Folha – Na visão do sr., qual foi o momento mais crítico do governo Lula?
Alencar – Nunca vi o Lula abalado. Nem no momento mais grave das CPIs. É só fazer uma retrospectiva. Qual o presidente que não se desgastou diante de uma CPI? Todos. Ele não.
Folha – Houve um forte desgaste no ano passado, quando o Duda Mendonça admitiu o uso de caixa dois nas campanhas petistas.
Alencar – O Lula não tem nada a ver com caixa nenhum, não mexe com isso.
Folha – O que o sr. acha que poderia ter sido melhor no governo Lula?
Alencar – A administração da política monetária no que diz respeito ao custo da dívida brasileira. Isso é alto. Não significa que o governo se descurou disso. O governo defendia a tese de que tem de haver uma responsabilidade para não haver um desarranjo. Mas as taxas caíram, e caíram muito.
Folha – Mas não tanto quanto o sr. queria…
Alencar – Não tanto quanto eu queria. Mas caíram de 25% para 15,25%. Não é brincadeira, foi muito. Mesmo assim ainda é uma taxa despropositada, muito alta em relação às vigentes no mercado internacional.
Folha – Depois que virou candidato, o discurso do sr. está menos inflamado contra a política monetária?
Alencar – Eu nunca fui crítico ao governo. Não mudei nada.
Folha – Que nota o sr. daria para a política monetária do governo Lula, de zero a dez, então?
Alencar – Eu não posso dar dez. Mas dou, tendo em vista a responsabilidade com que foi tratada, uma nota oito.
Folha – Oito! O sr. sempre foi muito crítico, não está sendo bonzinho?
Alencar – Quando dou oito já é uma condenação.
Folha – O sr. defende alguma mudança no Banco Central num eventual segundo mandato?
Alencar – Tem que ampliar o Conselho Monetário Nacional. O Copom não, é um órgão técnico. Mas a política econômica não é ditada pelo Copom, é ditada pelo Conselho Monetário Nacional. Acredito que ele deveria ser composto por representações regionais e setoriais.
Folha – O sr. defende a autonomia do Banco Central.
Alencar – O BC tem agido com muita liberdade. Tá bom assim.
Folha – Como é que o sr. vai contribuir financeiramente para a campanha do presidente?
Alencar – Olha, eu saí das empresas, não sou mais diretor. Mas é claro que elas terão o maior prazer em examinar a possibilidade de colaborar, como no passado.
Folha – E não se deram bem, porque até hoje o PT deve à Coteminas.
Alencar – Isso eu não misturo, é uma questão empresarial.
Folha – Que nota o sr. dá para o comportamento ético do governo?
Alencar – Acho que dou nota dez. Acompanhei tudo, o Lula não transigiu. Ele não acobertou nada, não permitiu que se salvasse quem quer que fosse, não interferiu nas investigações. Nunca houve no Brasil tanta investigação como tem havido no governo Lula.
Folha – Durante as investigações, o presidente atacou as elites, dizendo-se vítima de preconceitos.
Alencar – Quando fala em preconceito, é da falsa elite. Determinadas pessoas têm uma verdadeira repulsa por aquele cidadão que pertence a uma classe menos favorecida, como no caso dele, um líder sindical, um torneiro mecânico que chega à Presidência da República.
Folha – Mas o sr. acha correto ele falar que é vítima de preconceito?
Alencar – Acho que algumas pessoas não se conformam, pessoas frustradas, que gostariam de estar no lugar dele.
Folha – O sr. acha que o ex-presidente Fernando Henrique está nessa categoria de frustrado?
Alencar – Não posso dizer nada dele, porque ele várias vezes quis que eu fosse seu ministro. Agora, no lugar dele eu iria agir como ex-presidente da República. E como um intelectual responsável. Ele cresceria muito junto à sociedade brasileira.
Folha – Haverá mensalão num segundo mandato?
Alencar – Não. Isso é fora de cogitação. É coisa do passado. E não só para o PT, porque não foi só o PT que entrou nisso.
Fonte: jornal
Folha de S. Paulo